Risco à saúde

DF: Tendas de atendimento a dengue são desmontadas após denúncias do Conselho Regional de Medicina

Inspeção do órgão apontou inúmeros problemas, como falta de equipamentos e de estrutura para higienização das mãos

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
Tenda de hidratação no Sol Nascente - Imagem: divulgação do CRM

A Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SES-DF) e o Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal (CRM-DF) se reuniram na quinta-feira (18) e decidiram que sete tendas de hidratação, destinadas ao tratamento de pacientes com dengue, serão desmontadas.

Na prática, as tendas funcionam como barracas provisórias em que os enfermos devem aguardar para receber o soro de reidratação oral. De acordo com informações da Secretaria, a retirada das estruturas deve ocorrer nesta segunda-feira (22) por conta de irregularidades identificadas pelo CRM-DF. As tendas interditadas pelo CRM-DF estão localizadas nas regiões administrativas Sol Nascente, Santa Maria, Samambaia, Recanto das Emas, São Sebastião, Estrutural e Sobradinho.

De acordo com a presidenta do CRM-DF, Lívia Vanessa Pansera, uma inspeção revelou diversos problemas, como a falta de equipamentos para emergências, ausência de estrutura para higienização das mãos entre os atendimentos, falta de privacidade durante os atendimentos comprometendo o sigilo médico e dificuldades para transferência de pacientes em estado grave.

Ao todo o Governo do Distrito Federal instalou nove tendas com a finalidade de atendimento a pacientes infectados por dengue. Com a retirada dessas sete indicadas pelo CRM, a expectativa é que o GDF construa outras com suporte adequado e ampliado. Em nota, o GDF alega que “cinco novas tendas instaladas neste mês, por sua vez, têm estruturas mais complexas e maiores, com consultórios, equipamentos, mobiliário e climatização”.

Crise de dengue no DF

O Distrito Federal registrou 270 mortes por dengue e 224.935 casos prováveis nos primeiros quatro meses de 2024. Ao longo desse período, o DF se tornou a unidade federativa com maior incidência de casos de dengue no país. Em uma semana, foram 35 óbitos e 14.488 novos casos. Os dados foram divulgados no último boletim epidemiológico da Secretaria de Saúde no dia 16 de abril.

A região de saúde com maior incidência de casos prováveis são: Oeste (Brazlândia, Ceilândia, Sol Nascente/Pôr do Sol) contabilizou 46.959 casos; Sudoeste (Águas Claras, Arniqueira, Recanto das Emas, Samambaia, Taguatinga, Vicente Pires) apresentou 37.893 casos; Sul (Gama e Santa Maria) teve 21.311; região Leste (Itapoã, Jardim Botânico, Paranoá, São Sebastião) marca 15.639 casos. Centro-Sul (Candangolândia, Guará, Núcleo Bandeirante, Park Way, Riacho Fundo, Estrutural, Sia) notificou 15.483 casos; a região Norte (Arapoanga, Fercal, Planaltina, Sobradinho) registrou 15.316 casos.  A região Central (Cruzeiro, Lago Norte, Lago Sul, Plano Piloto, Sudoeste/Octogonal, Varjão) é a área com menor índice.

Na relação de situação epidemiológica da dengue por Região Administrativa, a RA de Ceilândia apresentou o maior número de casos prováveis (29.103), seguida por Samambaia (13.349), Santa Maria (12.786), Taguatinga (10.902), e Sol Nascente/Por do Sol (8.916). Estas cinco regiões administrativas concentraram 75.056 registros, ou seja 34,04% dos casos prováveis de dengue do DF.

Das 35 RAs do DF, 30 apresentam com taxas consideradas altas. Na classificação média, estão Jardim Botânico, Águas Claras, Park Way, SIA, Sudoeste/Octogonal. Segundo esses critérios, não existe no DF região com baixa incidência.

Diante desses fatos, a Comissão de Educação, Saúde e Cultura da CLDF e o fórum realizado pelo Conselho Regional de Medicina (CRM) tomaram a iniciativa de levar à câmara um retrato atualizado das demandas dos profissionais que estão na linha de frente do combate à dengue. Foram convidados para audiência, realizada no dia 18 de abril, a Secretaria de Saúde, a Secretaria de Economia e a Casa Civil que compõem o Governo do Distrito Federal, mas nenhum membro do executivo compareceu, apesar de terem confirmado presença na manhã do mesmo dia.


