O Senado Federal está preste a votar, em segundo turno, uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 143 que retira a obrigatoriedade de gastos em saúde e educação, no valor de 20% da arrecadação de impostos dos estados e municípios. No caso da União, esse percentual seria de 30%.
Essa desvinculação das receitas duraria até 2023, de acordo com a proposta. Para se ter uma ideia, o Conselho Nacional de Saúde estima que, se a medida for aprovada, a perda para o setor de saúde será de R$ 35 bilhões a R$ 45 bilhões já em 2017. Isso representa quase a metade do orçamento anual do Ministério da Saúde, que gira em torno de R$ 100 bilhões. A votação no plenário pode ocorrer já na próxima semana.
Para Thiago Henrique Silva, da Rede de Médicas e Médicos Populares, o projeto atende aos interesses do governo para pagamento dos juros da dívida pública, em detrimento da saúde. “Eles precisam manter o pagamento do superávit, mas como a maior parte das receitas obtidas com os impostos estão vinculadas a gastos determinados, como saúde e educação, eles precisam aprovar uma mudança na Constituição para desvincular essas receitas”, explica.
Até agora, apenas a União tinha autorização constitucional para desvincular receitas obtidas com impostos. Com a PEC nº 143, estados e municípios também ficam desobrigados de aplicar parte dos impostos em saúde e educação.
Segundo o médico Thiago Henrique, o efeito prático dessa medida será devastador. “Se reduzirem o orçamento da saúde, nós não vamos conseguir nem manter postos de saúde. Vários equipamentos de saúde podem ser fechados, inclusive unidades de ponto atendimento e hospitais. Essa é a tendência”, denuncia.
Por causa dessa ameaça, movimentos de saúde ligados à Frente Brasil Popular (FBP) estão organizando ocupações, atos e escrachos em todo o país. Em São Paulo e Pernambuco, atos públicos estão sendo programados para denunciar o desmonte no setor.
Na última segunda-feira (30), por exemplo, trabalhadores da saúde ocuparam a sede do Ministério da Saúde, em Salvador (BA), contra a PEC nº 143. Em Fortaleza (CE), nesta quarta-feira (1º), o ministro da saúde, Ricardo Barros, foi alvo de escracho por mais de quatro mil participantes do Congresso Nacional do Conselho Nacional das Secretarias Municipais de Saúde (Consasems). As imagens foram parar nas redes sociais.
Barros tem dado declarações polêmicas sobre o SUS. Em uma delas, o ministro alegou que o governo não teria condições financeiras para garantir acesso universal à saúde e defendeu que a população migre para planos privados.
Michel Temer X Saúde
O governo interno de Michel Temer também promete limitar gastos do setor. Anunciada na última semana pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, uma proposta de emenda à Constituição – que será enviada nos próximos dias ao Congresso – deve criar um teto no crescimento dos gastos públicos federais. O teto será a variação da inflação média do ano anterior, incluindo despesas com saúde e educação.
Em nota publicada recentemente, o presidente do Conselho Nacional de Saúde, Ronald Ferreira do Santos fez duras críticas à proposta. “A ignorância do ministro da Fazenda também está presente ao desconsiderar que a inflação do setor saúde é muito mais elevada que a taxa média, e que os gastos públicos são crescentes em função principalmente dos custos mais elevados desse setor”, aponta.
Ainda segundo Ronald, não faz sentido limitar os gastos em saúde no Brasil, que já são muito menores que a média de outros países. Em termos consolidados, União, estados e municípios investem, em saúde, cerca de 3,9% do PIB, que são todas as riquiezas geradas no país. Outras nações, com modelos semelhantes ao SUS, investem de 7% a 8% do PIB em saúde.
Nesse cenário, enfatiza Ronald, “não tem como assegurar atendimento de saúde nos mais de 5,5 mil municípios brasileiros, que incluem vacinas para pessoas e animais, fiscalização sanitária de diversos estabelecimentos e ambientes, consultas e exames laboratoriais e de imagem, cirurgias simples, complexas e transplantes, entre outros, ao preço de R$ 3,30/dia per capita!”.
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