Neste mês, tivemos a notícia da divulgação de 11,5 milhões de documentos do escritório de advocacia panamenho Mossack Fonseca pelo jornal alemão “Süddeutsche Zeitung. A atividade desse escritório é de assessoria e confecção de contratos para instalação de empresas em paraísos fiscais “offshores”. Aproximadamente metade das empresas que passaram pelo Advocacia Mossack Fonseca tem como endereço as Ilhas Virgens, conhecido paraíso fiscal localizado no Caribe. O escritório não é responsável pelas operações, a cadeia é fragmentada para dificultar a apuração do fluxo do dinheiro e/ou bens.
Os paraísos fiscais são usados para pagar menos impostos ou nenhum (a alíquota é zero ou bem menor do que a do país de origem) ou para ocultar bens e patrimônio por meio de segredo bancário. Nestes paraísos as operações estão sobre segredo fiscal. Criar empresas ou ter dinheiro em paraísos fiscais não é ilegal, desde que o dinheiro ou bem tenham origem e sejam declarados ao fisco do país. Deve-se apurar qual a base fiscal e se houve ou não pagamento de impostos sobre a origem do dinheiro. Existem paraísos fiscais onde não se declara de onde vem e nem para onde vai o dinheiro depositado.
Na lista de clientes da Mossack Fonseca constam muitos brasileiros, entre eles, pessoas citadas na operação Lava Jato, muitos políticos ou filhos de políticos tradicionais brasileiros, inclusive de Belo Horizonte. O nome de Gabriel Lacerda, filho do Prefeito Marcio Lacerda, consta na lista.
As pesquisas e apurações da lavagem de dinheiro em paraísos fiscais devem ser um tema fundamental para a sociedade, pois, por trás dessas operações, se escondem o crime organizado (pirataria, terrorismo, narcotráfico, contrabando, corrupção em todos os níveis de governo) e a sonegação fiscal de empresas ou pessoas físicas. Com essas operações passam, de uma forma ou de outra, toda a economia informal do país. Em alguns países, como o México, o esquema é tão grande que supera a economia formal.
As pessoas devem saber que o uso de paraísos fiscais as afeta direta ou indiretamente, pois o dinheiro ou os preços de transferências decorrentes do subfaturamento são operações realizadas sem o pagamento devido dos impostos (por exemplo, o envio de mercadorias com um valor bem menor do que o real ao paraíso fiscal, que dali as exporta com o preço real; serviços prestados entre transnacionais operam da mesma forma: cobram um valor menor no Brasil e a diferença é depositada em um paraíso fiscal). Todos devem ter consciência de que o pagamento do imposto justo faz parte da luta social, pois é com ele que financiamos a educação, saúde , transporte e todos os diretos sociais.
Quando se fala em pagamento justo, a proposta vai além do simples pagamento de impostos. Pressupõe-se uma base tributária que proporcione a implementação políticas públicas que assegurem os direitos das pessoas e reverter as desigualdades sociais.
Os “Panama Papers” escancaram a “ponta do iceberg” dos esquemas espúrios entre poder público e meio empresarial. O mundo empresarial burlar o pagamento devido dos impostos já é de grande gravidade e mostra a real face egoísta e sanguessuga dos povos. O problema se agrava quando atores envolvidos com o bem público, cujas ações deveriam ser de proteção do Estado e seus serviços prestados à população, se corrompem por esse modus operandi, sonegam e permitem sonegar, se aproveitam da máquina pública para enriquecer, se beneficiam e beneficiam seus comparsas (família ou amigos).
A tarefa de sensibilizar a sociedade tem sido realizada pela “Plataforma por la Justicia Fiscal”. Integram este movimento várias entidades, como Economistas Sem Fronteiras, Oxfam Itermón, InspirAction, Alianza Española contra la pobreza, COOO, USO, UGT, ATTAC, Red Latinoamericana sobre Deuda, Desarrollo y Derechos – LATINDADD e Red de Justicia Fiscal de América Latina y el Caribe - RJFALC (no Brasil, representada pela Auditoria Cidadã da Dívida - ACD, Instituto de Estudos Socioeconômicos - INESC, Instituto de Justiça Fiscal - IJF, Internacional de Servidores Públicos – ISP, Rede Brasileira de Integração dos Povos – REBRIP).
*Eulália Alvarenga é economista, auditora fiscal e representante da Auditoria Cidadã da Dívida na Red de Justicia Fiscal de América Latina y el Caribe
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