Tenda de hidratação / Imagem: Divulgação do CRM-DF

Falta de prevenção

Os parlamentares e profissionais de saúde presentes na audiência foram unânimes em afirmar que a crise de dengue não teria atingido o atual nível no Distrito Federal se as demandas de prevenção fossem atendidas quando foram informadas ao GDF ainda em 2023.

De acordo com a presidenta do CRM-DF, uma inspeção revelou diversos problemas, como a falta de equipamentos para emergências, ausência de estrutura para higienização das mãos entre os atendimentos, falta de privacidade durante os atendimentos, comprometendo o sigilo médico, e dificuldades para transferência de pacientes em estado grave.

Segundo o presidente da CESC, deputado distrital Gabriel Magno, em agosto do ano passado já havia sido realizada uma comissão geral no plenário para alertar a Secretaria de Saúde “sobre o encerramento dos contratos temporários de várias categorias na área de saúde. Cerca de mil contratos de agentes de vigilância ambiental em saúde e agentes comunitários de saúde estavam prestes a acabar e sem possibilidade de renovação de contrato. Avisamos ao GDF que a saúde iria perder mil profissionais que estavam naquele momento em trabalho de planejamento da prevenção para a chegada da estação típica de dengue”.

Pansera acrescentou que essa carência para atender a dengue foi preenchida com profissionais que já estavam alocados em postos de trabalho na assistência primária. “São técnicos que se deslocaram para atender o pico de dengue e, consequentemente, deixaram outro vácuo na demanda ordinária da saúde pública no DF. Ou seja, o que acontece no cotidiano do Centro de Saúde, como as consultas, acompanhamentos de outras diversas condições de saúde deixaram de ser atendidas. O resultado é uma desorganização da atenção primária”, explicou a médica.

Ela descarta o argumento utilizado pelo governo com relação à suposta falta de disponibilidade orçamentária e que esse recurso ficou retido com o GDF. “O que observamos com os dados já no início de 2024 é que foi investido na saúde apenas 30% do que tinha disponível para essa área. Como podemos falar em prevenção se não tem investimento?”, questionou.

Negligência do governo

O CRM-DF considera um erro em matéria de política pública o fato de que o governo adotou as tendas de hidratação como principal estratégia de enfrentamento à dengue. “Essas tendas são válidas desde que elas sejam coordenadas, que tenham estrutura e retaguarda”, explica Pansera.

Entretanto, esse suporte não foi efetivado pelo GDF e a realidade encontrada pela equipe de fiscalização do Conselho foi de “péssimas condições de trabalho e de ambiente prestado à população. Ambientes extremamente insalubres e inadequados para a assistência à saúde, de fato um profundo desrespeito ao usuário e aos trabalhadores da saúde que tentam lidar com uma estrutura tão precária”.

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No mês de março, o CRM-DF notificou o GDF com um “Termo de Indicativo de Interdição Ética” nas condições oferecidas nessas tendas. De acordo com a entidade, foi verificado “ausência de equipamentos para intercorrências, estrutura com higienização precária, dificuldade de remoção de pacientes, ausência de insumos e medicações, ausência de acolhimento e classificação de risco, longo tempo de espera para a realização de exames dos pacientes graves”.

O termo lançado pelo Conselho afirma que “várias tendas seguem sem soro de reidratação oral em quantidade suficiente, e os materiais e medicamentos destinados a situações de emergência não se encontram organizados de forma que possam ser utilizados adequadamente”.

Pansera afirma que desde então, poucos problemas foram atendidos e que “a solução encontrada pelo GDF foi a construção de novas tendas e que só estão sendo construídas agora nesta semana”.

A médica também acrescenta que foi encaminhado “para o governo do Distrito Federal uma série de propostas para melhoria do serviço público de saúde e o tratamento da crise dengue. Ouvimos pela Casa Civil e pela imprensa que o GDF a rejeitou essas medidas por consideram que não era um propostas técnicas, mas sim propostas de cunho político. Somos técnicos e por sermos os técnicos nas nossas profissões é que somos fomos eleitos legitimamente como representantes de nossas categorias e esse movimento é um movimento político sim. Estamos lutando por melhoria dos políticas de saúde no Distrito Federal”.

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Fonte: BdF Distrito Federal

Edição: Márcia Silva