Pela primeira vez em quase 56 anos, a capital federal vive a inusitada situação de um ter um muro instalado na Esplanada dos Ministérios, dividindo a área para separar manifestantes contra e a favor do impeachment da presidenta Dilma Rousseff. Sempre que são realizadas manifestações com grupos diferentes, a prática é ceder o espaço para quem fizer primeiro a solicitação formal, com os depois ocupando espaços próximos. Desta vez, decisão conjunta do governador Rodrigo Rollemberg (PSB) e do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), acatada pela Secretaria de Segurança Pública do Governo do Distrito Federal, levou à construção do muro.
A ideia é fazer com que do lado esquerdo fiquem os manifestantes favoráveis à votação pelo afastamento, e do lado direito os manifestantes que apoiam a manutenção do mandato presidencial. A votação no plenário da Câmara está prevista para o próximo domingo (17). Ontem, a comissão especial do impeachment aprovou o relatório, favorável ao impedimento, por 38 votos a 27.
No total, o muro, que ainda não foi concluído, custará R$ 8 mil para o governo do Distrito Federal. O trabalho é feito por pessoas que fazem parte de programa de reinserção social para ex-detentos. Hoje (12), sob forte calor e com clima de ressaca por causa da votação do relatório, quem ficou no local foi mesmo para trabalhar e concluir a construção, além de veículos de equipes de TV, que já montam estações específicas para a cobertura do domingo. O sistema começou a funcionar ontem à noite, mesmo com o muro inacabado. Muitos se preocupam com a estratégia.
“É muito temeroso. Não sabemos se esse reforço cairá ou será derrubado pelos manifestantes. Se isso acontecer, teremos pessoas feridas. Tomara que dê certo, mas estamos temendo uma grande confusão”, afirmou Adriano Caetano, servidor do Governo do Distrito Federal. Ele disse que está acostumado a participar de manifestações pelo impeachment desde o ano passado e tem atuado na coordenação dos trabalhos.
Decisão estratégica
“É uma decisão estratégica que não foi pensada de forma aleatória. Entre o muro haverá um espaço de dez metros dos dois lados, que ficará tomado por policiais civis, militares, servidores da polícia legislativa e representantes das forças de segurança nacional. Tudo isso será feito para garantir maior segurança e permitir aos cidadãos se manifestarem de forma pacífica. Não há motivos ter medo”, defendeu, por sua vez, o assessor administrativo João Miranda, do Ministério da Defesa.
Nesta manhã, representantes do movimento Vem Pra Rua, contrário ao governo, afirmaram que vão entrar com ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para pedir que a área seja ocupada por apenas um grupo de manifestantes, a serem escolhidos. Eles querem que os demais manifestantes, com pensamentos divergentes, fiquem, a exemplo de movimentos anteriores, em áreas próximas como a frente da Rodoviária e o Eixo Monumental – que segue da rodoviária até o Palácio do Buriti, sede do governo local.
"A rigor legal, a Esplanada deveria ser nossa, pois registramos um informe de uso da Esplanada muito antes do outro grupo, mas o importante é que seja garantida a segurança. Ninguém está interessado em ver violência”, disse um dos coordenadores do movimento em Brasília, Jailton Almeida. "Nada disso, eles fizeram o pedido em manifestações anteriores. Não vale para esta. Eles não podem ter o monopólio da Esplanada porque pediram para usar a área vários meses atrás", contestou o servidor da Câmara e manifestante contra o impeachment Robson Andrade.
Sem privilégios
“Não concordo que um grupo seja privilegiado em detrimento de outro, mas é preciso cuidado. Talvez fazer com que os manifestantes se revezem em horários diferentes na área em frente ao Congresso, não sei. Mas já decidi que não trarei minha esposa e filhos para cá neste domingo. Isso aqui está nitroglicerina pura”, afirmou o engenheiro Alexandre Ferraz, assessor concursado da Controladoria Geral da União (CGU).
“Estamos fora do local, hoje, porque tiramos o dia para descansar, mas os colegas estão chegando. Vamos ficar aqui, sim, e se depender de nós não haverá bagunça, nem brigas. A bagunça é coisa de desesperados e desespero é o que não temos. É como diz nosso slogan: não vai ter golpe, vai ter luta. E luta não significa, necessariamente, troca de tapas”, disse o agricultor Antonio Tavares. Ele integra um grupo de trabalhadores do interior de Goiás, que ocupa Brasília desde a noite do último domingo. Eles estão instalados em uma área em frente ao estádio Mané Garrincha.
Na Câmara, o presidente da comissão especial do impeachment, Rogério Rosso (PSD-DF), manifestou sua preocupação. "Cada vez que se ergue um muro, se segrega um povo", afirmou. "Não é hora de construirmos muros, mas de, independente do resultado que vier a ter a votação, buscarmos um consenso para unir o país. E os manifestantes que estarão lá fora também precisam ter esse sentimento.”
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