Dois advogados do Rio de Janeiro vão entrar, amanhã (27), com processo na Procuradoria-Geral da República e na Corregedoria da Câmara dos Deputados pedindo que o deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ) se torne réu do crime de apologia à tortura, por dedicar seu voto pelo impeachment da presidenta Dilma Rousseff, na sessão do dia 17, a Carlos Alberto Brilhante Ustra, primeiro militar a ser reconhecido pela Justiça como torturador, em maio de 2008. O processo reúne ações individuais de pelo menos 60 pessoas, feitas ao Ministério Público Federal.
O processo pede que o MP deflagre uma ação penal contra o deputado, quebrando sua imunidade parlamentar e tornando-o réu pelo crime de apologia. "Pela família, pela inocência das crianças em sala de aula, que o PT nunca teve, contra o comunismo, pela nossa liberdade, contra o Foro de São Paulo, pela memória do Coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra – o pavor de Dilma Rousseff –, pelo exército de Caxias, pelas Forças Armadas, pelo Brasil acima de tudo e por Deus, o meu voto é sim", disse Bolsonaro durante a sessão.
"A OAB-RJ (Ordem dos Advogados do Rio de Janeiro) também entrou com uma ação institucional contra Bolsonaro. A nossa é uma ação de pessoas da sociedade civil que querem que o deputado seja punido", explica um dos advogados responsáveis, Wallace Martins, que entrará com o processo junto à também advogada Eloisa Samy Santiago. "Não são pessoas sequer ligadas a partidos políticos. São cidadãos que estão indignados fala de Bolsonaro."
Caso o Ministério Público julgue que tem elementos suficientes para acatar o pedido dos advogados e denunciar Bolsonaro, ele será julgado pelo Supremo Tribunal Federal e terá apenas 15 dias para fazer sua defesa. No limite poderá ter seu mandato cassado e cumprir pena de três a seis meses de detenção, além de multa.
"Bolsonaro ultrapassou e muito a imunidade parlamentar, que resguarda os deputados de crimes de honra, como calúnia, difamação e injuria, e mesmo assim com limites. Todos os bens jurídicos encontram um limite. O que ele fez foi uma apologia à tortura", diz Martins.
Ustra foi um dos militares mais temidos da ditadura, tendo chefiado o Destacamento de Operações Internas (DOI-Codi) de São Paulo de 1970 a 1974. Ele foi apontado por perseguidos políticos e familiares de vítimas como responsável por perseguições, tortura e morte de opositores ao regime.
O Dossiê Ditadura, da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos, relaciona o coronel com 60 casos de mortes e desaparecimentos. A Arquidiocese de São Paulo, pelo projeto Brasil: Nunca Mais, denunciou mais de 500 casos de tortura no DOI-Codi quando Ustra era o comandante.
Em maio de 2013, ele compareceu à sessão da Comissão Nacional da Verdade. Apesar do habeas corpus que lhe permitia ficar em silêncio, Ustra respondeu a algumas perguntas. Na oportunidade, negou que tivesse cometido qualquer crime durante seu período no comando do DOI-Codi paulista. Disse também que recebeu ordens de seus superiores no Exército para fazer o que foi feito, e que suas ações à frente do órgão tinham como objetivo o combate ao terrorismo.
Em abril de 2015, a ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Rosa Weber suspendeu uma das ações penais contra Ustra, que tramitava na Justiça Federal em São Paulo. Atendendo pedido feito pela defesa do militar, a ministra disse, na decisão, que suspendeu a ação, pois era necessário aguardar o julgamento da Lei da Anistia, pela própria Corte. O militar morreu em outubro do ano passado, em decorrência de um câncer.
Na semana passada, a presidenta Dilma, que foi presa e torturada durante a ditadura, falou publicamente sobre o fato em uma coletiva a jornalistas estrangeiros. "Acho lamentável. Eu, de fato, fui presa nos anos 1970, de fato conheci bem esse senhor (Ustra) ao qual ele (Bolsonaro) se refere. Ele foi um dos maiores torturadores do Brasil", disse. "É terrível ver alguém votando em homenagem ao maior torturador que este país já conheceu."
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