A Câmara de Vereadores de Curitiba aprovou, nesta quarta-feira (18), o Projeto de Lei que multa em R$ 185 os usuários "fura-catracas", que acessam o transporte coletivo sem o pagamento da tarifa. O valor da multa é equivalente a 50 passagens, cobrada em dobro, caso haja reincidência. Proposto pelo vereador Rogerio Campos (PSC), o PL teve amplo apoio na Câmara, tendo voto contrário apenas da vereadora Professora Josete (PT).
Como justificativa, o texto do PL afirma que o custo da tarifa é de acordo com a previsão de passageiros, portanto, cada passageiro não contabilizado no sistema aumentaria o custo para os pagantes. Para André Castelo Branco Machado, integrante da Plenária Popular do Transporte, este argumento "é uma mentira": "Aumentaria o preço da tarifa se o 'pula catraca' tivesse condição de pagar a passagem. Mas, na verdade, se esses passageiros não pularem a catraca, não vão utilizar o transporte coletivo".
Na avaliação de Machado, é um erro não leva em conta a queda constante no número de passageiros. Pesquisa realizada pela Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU) aponta Curitiba no topo do ranking das cidades que mais perderam passageiros no transporte coletivo em 2015. A queda foi de 8% em relação a 2014.
Após a aprovação na Câmara, o PL vai para as mãos do prefeito Gustavo Fruet, para sanção ou veto. Caso seja aceito, a regulamentação deve ocorrer em até 90 dias. O dinheiro arrecadado irá para uma conta específica da URBS, desvinculada do Fundo de Urbanização de Curitiba.
O problema é outro
A CPI do Transporte Público, realizada pela Câmara Municipal em 2013, identificou problemas no processo licitatório das empresas responsáveis pelo transporte curitibano. Entre os fatores que encarecem a tarifa técnica está o pagamento do imposto de renda das empresas e o pagamento do fundo assistencial do Sindicato dos Motoristas e Cobradores de Ônibus de Curitiba e Região Metropolitana. Em janeiro de 2014, o Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR) determinou, em caráter liminar, a redução de R$ 0,43 da tarifa técnica repassada às empresas de ônibus.
Na avaliação da vereadora Professora Josete, são essas irregularidades que deveriam estar em debate quando o assunto é transporte coletivo. "Não se mexe na ferida, não se toca nos pontos centrais do contrato que pudessem garantir que houvesse uma tarifa justa para o usuário". Sem questionar o pagamento indevido de parte da tarifa técnica às empresas, a vereadora garante que há injustiça: "O que ocorre é que sempre são criados mecanismos para fiscalizar e punir o lado mais fraco, que é o usuário".
Quem são os "fura-catracas"?
João* tem 16 anos, mora com os pais e três irmãos, em uma ocupação irregular, na região da Cidade Industrial de Curitiba. Atualmente o pai é o único na casa que está empregado. João está em busca de uma oportunidade como Jovem Aprendiz ou em um emprego formal. "Já vim várias vezes na Agência do Trabalhador do Centro, e muitas vezes tive que esperar uma semana ou duas para juntar o dinheiro para pode vir. E se não conseguia tudo, 'furava' para poder voltar". A distância entre a sua casa e o Centro da cidade é de cerca de 14 quilômetros, no trajeto a pé.
Morador da mesma comunidade, Pedro* estima precisar 'pular a catraca' pelo menos cinco vezes por mês. Aos 18 anos, vive com o pai aposentado. Durante um ano, trabalhou em uma loja de materiais de construção do Centro, como Jovem Aprendiz. Usava o vale-transporte para o deslocamento para o trabalho, mas conta que precisou 'furar o tubo' para conseguir fazer o curso que o levou a conseguir a vaga na loja. "Como que alguém vai pagar valor de 50 passagens se não tem dinheiro para pagar uma?", questiona o jovem.
Um levantamento divulgado pelas empresas de ônibus de Curitiba em maio aponta que, em média, 3.831 pessoas furam a catraca diariamente. Para o integrante da Plenária Popular do Transporte, este número comprova que o problema é o alto preço da tarifa: "Não é um fenômeno isolado, nem uma ação de infratores. É uma questão de sobrevivência".
Os dois jovens moradores da Cidade Industrial contam que, para quem mora nos bairros mais afastados da cidade, não é possível se deslocar sem pagar pelo menos uma passagem nos ônibus alimentadores, por não haver estações tubo. "Se eu já não tenho o dinheiro da passagem, querem que eu faça o quê? Roube? Não, né", questiona João.
*Nomes fictícios.
Edição: ---