Impactos da covid

Carta aberta de ginecologistas cobra ações para redução de mortes de mães na pandemia

Documento alerta para falta de atendimento adequado e diz que medidas de combate ao aumento de óbitos são urgentes

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Entidades apontam falhas sistemáticas no controle de óbitos maternos durante a pandemia - Aditya Romansa/ Unsplash

A Rede Feminista de Ginecologistas e Obstetras divulgou uma carta pública nesta quarta-feira (7) em que alerta o governo e a sociedade para o elevado número de mortes de gestantes por covid-19 no Brasil.

No documento, a entidade lista uma série de demandas relativas a garantias de testagem, proteção, afastamento do trabalho, vacinação, campanhas educativas e pré-natal universal e adequado ao contexto da pandemia.

De acordo com o texto, o cenário em 2021 continua dramático. Dados do próprio Ministério da Saúde informam 102 casos de óbito materno por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) e 96 casos confirmados de Covid-19.

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"As manchetes de jornais noticiam diariamente casos trágicos de jovens mulheres que perdem a vida durante a gravidez ou no pós-parto, deixando um rastro de desolação, luto e desespero, sem falar em uma legião de órfãos da COVID-19, muitos dos quais prematuros, que se encontram sob os cuidados dos familiares", alerta a carta.

A entidade ressalta que "houve falhas assistenciais em proporção significativa" e cita desorganização nos serviços de assistência pré-natal, suspensão de consultas e falta de estrutura nos atendimentos para mulheres infectadas pelo coronavírus.

"Encontramos problemas importantes de acesso ao atendimento adequado da COVID-19, falta de testes diagnósticos, falta de insumos terapêuticos e de leitos de UTI específicos para a população obstétrica", relata a entidade.

No ano passado, um estudo que envolveu diversas instituições indicou que 8 em cada 10 mortes de gestantes e puérperas contaminadas pela covid ocorreram no Brasil.

Outra pesquisa avaliou os casos de SRAG na gravidez e pós-parto. A conclusão é de que 40% das pacientes que morreram não conseguiram vaga em UTI e 6% não foram sequer hospitalizadas.

Foi observado também que há mais prevalência de óbitos entre mulheres pretas, que vivem em áreas periféricas, não têm acesso Programa de Saúde da Família e vivem a mais de 100km de qualquer hospital de referência (7).

A repercussão desses estudos não foi suficiente para que o poder público tomasse providências, na percepção da Rede Feminista de Ginecologistas e Obstetras.

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"Embora o Ministério da Saúde tenha publicado em setembro seu Manual de Recomendações para a Assistência à Gestante e à Puérpera Frente à Pandemia de COVID-19 (9), não houve modificações importantes da estrutura, dos exames e do fluxo de atendimento, e as mortes continuaram acontecendo", afirma o texto da entidade.

Vacina

Já há recomendação técnica no Brasil para a administração da vacina em gestantes com hipertensão, obesidade, doença cardiovascular, asma brônquica, imunossuprimidas, transplantadas, doenças renais crônicas e doenças autoimunes.

A Rede Feminista de Ginecologistas e Obstetras alerta, no entanto, que a lentidão da campanha de vacinação faz com que um volume grande de gestantes e puérperas com comorbidades continuem expostas.

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Ainda de acordo com a entidade, é preciso ampliar esse público, "conforme já bastas vezes demonstrado, gravidez e puerpério são per se fatores de risco para complicações e morte por COVID-19, de forma que TODAS as gestantes e puérperas deveriam ser contempladas – e com urgência – no Plano Nacional de Imunização".

Leia abaixo a relação de ações urgentes listadas pela Rede Feminista de Ginecologistas e Obstetras para redução da mortalildade materna por covid-19 no Brasil.

1. Informação, oferta e acesso a métodos contraceptivos – infelizmente, muitos serviços de planejamento reprodutivo interromperam o atendimento durante a pandemia e é impossível reduzir mortalidade materna sem garantir contracepção adequada e prevenir gestações não planejadas.

2. Campanhas específicas envolvendo informação e esclarecimento sobre os riscos da COVID-19 na gravidez e no pós-parto, permitindo que as mulheres possam tomar decisões livres e conscientes sobre a possibilidade de postergar a gravidez para outro momento em que a pandemia esteja controlada. Além disso, alertar as gestantes para os devidos cuidados individuais: isolamento (sair somente para consultas e exames pré-natais ou motivos imprescindíveis), usar máscaras N95 e álcool gel.

3. Reforço e aconselhamento das medidas de proteção individual nas consultas pré-natais.

4. Garantir afastamento das gestantes de sua função laboral presencial em todo o país – atualmente depende de cada município, órgão ou de o patrão aceitar o atestado médico.

5. Garantia de acesso ao pré-natal de qualidade, sem interrupção das consultas, sem “alta” do pré-natal.

6. Renda mínima aceitável, justa e adequada para as gestantes que não têm trabalho formal, permitindo que possam ficar em casa.

7. Distribuição gratuita de máscaras N95 para gestantes.

8. Ampla testagem na porta de entrada das maternidades com testes rápidos moleculares.

9. “Testes, testes e mais testes” para todas as gestantes e puérperas com sintomas ou contatos de pessoas com sintomas.

10. Garantia de internação em UTI em instituições que garantam acompanhamento obstétrico de qualidade (sete dias por semana, 24 horas por dia)

11. Inclusão imediata das gestantes no grupo prioritário de vacinas (TODAS as gestantes e não somente aquelas com comorbidades) e vacinação célere da população.

Edição: Vinícius Segalla