A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Ônibus, realizada pela Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro, terminou com dois relatórios. O texto oficial, apoiado por três dos cinco vereadores que compunham a comissão, não cita desvios e não nomeia responsáveis por irregularidades. O relatório paralelo, apresentado pelo vereador Tarcísio Motta (PSOL) e que aponta para a formação de uma máfia no transporte da capital fluminense, foi entregue à força-tarefa da Lava Jato do Ministério Público Federal (MPF) do Rio de Janeiro nesta segunda (9).
O texto apresentado por Motta pediu o indiciamento de 5 agentes públicos e 46 empresários ligados à operação do transporte no Rio de Janeiro. Entre os nomes envolvidos na suposta máfia estão o ex-prefeito do Rio, Eduardo Paes (PMDB), os ex-secretários municipais de Transportes, Alexandre Sansão e Rafael Picciani, e os empresários Jacob Barata, Jacob Barata Filho e Lélis Marcos Teixeira.
“A única coisa que o relatório oficial faz é dizer que a Secretaria Municipal de Transportes precisa ter um pouco mais de estrutura de fiscalização. O que nós apontamos é que não adianta ter mais fiscalização para um contrato impossível de ser fiscalizado. Um contrato que está feito para produzir uma caixa preta. A caixa preta não é um erro do sistema, ele é um produto do sistema pensado em 2010 por Eduardo Paes, Alexandre Sansão, a galera do PMDB e a máfia dos transportes”, explicou o vereador socialista.
O relatório paralelo pede o cancelamento do atual contrato de concessão para a operação do sistema de ônibus, a elaboração de um novo marco regulatório para concessões no setor e a criação de uma empresa pública de transportes, prevista na Lei Orgânica do município, mas jamais criada.
Procurado pela reportagem, o vereador Rogério Rocal (PTB), enviou nota ressaltando que, independente do relatório, é preciso que a “Justiça e a Prefeitura possam, através de suas ações, tomarem as providências necessárias e entregar à população um serviço mais digno no transporte do Rio de Janeiro”. Diferente de Tarcísio, Rocal não comentou, nem deu visibilidade em sua rede social ao relatório que produziu.
Investigações
Em 2017, as operações Ponto Final e Cadeia Velha, do Ministério Público Federal (MPF), prenderam figuras públicas como o empresário Jacob Barata Filho e o deputado Jorge Picciani (PMDB), acusados de manter um esquema de propina para comprar decisões na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) favoráveis ao setor de transportes. As operações ensejaram a criação de CPIs na Alerj e na Câmara de Vereadores da capital.
As investigações da CPI da Câmara apontam indícios de que o dinheiro do esquema saía da maquiagem das contas que justificava o aumento irregular das tarifas. O ônibus é o principal meio de transporte público na cidade do Rio de Janeiro, sendo utilizado por 72% dos usuários, de acordo com o Armazém de Dados da Prefeitura. Entre 2010 e 2015, as passagens desse meio de transporte aumentaram 52%, saltando de R$ 2,50 para R$ 3,80.
A maquiagem das contas envolvia, por exemplo, o superfaturamento das garagens de ônibus. O aluguel de três dessas garagens, localizadas em pontos distintos da cidade, custava, cada uma, R$ 100 mil em 2011. Em 2016, o valor chegou a R$ 550 mil, um aumento de 450%, quando o índice de reajuste normal (IGP-M) no período seria de 40%. Há documentos que comprovam ainda que as empresas da família Barata eram, ao mesmo tempo, proprietárias e locatárias das garagens. Segundo Motta, só com o superfaturamento das despesas, os desvios podem ter chegado a R$ 3,6 bilhões. O relatório ainda traz indícios de subfaturamento de receitas.
“Se eles estão superfaturando as despesas e subfaturando as receitas, o resultado parece que as empresas de ônibus estão no prejuízo e a tarifa precisa aumentar. Quando na verdade isso é uma grande fraude. Se nós tivéssemos os dados reais, nós notaríamos que o lucro dos empresários está acima do que o contrato diz, portanto a tarifa devia ser mais baixa. Ou seja, eles estão roubando do bolso do trabalhador todo dia quando o trabalhador paga uma passagem te a roleta gira”, explicou.
Outro lado
Instado a se manifestar sobre o relatório do vereador Tarcísio Motta, Alexandre Sansão afirmou, por meio de sua assessoria que o documento é "extra-oficial e sequer foi incluindo no documento final da CPI". O ex-secretário municipal de Transportes alega que "sem nenhuma solidez, o documento cita por diversas vezes o sistema de ônibus do estado tentando causar confusão entre os episódios ocorridos no Estado com o sistema da prefeitura com o único objetivo de usá-lo como um instrumento político para oposição”.
O empresário Jacob Barata Filho não quis comentar o assunto. O ex-prefeito Eduardo Paes endossou o posicionamento do ex-de Alexandre Sansão.
Edição: Thalles Gomes