A polarização e o caráter incomum das eleições deste ano, com a prisão política do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o impedimento de participar da disputa, trouxe para o debate público o chamado "voto útil". Esse é o voto que acontece quando o eleitor se orienta pelo objetivo de derrotar um adversário específico, mesmo que isso signifique votar em um candidato no qual não tem profunda convicção política.
Analistas apontam que o voto útil, também chamado de voto estratégico, pode influenciar diretamente nos resultados do primeiro turno.
Para Geraldo Tadeu Monteiro, coordenador do Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas sobre a Democracia (Cebrad) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), o voto útil é mais de negação do que afirmação. “Tem uma candidatura marcadamente à direita com volume expressivo de intenções de voto e há o crescimento de uma candidatura oposta, à esquerda, criando um cenário de polarização no primeiro turno. O que deixa uma parte do eleitorado, especialmente o de centro, em um dilema político muito grande”, opina.
A pesquisa Datafolha divulgada nesta quinta-feira (20) apontou Fernando Haddad (PT) e Jair Bolsonaro (PSL) como favoritos ao segundo turno. Enquanto o candidato petista cresceu 3% desde o último levantamento e está com 16%, Bolsonaro cresceu 2% e está com 28% das intenções de voto. Ciro Gomes (PDT) e Geraldo Alckmin (PSDB) mantiveram os índices de 13% e 9%, respectivamente. Marina Silva (Rede) caiu um ponto e apresenta 7% das intenções de voto.
O dirigente da Consulta Popular e doutor em Serviço Social Eduardo Mara também aponta a polarização, com projetos políticos radicalmente distintos de país, como elemento fundamental para avaliar a questão do voto útil. Mara acrescenta que será necessário mobilização popular após as eleições.
Para ele, a discussão do voto útil sobre a escolha entre Fernando Haddad e Ciro Gomes para um segundo turno contra Bolsonaro é uma “miopia”. Mara avalia que há um discurso de inviabilidade por parte dos que condenam o golpe de 2016 e querem a retomada da democracia, afirmando que uma candidatura de Haddad não tenha chances de governar.
“Não haverá normalidade institucional sem retomar a democracia. E retomar a democracia exigirá de nós grandes mobilizações e capacidade de um governo popular de estimular essas manifestações pela democracia. É uma ilusão achar que investir em voto útil em outra candidatura trará uma normalidade e calma depois da eleição. Porque para reconstruir a democracia será necessário muita participação popular, muito debate de projeto de país, ou seja, as lutas pela democracia não vão terminar dia 7 de outubro”, considera.
Altos índices de rejeição
A pesquisa Datafolha aponta também que estas eleições presidenciais estão marcadas por altos índices de rejeição. Jair Bolsonaro é o mais rejeitado (43%), seguido por Marina (32%), Haddad (29%), Alckmin (24%) e Ciro (22%). Os resultados somam mais de 100% porque o entrevistado pôde citar mais de um candidato no qual não votaria em nenhuma hipótese.
Eduardo Mara avalia que o crescimento de votos em Bolsonaro está relacionado com o aumento de sua rejeição, especialmente por parte de setores que combatem as propostas ultra-conservadoras e antidemocráticas do militar da reserva. Ele lembra que há também um campo democrático que se mobiliza contra a ruptura democrática de 2016 e avalia que a figura que representa este campo é o ex-presidente Lula, impedido de concorrer, mas que apoia a candidatura de Haddad.
"Este polo democrático acumula votos e tende a transferir votos de outras candidaturas de centro para esta de esquerda, que é a do PT. Isso também carrega uma rejeição dos setores antidemocráticos à esta proposta, ou do antipetismo, que foi estimulado pela direita e pelo monopólio da mídia”, afirma.
No entanto, o pesquisador Monteiro avalia que o crescimento de Haddad interfere no voto de outros eleitores. "É provável que o crescimento do Bolsonaro tenha retirado votos do Alckmin e Marina, o que explica em partes a queda dos dois. Por outro lado, o crescimento do Haddad coloca para o eleitor de centro-direita o dilema de apoiar o Bolsonaro em função do crescimento de um candidato à esquerda", considera.
Edição: Diego Sartorato