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Interferência de Temer na EBC é "cerco contra a comunicação pública", diz professor

Funcionários, pesquisadores e sociedade se reuniram nesta quarta (15) para um seminário que discutiu os rumos da empresa

Brasília (DF) |
O professor foi um dos participantes do seminário realizado na manhã desta quarta-feira (15), que reuniu diversas pessoas para discutir os rumos e a importância da comunicação pública no país.
O professor foi um dos participantes do seminário realizado na manhã desta quarta-feira (15), que reuniu diversas pessoas para discutir os rumos e a importância da comunicação pública no país. - Agência Brasil

Favorável à extinção da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), o presidente interido Michel Temer tem realizado uma série de interferências na empresa. Para o professor David Amorim, da Universidade de Brasília (UnB), tais ações representam um “cerco contra a comunicação pública”, ou seja, uma tentativa de limitar e comprometer as conquistas já alcançadas no tocante ao setor no país.

“O caso da EBC mostra que estamos vivendo um ataque de forças conservadoras e reacionárias que se dá de uma forma violenta e imoral. Não podemos permitir que ocorra aqui o que aconteceu na Argentina, onde o novo governo simplesmente extinguiu artigos da Lei dos Meios que proibiam a concentração dos meios de comunicação, patrocinando uma ofensiva conservadora”, disse o pesquisador, demonstrando preocupação com o contexto brasileiro.

O professor foi um dos participantes do seminário realizado na manhã desta quarta-feira (15), na sede da EBC, em Brasília (DF), que reuniu gestores, funcionários da instituição, pesquisadores e o público em geral para discutir os rumos e a importância da comunicação pública no país.

No entendimento dos debatedores presentes no evento, este é um momento em que é preciso lutar pela empresa e pelas garantias trazidas pela Lei 11.652, de 2008, que dispõe sobre a EBC e os serviçoes de radiodifusão pública. Choveram críticas ao governo interino de Temer, que, na opinião deles, tem encampado medidas conservadoras, como mudanças na gestão - o que fez com o caso fosse levado à Justiça -, encerramentos de contratos e mudanças na grade das emissoras administradas.

“Por mais que a legislação que rege a Empresa ainda tenha alguns problemas, ela representou um ganho para o país em busca de uma estrutura de comunicação pública e, por isso, precisa ser defendida. Não podemos permitir que, de forma autoritária, um governo, que ainda por cima é ilegítimo, interfira nisso. Se a lei tiver que ser mudada, tem que ser da mesma forma como foi criada: pela sociedade, com participação coletiva. O atentado à EBC é um atentado aos valores democráticos”, criticou Mariana Martins, representante do coletivo Intervozes.

O atual presidente da EBC, Ricardo Melo, cuja destituição realizada pelo governo Temer esteve no noticiário nas últimas semanas, disse, na ocasião, que a comunicação pública é uma das grandes iniciativas da democracia brasileira e precisa ser resguardada. “O modelo de comunicação no Brasil foi criado com base no monopólio da opinião. Nesse contexto, a função da comunicação pública é dar voz aos que não têm voz, e, sem isso, não há democracia”, destacou.

Disputa

No dia 3 de maio, o jornalista Ricardo Melo foi nomeado por Dilma Rousseff como diretor-presidente da EBC, uma semana antes da decisão do Senado que afastou temporariamente a presidenta. Ao assumir interinamente, Michel Temer nomeou o jornalista Laerte Rimoli, destituindo Melo, no dia 17 de maio. A exoneração gerou polêmica e foi parar no Superior Tribunal Federal (STF), que, por intermédio do ministro Dias Toffoli, concedeu uma liminar no dia 1º deste mês, garantindo o retorno de Melo ao cargo.

Na defesa, Melo argumentou que a lei de criação da Empresa estabelece que o mandato é de quatro anos e que os ocupantes só podem ser destituídos por decisão do Conselho Curador da EBC ou por razões legais.

Em nota, o Conselho havia se manifestado de forma contrária à exoneração, afirmando que a intervenção governista na direção da Empresa seria indevida e ilegal porque fere a Lei da EBC, de 2008, que criou mecanismos para garantir a autonomia da Empresa.  

“A EBC não pode ficar ao sabor da troca de governo. Se cada governo que entrar trocar a direção, não vai haver autonomia. Por isso, a Lei criou o mandato de quatro anos, não coincidente com o mandato de presidente da República. Ele é intocável e, se houver algum problema em relação ao mandato, quem tem que avaliar é o Conselho, que é a representação da sociedade, e não o governo. A mídia pública pertence à sociedade e não pode ser tratada como mídia governamental”, afirmou a presidenta do colegiado, Rita Freire, durante o debate desta quarta-feira.

Ela citou ainda a preocupação com mudanças lideradas pelo ex-presidente Laerte Rimoli, que ficou cerca de dez dias no cargo. “Vários contratos foram suspensos para avaliação e também programas que têm a ver com reflexão e debates, mas nenhum programa pode sair da grade sem que o Conselho seja consultado. As coisas foram muito velozes e atropeladas”, criticou.

Entre outras mudanças polêmicas, ela mencionou a determinação que havia sido feita pela presidência interina de que os profissionais dos veículos de comunicação pública não deveriam mais usar o termo “presidenta” nos textos jornalísticos.

“O Conselho emitiu um memorando, em seguida, orientando os profissionais a usarem o termo não só para Dilma, mas para todas as mulheres que se coloquem como tal. É uma espécie de recomendação, de advertência que serve para dar suporte aos trabalhadores da redação, que, muitas vezes, ficam recebendo diferentes orientações”, explicou.

Sobre a EBC

Atualmente ligada às atribuições administrativas da Casa Civil, a EBC é uma empresa pública de comunicação responsável pela Agência Brasil, pela TV Brasil, pela Radioagência Nacional, pelas rádios Nacional do Rio, Brasília, Amazônia, Alto Solimões e pelas rádios MEC, além de ser produtora do tradicional programa Voz do Brasil e responsável pelo canal de TV NBr, que publiciza atos do governo federal.

A EBC tem hoje cerca de 2.600 funcionários, incluindo os das quatro praças (São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Maranhão). Segundo Akemi Nitahara, funcionária da Empresa e membro do Conselho Curador, esse número resulta de um crescimento de 60% dos quadros verificado nos últimos anos.

“O interessante é que a última geração de concursados já ingressou com um espírito de comunicação pública, com discussão política sobre o assunto. Há um comprometimento e uma vontade de fazer esse trabalho dentro dos parâmetros democráticos, que é o que falta no Brasil. É também por isso que nós entendemos que o que está em jogo agora vai muito além dos nossos empregos. É o próprio valor da comunicação pública em si”, destacou a conselheira durante o debate.

O governo

O Brasil de Fato entrou em contato com a assessoria de comunicação da Casa Civil e com o secretário de Comunicação do Governo, Márcio Freitas, para tratar das críticas feitas às mudanças na EBC e tirar dúvidas sobre os atos da gestão, mas não obteve retorno até o fechamento desta matéria.

*Edição: Simone Freire

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