Entidades da sociedade civil denunciaram o Estado brasileiro na Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) na tarde desta quarta (8) por incentivar a mineração sem agir para reduzir os danos ambientais e sociais relacionados com a atividade, no Chile.
A denúncia leva em consideração que o Brasil, por meio de bancos públicos, oferece empréstimos às mineradoras e, ao mesmo tempo, as isenta de impostos, sem exigir contrapartidas. A denúncia usa como parâmetro estudo do Instituto de Estudos Socioeconômicos (INESC), que aponta como exemplo dessa situação o Pará, que deixou de arrecadar R$ 21 bilhões entre 1996 a 2015 de mineradoras que atuam no estado, em virtude de isenções. Além disso, flexibiliza legislações e não fiscaliza as normas existentes.
Inicialmente, a denúncia iria se restringir ao desastre de Mariana, em Minas Gerais. Mas, seguindo recomendações da própria comissão, outros 13 exemplos de como a mineração atinge a população com anuência do país foram listados no relatório.
Exemplos
Em novembro de 2015, a barragem do Fundão, em Mariana, de propriedade da Samarco/Vale/BHP Billiton, se rompeu, liberando cerca de 50 metros cúbicos de rejeitos que se misturaram ao Rio Doce. Depois de percorrer e avassalar rios ao longo de 600 quilômetros, a lama atingiu o mar 17 dias depois da tragédia. Pelo menos 19 pessoas morreram.
“Lógico que o caso Mariana tem um destaque, mas é por isso que damos esse panorama sobre a situação da mineração no Brasil. E também tem essa parte mais geral sobre o modelo de desenvolvimento. O minério como cerne de um modelo que tem o Estado como principal fomentador e, ao mesmo tempo, o Estado falhando em adotar medidas capazes de evitar desastres como em Mariana”, explica Caio Borges, advogado da Conectas, uma das proponentes da denúncia, que foi assinada por outras 14 entidades.
Em Santo Amaro, na Bahia, um dos casos listados na denúncia, a população sofre com a contaminação por chumbo produzido pela Plumbum Mineração e Metalurgia Ltda.; em Caetité, no mesmo estado, o problema é a contaminação por urânio, explorado pela empresa estatal Indústrias Nucleares do Brasil S/A.
Em Minaçu, em Goiás, a população respira fragmentos de amianto, extraído na cidade pela Sama Minerações Associadas S.A, controlada pelo Grupo Eternit. A utilização do amianto é proibida em 52 países, justamente pelos problemas que causa ao meio ambiente e à saúde.
Para as entidades que fizeram a denúncia, o minério está no cerne de um projeto de desenvolvimento baseado em commodities. “O problema é que no 'bum' das comoddities, quando elas estão valendo muito no mercado, há uma corrida para aproveitar os preços altos. Nessa fase, o licenciamento é atropelado. Existe flexibilização dos requerimentos para fazer a exploração das minas. Isso já é um risco. E ele se materializa na queda do preço. Porque as empresas tendem a compensar a perda financeira do preço com o aumento da produção, e isso pode ocorrer em detrimento das garantias de segurança das instalações e, no caso de Mariana, da barragem”, detalha Borges.
Mariana
Em relação à Mariana, a denúncia enfatiza que os moradores vinham tendo seus direitos violados antes mesmo do rompimento da barragem. Havia sido negado a participação deles na elaboração nos planos de contingência e o conhecimento sobre os planos de emergência. Também foram subestimados os impactos em comunidades potencialmente atingidas.
Além disso, a comunidade reclama que o acordo estabelecido entre o estado e a Samarco/Vale/BHP Billiton, empresas responsáveis pelo desastre, bloqueiam o acesso dos atingidos à Justiça, ao tentar impedir que as pessoas lesadas busquem solucionar seus problemas juridicamente.
No pós-desastre, o texto do acordo não cria parâmetros claros para o ressarcimento das vítimas, explica o advogado do Conectas. “Os programas socioambientais e socioeconômicos não têm nenhum tipo de indicador. Eles terão de ser construídos. O que significa que hoje não há nenhuma garantia de que haja reparação integral. Simplesmente porque não há forma de mensurar se elas cobriram ou não os danos”, exemplifica.
Mesmo com todas as críticas, o acordo é defendido pelo governo brasileiro, que afirmou durante a sessão na OEA que ele garante o melhor ressarcimento dos atingidos possível.
Edição: Camila Rodrigues da Silva
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