Podcast

Times assassinos

É pedir muito para que as pessoas tenham mais empatia umas com as outras?

Ouça o áudio:

Os gritos de “time assassino” e as suas reações a ele explicam muito sobre o modo como reagimos diante de tragédias como a do Ninho do Urubu
Os gritos de “time assassino” e as suas reações a ele explicam muito sobre o modo como reagimos diante de tragédias como a do Ninho do Urubu - Marcelo Cortes / Flamengo
É pedir muito para que as pessoas tenham mais empatia umas com as outras?

Na última quarta-feira (29), o Fluminense venceu o Flamengo por 1 a 0 no Maracanã, em jogo válido pela quarta rodada da fase de grupos da Taça Guanabara. O gol da vitória foi marcado pelo veterano Nenê, de calcanhar, para a alegria da torcida tricolor. O jogo em si não teve lá muitas emoções, mas esse não é o assunto principal dessa humilde coluna.

Em alguns momentos da partida, torcedores do Fluminense presentes no Maracanã dirigiram gritos de “time assassino” aos jogadores do Flamengo numa clara referência à tragédia ocorrida no Ninho do Urubu em fevereiro do ano passado, quando dez jovens das categorias de base morreram num incêndio nas instalações do clube. O caso ainda não teve uma conclusão e a falta de acerto com as famílias das vítimas sobre as indenizações é uma mancha na gestão do presidente Rodolfo Landim e no “ano mágico” do Flamengo em 2019.

Ao que parece, essa alcunha vai perseguir o Mais Querido do Brasil por muito tempo. Mas posso garantir uma coisa: os gritos de “time assassino” e as suas reações a ele explicam muito sobre o modo como somos impactados por tragédias como a do Ninho do Urubu. E digo mais: a postura do Flamengo seria a mesma em qualquer outro clube e/ou empresa do país. Vide os casos da Vale em Mariana e Brumadinho. Veja o ocorrido na Boate Kiss. Todas as famílias das vítimas dessas tragédias também aguardam as indenizações e a condenação dos culpados.

Sobre o Flamengo e o Ninho do Urubu, é preciso dizer que a diretoria rubro-negra (que acertou muito dentro de campo em 2019) é a principal responsável pela alcunha recebida na última quarta-feira (29). Não somente pela falta de um acerto com as famílias, mas pela maneira como tem gerenciado o caso desde então. É como se o que aconteceu em fevereiro do ano passado fosse jogado pra debaixo das taças que o Fla conquistou em 2019. “Falemos das coisas boas”. Esse é o discurso de quem tem muito a esconder e de quem tem muita culpa no cartório.

Ao mesmo tempo, também surpreende a postura das autoridades competentes. Os culpados pela tragédia foram indiciados? Se a fiscalização encontrou falhas e irregularidades nas instalações do Ninho do Urubu, por que a Prefeitura e os Bombeiros não interditaram o local? E quem autorizou o funcionamento do Centro de Treinamento mesmo com todos os problemas encontrados?

E ainda temos aqueles que usam a tragédia do Ninho do Urubu para tripudiar, diminuir e humilhar. Vale lembrar que os gritos de “time assassino” também deveriam ser dirigidos aos clubes que atrasam o pagamento de salários dos seus funcionários. Pessoas passam necessidades sérias por conta da incompetência (pra não falar outra coisa) de dirigentes irresponsáveis. Esses gritos também deveriam ser dirigidos aos jornalistas que usam o futebol para alimentar rivalidades pessoais, incitar a torcida contra este ou aquele jogador e ganhar cliques e “likes”.

Amigos, não tem ninguém certo nessa história. E não me venham com o papo de que esta ou aquela torcida entoava cânticos homofóbicos contra outra. Um erro não pode justificar o outro. E isso só prova que tá todo mundo errado.

Será que é pedir muito para que as pessoas sejam mais sensíveis e que tenham um pouco mais de empatia umas com as outras?

Se você quer cobrar justiça para as famílias das vítimas do incêndio no Ninho do Urubu, cola aqui com a gente do Brasil de Fato e com quem está apurando o caso de maneira séria. Agora, se você quer usar essa tragédia pra fazer qualquer provocação clubista, recomendo que você procure ajuda o mais rápido possível.

Precisamos ser pessoas melhores. Pra ontem.

Edição: Brasil de Fato (RJ)