Há um mês mobilizados na greve nacional convocada pela Coordenadoria Nacional dos Trabalhadores da Educação (CNTE) do México, milhares de professores seguem resistindo à Reforma Educacional proposta pelo presidente Enrique Peña Nieto, que prevê cortes nos direitos trabalhistas.
Iniciada em 15 de maio, a paralisação sofre um processo de perseguição e repressão por parte das autoridades do país. Segundo o órgão docente, mais de 4 mil trabalhadores já foram demitidos desde o início do protesto, o que desrespeita o direito à greve. Os estados mais atingidos com as represálias são os de Guerreiro, Chiapas, Oaxaca e Michoacan.
Esses números se somam à detenção de quatro professores oaxaquenhos em outubro do ano passado. Além das recentes prisões dos dirigentes sindicais Francisco Villalobos, secretário da organização, acusado de roubo de materiais educativos como livros; e de Rubén Núñez, secretário regional da coordenadoria, por "operações com recursos de procedência ilícita".
Segundo Graciela Rangel Santiago, responsável pelas relações exteriores da CNTE, a luta dos docentes é para resistir a uma reforma que “não tem nada de educativa”. Em entrevista ao Brasil de Fato, ela explica que esta é uma reforma trabalhista que pretende atacar os direitos conquistados.
Confira a entrevista:
Brasil de Fato – O que propõe a reforma educacional?
Graciela Rangel Santiago – A reforma educacional não propõe nenhum plano ou programa alternativo. A reforma propõe que nós, professores, sejamos contratados por meio de uma avaliação; e que essa avaliação diga se podemos ou não continuar no nosso trabalho. Um docente que trabalha há mais de 30 anos pode ser avaliado como incapaz para esse trabalho e ser demitido, sem direito à pensão. E, também, está se propondo uma pensão universal, na qual o trabalhador estaria se aposentando com uma pensão de menos de 3 mil pesos mexicanos [aproximadamente R$ 500]. Para nós, isso não é uma reforma educacional.
Também propõe uma reforma no ingresso ao magistério. As pessoas que estudavam magistério de nível médio tinham garantida a sua vaga em uma escola, porque ja tinham todo um percurso de estudo. E, no momento de concluir o curso de magistério, faziam o seu exame de ingresso, entregavam o seu trabalho de conclusão de curso e um monte de documentos, o que habilitava as pessoas para trabalharem, formadas em metodologia, pedagogia e demais áreas.
Agora, com a reforma, o que se pretende é fazer um exame universal para o ingresso dos companheiros formados no magistério ao sistema educativo. Mas, este exame, não vai ser só para os graduados no magistério, senão que eles estão chamando todos aqueles que considerem “capazes” para lecionar. Por exemplo, bacharéis que não tem trabalho – engenheiros, veterinários, médicos –, qualquer pessoa que tenha um diploma de nível superior – sem licenciatura – vai poder exercer o cargo de professor. E nós o que dizemos é que se um rapaz que estudou magistério, que estudou metodologia, que estudou pedagogia, que tem todos os elementos necessários para trabalhar frente a um grupo, não pode estar no mesmo patamar de alguém que não estudou para isso. Ou seja, se é arquiteto, provavelmente vai achar alguma disciplina para dar, mas não pode responder frente a um grupo de crianças.
Achamos uma incongruência com os argumentos de qualidade do ensino em relação aos que querem implementar a reforma. Então, nós dizemos que isso não é uma reforma educacional, que nada tem a ver com a educação, nós, como coordenadoria, nos baseamos em critérios em que levamos em conta a antiguidade, a militância e o desempenho ou preparação do docente. Eles [o governo] o que propõem para ascender ao posto de trabalho, como diretor ou chefe de setor, também é uma avaliação universal, na qual não se leva em consideração a antiguidade. Em cada exame, se perde o que se tinha ganhado.
Eles têm tentado usar os pais e mães de família contra nós, dizendo que seus filhos merecem professores de qualidade e que, por isso, vão mudar todo o corpo docente. Eles achavam que em 2016, no mínimo, 30% do corpo docente estaria eliminada e novos professores entrariam nesses cargos. E a gente não tem permitido que isso aconteça. Desde 2013 até hoje, estamos em luta constante. E, desde 15 de maio, estamos em greve nacional, na qual estão participando mais de 28 estados – quando o México tem 32. Faz um mês que os professores estão de plantão na Cidade do México, em Guerrero, em Oaxaca.
Qual tem sido a resposta do governo frente à luta encabeçada pela CNTE?
Junto com a luta, temos tido muita repressão, mas é uma repressão muito seletiva. Eles estão dando um jeito de caçar as lideranças do movimento, os coordenadores. Em outubro do ano passado, foram detidos quatro professores em Oaxaca, devido à sua luta. Depois, prenderam, em fevereiro deste ano, o tesoureiro da sessão de Oaxaca. No sábado (11), Francisco Villalobo, secretário da organização, e, no domingo (12), detiveram Rubén Núñez, secretário-geral da regional 22, de Oaxaca, por "operações com recursos de procedência ilícita".
Com as demissões, as campanhas sujas na TV e as falsas acusações, o governo quer frear uma luta que dura três anos. Como trabalhadores organizados, afirmamos que uma verdadeira reforma educacional precisa do diálogo com aqueles envolvidos na educação, não pode ser feita nos escritórios, sem ter em conta a realidade das comunidades, dos territórios. Nós temos apresentado projetos alternativos ao governo, mas ele se faz de surdo.
Neste sentido, retomamos a greve como ferramenta, denunciando a repressão contra os professores e sem esquecer dos 43 companheiros secundaristas de Ayotzinapa desaparecidos em 2015, como dizemos “vivos os levaram, vivos os queremos”. Esta luta é dos professores, mas também dos estudantes, familiares e de todos aqueles que lutamos pelo direito à educação pública. Apesar dos embates, continuamos resistindo.
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