Agricultura

Ceará pode proibir pulverização de agrotóxicos por aviões

Estado pode seu o primeiro do país a tomar a medida; método intensifica efeitos negativos de substâncias

Redação |
68% do volume aplicado de agrotóxico não atinge plantas
68% do volume aplicado de agrotóxico não atinge plantas - Wikicommons

A pulverização de agrotóxicos por aviões – método que aprofunda o impacto do uso de venenos – pode estar com os dias contados no Ceará. O Projeto de Lei n.º 18 de 2015, proposto pelo deputado estadual Renato Roseno (PSOL), pretende vetar esse tipo de aplicação no estado. Caso aprovado, a medida seria a primeira do tipo no país.

A proposta foi aprovada na Comissão de Constituição, Justiça e Redação da Assembleia Legislativa do Ceará (Alce). Agora, deve passar por outros três colegiados: Trabalho, Administração e Serviço Público; Indústria, Comércio, Turismo e Serviço; e Agropecuária. Se confirmada nestes espaços, vai ao plenário da Casa.

A ideia, segundo Roseno, veio “dos movimentos dos trabalhadores rurais, da pequena agricultura camponesa, dos ambientalistas e dos especialistas no assunto”. “São vários [grupos] que estão defendendo o fim da pulverização aérea, dado que não há parâmetros seguros para esse método”.

Impacto

A pulverização aérea amplia a área afetada pelos efeitos nocivos dos agrotóxicos, devido a dispersão causada pelo vento. “Tudo que a contaminação causa - neoplasias, má-formação fetal, aborto espontâneo, mutação genética - é potencializado”, pontua Roseno.

“Há muitas pesquisas mostrando isso: [apenas] 32% dos agrotóxicos pulverizados ficam retidos nas plantas alvo, 19% migram, pelo ar, para áreas circunvizinhas e 49% vão para o solo - uma parte evapora e volta para o ar e outra parte, por ação da chuva, vai par ao lençol freático. [Esse método] atinge áreas de pequenos agricultores, lagos, açudes”, afirma Raquel Rigotto, professora da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará. Segundo estudos, a pulverização por aviões pode atingir um raio de até 32km do local de aplicação.

“Uma pesquisa levantou a hipótese de que esse veneno que fica no ar poderia estar se condensando nas nuvens. Realmente, foi encontrado veneno na água de chuva”, diz Rigotto, em referência a um estudo conduzido pelo professor Wanderlei Pignati, da Universidade Federal do Mato Grosso.

Efeitos

“Há dois grupos principais de efeitos. Os mais conhecidos são os agudos, a intoxicação que acontece na hora, ou até 15 dias depois de uma exposição intensa. Isso é mais comum entre trabalhadores do campo e com comunidades no entorno onde há pulverização área. De outro lado, há um amplo leque de efeitos crônicos, alguns dos agrotóxicos são muito relacionados com o câncer”, explica Rigotto. Ela cita como exemplo o malathion, muito usado na produção agrícola: “Reconhecido pela Organização Mundial da Saúde, através da Agência Internacional de Pesquisas Sobre Câncer, como provável [produto] cancerígeno”.

Por conta da ampliação das áreas de contaminação pela pulverização aérea, a União Europeia proibiu seu uso no final de 2009. O bloco regional pode ser usado para mais comparações: dos 50 agrotóxicos mais utilizados no Brasil, 22 são proibidos na Europa.

A experiência internacional de resistência aos agrotóxicos inspira o projeto de Roseno.“Nós utilizamos como referência os parâmetros da União Europeia que vedaram a pulverização”, diz o parlamentar. Outra inspiração é Zé Maria do Tomé, pequeno agricultor cearense morto em 2010 com 21 tiros por conta de sua militância contra a pulverização aérea. “Caso seja aprovada, queremos dar a essa lei o nome dele”, afirma o deputado.

Uma campanha on-line pede assinaturas em apoio ao PL. Acesse aqui.

Edição: Simone Freire.

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