Na Câmara

Marcos Pontes é confrontado pela oposição sobre a remoção de quilombolas de Alcântara

Projeto de ampliação da Base de Alcântara (MA) pode afetar cerca de 350 famílias

Brasil de Fato | Brasília (DF) |

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"Quando ouço a palavra ‘expulsão’, ‘retirar’, eu não gosto dessas palavras. Isso não é a ideia", afirmou Marcos Pontes, na Câmara
"Quando ouço a palavra ‘expulsão’, ‘retirar’, eu não gosto dessas palavras. Isso não é a ideia", afirmou Marcos Pontes, na Câmara - Cleia Viana/Câmara dos Deputados

Em audiência na Câmara dos Deputados nesta quarta-feira (4), em Brasília (DF), o ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, foi duramente confrontado por parlamentares da oposição a respeito do projeto do governo relacionado à Base de Alcântara, no Maranhão.  A questão tem como panorama a situação de cerca de 350 famílias quilombolas que estariam ameaçadas de remoção, segundo denúncia apresentada pelo jornal Folha de S. Paulo em 11 de outubro.

Luiza Erundina (Psol-SP), uma das signatárias do requerimento para a realização da audiência, citou os prejuízos acarretados pelo acordo que envolve Alcântara e sublinhou que a população tradicional da região não foi ouvida pela gestão Bolsonaro sobre o assunto, como prevê a Convenção 169, da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

"Os quilombolas não foram ouvidos nem informados em nenhum momento. Isso é grave porque há um órgão internacional, um órgão da ONU, cuja norma não foi atendida”, criticou, acrescentando que o plano de desenvolvimento tecnológico não pode “esquecer as comunidades”.  

O oposicionista Bira do Pindaré (PSB-MA), único da bancada maranhense a votar contra a proposta durante a votação da pauta no plenário da Câmara, também endossou o discurso de defesa da população tradicional local. Coordenador da Frente Parlamentar Mista em Defesa das Comunidades Quilombolas, ele chamou de “grande erro” a aprovação da medida sem consulta aos povos da região.

“A grande preocupação é com a expulsão das pessoas. Essa é a questão, e elas não foram ouvidas. Nós não admitiremos o deslocamento de comunidades. Não estamos em 1983, no regime militar. Estamos no regime de uma constituição chamada de ‘Constituição Cidadã’", disse antes de enfatizar que a permanência das comunidades "é um direito indiscutível”. Ele mencionou ainda o risco de restrição do acesso dos quilombolas ao mar durante períodos de lançamento de foguetes. 

De acordo com a Folha, o plano de remoção envolve onze ministérios e estaria em estágio avançado. O objetivo seria a ampliação do chamado “Centro de Lançamentos” (CLA) da área. O governo enfrenta críticas desde o início do processo especialmente por conta dos riscos colocados para a população tradicional da região. Marcos Pontes e outros atores do governo têm negado a iniciativa de deslocamento das famílias.

Ministro

O ministro sugeriu, nesta quarta, que as comunidades não foram ouvidas pelo governo porque isso não integrava a primeira fase do projeto, que, segundo ele, tratava somente de “pontos técnicos" e não se relaciona "com as pessoas em si”.

Pontes afirmou que o atual momento compreende a segunda etapa da proposta e sugeriu que o procedimento será adotado. Segundo ele, esta fase pode durar cerca de um ano.  

“No que depender de mim, vou sempre atuar no sentido de proteger as comunidades. Quando ouço a palavra ‘expulsão’, ‘retirar’, eu não gosto dessas palavras. Isso não é a ideia”, retrucou.

Na maior parte do tempo, no entanto, o ministro defendeu o projeto na Base de Alcântara, afirmando que a iniciativa busca trazer “mais empresas e investimentos” para a região. “A gente precisa dar um ânimo ao nosso projeto espacial”.

A sessão se deu entre críticas, mas também bajulações. Deputados como Bibo Nunes (PSL-RS) e Coronel Chrisóstomo (PSL-RO), por exemplo, elogiaram as medidas do governo em relação a Alcântara. Questionado pela imprensa a respeito do tema, este último afirmou que a remoção das famílias será realizada apenas “em último caso”.

CNPq

O governo também foi alvejado no que se refere à ideia de junção da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), vista como autoritária por parlamentares, docentes e pós-graduandos. O tema era outro ponto do requerimento de convite para a sabatina do ministro.

Apesar de a proposta não ter sido formalizada pela gestão Bolsonaro, parlamentares governistas estariam alinhavando, nos bastidores, uma articulação em prol da fusão. O caso foi noticiado pela imprensa nas últimas semanas e o plano de junção das instituições tem origem no Ministério da Economia.

“Essa é uma gravíssima ameaça. Já se tentou isso no Brasil, no governo Collor e o que se conseguiu produzir foi um caos no setor. Gastou-se tempo, energia e dinheiro com isso e se prejudicou o desenvolvimento da ciência brasileira, de forma que não há razão pra repetir esse erro”, apontou o líder da oposição, Alessandro Molon (PSB-RJ).

Para justificar a fusão, governistas têm alegado que ela seria voltada ao enxugamento de custos. A pauta tem como pano de fundo o cenário de arrocho fiscal que se aprofunda no país.

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“O Brasil não tem agências de fomento demais. Ele tem agências de menos. Os Estados Unidos, por exemplo, têm dez. Então, por que não copiar as coisas boas de um país que é tão admirado pelo presidente [Bolsonaro]?”, questionou Molon, acrescentando que, durante a campanha de 2018, o então candidato a chefe do Executivo havia prometido investimento de 3% do PIB do país em ciência e tecnologia.

“Este ano, o investimento na área é de 1%. As perspectivas para o ano que vem também não são boas”, disse. O pessebista destacou ainda que o cenário de dúvidas sobre a eventual fusão tem prejudicado pesquisadores, causando clima de ansiedade no meio científico e acadêmico.

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“A comunidade científica está paralisada. Quem é que vai apresentar projetos e participar de editais se não sabe se o edital vai até o fim? Isso está criando um desânimo, uma paralisia. Isso não é bom nem pro próprio governo”, disse o líder da oposição.   

Marcos Pontes se disse contrário à fusão das agências, como já havia manifestado em declarações. “É importante desenvolver essas agências, porque o retorno desse investimento é muito alto. Ciência e tecnologia são importantes”, acrescentou.

Enquanto o CNPq é vinculado ao Ministério da Ciência e Tecnologia (MCTIC), a Capes está subordinada à pasta da Educação, comandada pelo ministro Abraham Weintraub -- que faz discurso privatista e embate ideológico --, apontado como um dos entusiastas da fusão.  

 

Edição: Julia Chequer