Poucos minutos após deixar o Centro de Progressão Penitenciária (CPP) Dra. Marina Marigo Cardoso de Oliveira no Butantã, zona oeste de São Paulo (SP), Bárbara Querino, conhecida como Babiy, recebe Na minha pele, livro escrito e enviado pelo ator Lázaro Ramos. A dedicatória do artista emociona a dançarina, que solta uma gargalhada.
Aquela reação foi repetida à exaustão durante a última sexta-feira (18). Nem mesmo quando divagava a respeito de temas sérios, como a rotina no cárcere, a jovem abandonava o riso solto. A euforia chama a atenção da mãe, Fernanda Querino: “Preciso deixar ela um pouco sozinha em casa, para se acalmar”. A matriarca da família se preocupa com a quantidade de ligações, mensagens e vídeos que chegavam em todas as plataformas possíveis até sua filha.
:: Relembre o caso Babiy Querino ::
Passa das 10h do dia 18 de abril e, uma por uma, centenas de internas deixam o CPP para o indulto da Páscoa. Namoradas, namorados, amigas, amigos e parentes se apinham em frente ao local, que abriga 1024 mulheres e tem capacidade para encarcerar até 1026. A energia quase industrial daquele processo não desperta o tédio em quem está no portão de saída desde às 7h e espera há meses por um reencontro, como Mayara Vieira, 24 anos, criadora da campanha “Todos por Babiy”, que reúne 32 mil pessoas que defendem a liberdade da dançarina.
“Mal dormi essa noite, estou com olheiras enormes e estou muito ansiosa para encontrá-la. Parece que estou indo ver uma artista famosa”, brinca Mayara, que nunca havia encontrado com a dançarina desde a sua prisão -- a amizade entre as duas surgiu somente após a detenção. “A mãe dela pegou o celular, viu que tinha umas conversas comigo e me ligou contando a história. Eu senti que não podia ficar parada, precisava ajudar”, afirma a assistente social.
Entre as centenas de pessoas que aguardam do lado de fora do CPP, o nome de Babiy é conhecido. “Eu conheço ela da campanha, puta injustiça o que fizeram, ela não merece estar presa”, afirma o irmão de uma das presas, que pediu uma foto com a dançarina para postar em suas redes sociais.
Enquanto aguarda a filha sair, uma das mães também fala sobre o caso: “Todo mundo aí dentro (CPP) sabe quem ela é. Por ser famosa, o pessoal tem medo de mexer com ela. É uma vantagem, porque os funcionários são maldosos.”
“A Babiy!”, gritou Mayara, enquanto a dançarina saía pela porta da frente do CPP. É a primeira vez que Bárbara Querino abandonou o cárcere e sai às ruas desde a sua prisão, no dia 10 de janeiro de 2018. No começo do ano, a jovem foi beneficiada com a progressão de sua pena para o regime semiaberto. Assim, ela poderá receber salvo conduto em datas especiais e festivas, como Natal, Ano Novo e Dia das Mães.
Reconhecida pelo cabelo
Flávio Campos, advogado de Babiy, explica que aguarda a Justiça fixar a data para a análise do recurso que a defesa fez, exigindo a revisão da decisão de primeira instância. “Entrei com uma petição pedindo para pautar o processo, pois ela corre o risco de cumprir pena sem que julguem ela”. Em 10 de agosto de 2018, a dançarina foi condenada a cinco anos e quatro meses de reclusão pelo roubo de um automóvel que pertencia a um casal em Santo Amaro, zona sul da capital paulista.
A acusação, porém, é mais ampla. De acordo com a investigação policial, Babiy seria integrante de uma quadrilha chamada “Piratas do Asfalto” e teria cometido outro assalto. A defesa da dançarina apresentou vídeos e fotos publicados em redes sociais que demonstram que ela estava no Guarujá (SP), a 100 km de Santo Amaro, na noite dos crimes.
Wesley Querino, de 21 anos, irmão de Babiy, é um dos assaltantes que integra a quadrilha. Réu confesso, o jovem negou o envolvimento da irmã nos crimes quando depôs no julgamento. Porém, assim como as imagens, o testemunho do familiar foi anulado pela Justiça. A dançarina foi colocada na cena do crime por uma das vítimas que a "reconheceu", por uma foto, por ter o "cabelo parecido” com a da assaltante.
Festa surpresa
Em casa, entre os cinco irmãos e a mãe, Babiy, que não conseguia segurar o riso, adota finalmente um semblante sério ao falar do tempo de cárcere. A dançarina reclama dos constantes cortes de água no CPP e da nova perspectiva sobre a prisão. “Cadeia não é para ninguém, nem para bicho. Então, todas que estão ali presas não deveriam estar ali. A Justiça acha que prender vai moldar a pessoa para a sociedade, mas é mentira”.
Após ser presenteada com uma festa surpresa, organizada pela família e amigos, Babiy começa a pensar no retorno ao CPP. “Eu já chorei bastante. Hoje em dia, eu procuro não chorar mais. Eu não sei porque estou rindo tanto... estou rindo desde ontem. Mas quero permanecer esses dias sem chorar, porque sei que quando chegar lá [na prisão] eu vou chorar”.
Neste domingo (21), às 14h, Babiy volta a atravessar o portão do CCP do Butantã -- desta vez, para o lado de dentro. Passada a alegria do reencontro, recomeçará a luta por justiça e liberdade.
Edição: Daniel Giovanaz