Para muitas meninas e mulheres pobres do Brasil, encontrar um príncipe encantado, se casar e mudar de vida é o maior sonho. Entretanto, durante essa busca, algumas encontram apenas lobos maus.
O Brasil é uma das rotas preferenciais do turismo sexual no mundo. Isso se deu entre as décadas de 1980 e 1990, quando o mercado asiático começou a ficar saturado.
Em entrevista ao programa Amazônia Brasileira desta quarta-feira (9), o cineasta e diretor do documentário “Cinderela, Lobos e um Príncipe Encantado”, Joel Zito Araújo, falou sobre o filme e sobre suas impressões, em relação ao turismo sexual no Brasil.
Cinderela, Lobos e um Príncipe Encantado mostra o universo de meninas e mulheres que sonham em se tornar Cinderelas, casar com um príncipe encantado e mudar de vida. O documentário mostra um intercâmbio de ilusões, degradação e abismos culturais, que chocam e emocionam.
No filme, Joel Zito Araújo entrevista tanto turistas, quanto mulheres envolvidas nesse turismo sexual. Ele mostra a exploração de crianças e adolescentes e vai até a Alemanha e a Itália, entrevistar as mulheres que foram ganhar a vida no exterior, encontrando desde mulheres que foram iludidas, enganadas e acabaram se tornando escravas sexuais; até as que encontraram homens que realmente gostaram delas, casaram e mudaram suas vidas.
Segundo Joel Zito, que sempre foi um diretor engajado no tema da discussão do preconceito racial, a ideia de fazer esse documentário veio ao descobrir que 70% das mulheres, que os estrangeiros procuram para turismo sexual, quando vem ao Brasil, são negras. “Fiz um levantamento prévio, para entender esse universo e surgiu outra coisa que me chamou a atenção. Nas praias brasileiras, do Rio de Janeiro até o Norte do país, existe um choque, entre o tipo de homem estrangeiro, majoritariamente europeu, com um tipo de beleza que corresponde ao príncipe encantado dos filmes, um homem branco, loiro e dos olhos claros, que vem buscar um tipo de mulher que é desvalorizada pela sociedade brasileira, que é a mulher negra. Sendo assim, em um primeiro momento, observei que é uma relação de valorização da autoestima delas”, revela.
De acordo com o Diretor, 95% das mulheres envolvidas no turismo sexual são de classes sociais mais baixas. “A entrada no universo do turismo sexual é uma forma de ascensão econômica e social. Percebemos uma forma de apartheid racial no Brasil, pois essas mulheres não tem acesso aos equipamentos sociais, que as mulheres de classes sociais mais altas possuem. Elas não frequentam as melhores praias, não vão aos melhores shoppings, não podem frequentar os melhores restaurantes. Então quando um estrangeiro chega e levá-la a um bom restaurante, ao shopping para comprar roupa, essas mulheres começam a circular por espaços sociais que não circulavam, anteriormente, uma parte boa da cidade em que elas não tinham acesso, e isso, além de sedutor, envolve o lado da autoestima também”, analisa.
Joel Zito percebeu que os estrangeiros, que vem em busca desse turismo, querem além do sexo fácil, a possibilidade de encontrar uma mulher diferente das nativas do seu país, geralmente, mulheres que já conquistaram direitos e igualdades, que mulheres brasileira ainda buscam no Brasil. Sendo assim, eles enxergam nessas brasileiras, mulheres iguais as que viviam no século XX, que cuidavam da casa, do marido e dos filhos. “Eles acreditam que casando com essas mulheres, eles não vão se defrontar diante de conquistas como as das mulheres europeias, diante da independência e da liberdade de cobrar que dentro de casa, esses homens dividam os cuidados com os filhos e com a casa. Entretanto, essa foi a surpresa, pois as brasileiras após anos de casamento, adquirem a cidadania e reivindicam, sim, direitos iguais aos das europeias, frente a esses homens”, constata.
O diretor relatou que umas das coisas mais chocantes é a vinda dos estrangeiros, em busca de turismo sexual, com crianças e adolescentes. “O que me chocou de verdade foi a cumplicidade da sociedade brasileira com essa exploração. Eu estive em cidades onde classes sociais mais altas, não se importavam com esse turismo. Fui em uma praia onde um estrangeiro estava com uma menina de 10 anos no colo, convivendo, tranquilamente, com as pessoas em volta e ninguém se importava”, relata.
O programa Amazônia Brasileira vai ao ar de segunda a sexta, às 8h, na Rádio Nacional da Amazônia, e às 6h, na Rádio Nacional do Alto Solimões (horário local).
A apresentação é de Sula Sevillis e a produção-executiva, de Taiana Borges.
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