Um mês após o assassinato de Bertha Cáceres, líder indígena hondurenha, representante do Conselho Cívico de Organizações Populares e Indígenas de Honduras (COPINH), Gustavo Castro, companheiro de militância e testemunha do crime contra a ativista, afirma: “Todos somos Berta e ninguém pode dizer que está fora de perigo. O que importa é a unidade dos movimentos, porque isso gera muita força”.
Em entrevista à Rádio Progresso, de Honduras, Castro diz que a violência que vitimou Berta é forte e persiste no país centro-americano. “Estes acontecimentos lançam uma mensagem ao povo de Honduras de que é preciso ter cuidado; não se pode baixar a guarda”, alerta.
Berta – reconhecida mundialmente por sua luta com os povos indígenas, camponeses e em temas ambientais – foi abordada por um grupo de homens armados, enquanto dormia em sua casa, em La Esperanza, Honduras, na madrugada do último dia 3 de março. Na noite do crime, o mexicano Gustavo Castro, que atua na defesa dos direitos humanos e bens naturais, encontrava-se na casa da hondurenha. Mesmo ferido, Gustavo sobreviveu ao ataque.
Em um primeiro momento, a Justiça hondurenha impediu o imediato regresso de Castro a seu país e afirmou que garantiria a segurança da testemunha. Contudo, na última quinta-feira (31) a juíza Victorina Flores Orellana acatou a solicitação do Ministério Público para suspender a medida cautelar que proibia o mexicano de sair de território hondurenho. No dia seguinte, Castro pode regressar ao México.
Antes de sair de Honduras, Gustavo concedeu uma entrevista exclusiva à Radio Progresso, de Honduras, na qual agradeceu profundamente ao povo hondurenho, às ações internacionais de solidariedade e lembrou, com orgulho, a importância da Berta nos processo de resistência e luta para a América Latina.
“Nós estamos enfrentando um poder muito forte, mas com o assassinato de 'Bertita', é como se este espírito renascesse por todos os cantos e gerasse unidade. Esse é o espírito de Berta. Imaginava a casa 'Utopia, [sede] do COPINH, onde posavam os pássaros, e pensava que Berta estava ai, que Berta era um deles, sobrevoando as montanhas de La Esperanza, o rio Gualcarque, nos guiando, nos fortalecendo, nos dizendo que, de qualquer jeito, vale a pena”, relata, emocionado.
Reafirmando a convicção na luta de defesa dos direitos humanos e pela preservação do meio ambiente, Castro acrescenta: “A dignidade não se vende, os territórios não se vendes, o respeito aos direitos humanos, à autonomia e à esperança dos povos não têm preço. Bertha nos convidava a voar junto com ela”.
Uma das lutas de Berta lembrada pelo mexicano na entrevista é a contra o modelo produtivo extrativista, que concentra riquezas e atinge o povo hondurenho. “O que estamos enfrentando é muito forte. São poderes obscuros e muito fortes, cheios de ambição. Por isso o COPINH tem sido um exemplo de luta e de força inquebrantável, dos companheiros e companheiras das comunidades indígenas que têm marchado sem descanso para exigir respeito, seus territórios livres de todos os megaprojetos que querem nos submeter e querem nos despejar”.
Ele ainda reforçou: “É uma luta não só pelo bem de Honduras, mas também pelo bem da América Latina, do planeta. Não podemos seguir permitindo que esse processo siga avançando e siga destruindo esperanças”.
Durante a entrevista à Rádio Progresso, Gustavo não perdeu a oportunidade de manifestar seu agradecimento a cada um das organizações, familiares e amigos que lhe acompanharam após o assassinato de sua amiga e companheira de luta.
Carta Pública
No ultimo sábado (2), a mãe de Berta, a senhora Austra Bertha Flores López, de 83 anos, lançou uma carta pública na qual repudiou o assassinato de sua filha, agradeceu a solidariedade e exigiu justiça.
Para Austra, um dos responsáveis pelo assassinato de Berta é o Estado hondurenho. Segundo afirma no texto, o Estado de Honduras faltou com o compromisso internacional de garantir a vida da lutadora, que estava na lista de pessoas ameaçadas de morte após o golpe de 2009 no país, que depôs o presidente Manuel Zelaya.
Além disso, o Estado dirigia suas ações no sentido de garantir os interesses das corporações extrativistas e criminalizar as organizações e movimentos populares. “O Estado de Honduras tem assumido o papel de defensor dos interesses das empresas extrativas, ao passo que quando minha filha, na sua condição de coordenadora geral de COPINH, dirigiu uma marcha, em fevereiro passado, na presença de policiais e do Exército, ela foi xingada e ameaçada por pessoas ligadas ao DESA [Desarrollos Energetico S.A, empresa com vinculação ao megaprojeto hidroelétrico no Rio Gualcarque, que, segundo os movimentos, geram impactos em comunidades indígenas de Lenca], e estes assumiram uma atitude de repressão”, lembrou.
Além de responsabilizar o Estado por deixar o caminho livre para o assassinato acontecer, Austra denunciou a falta ações para encontrar os responsáveis diretos e a contaminação da cena do crime para obstaculizar os processos na Justiça.
*Edição: Vivian Fernandes
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