Com o lema "Nenhum passo atrás!", a Jornada Continental pela Democracia e contra o Neoliberalismo, que aconteceu nesta sexta (8), criou uma nova articulação política entre movimentos sociais, campesinos e sindicais da América Latina. O encontro foi na Faculdade Zumbi dos Palmares, mesmo espaço onde ocorre o Fórum Mundial de Migrações, em São Paulo (SP).
O objetivo é criar uma unidade na atuação dos movimentos em torno de quatro eixos: a crítica ao livre-comércio e às transnacionais, a defesa da democracia e a integração dos países latino-americanos.
Participaram do evento entidades como Via Campesina, Coordenação Latino Americana de Organizações do Campo (CLOC), Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, Marcha Mundial das Mulheres, entre outras.
Sindicatos
Atividades com as temáticas dos quatro eixos estão previstas para ocorrer nacional, subregional e localmente ao longo do ano, conta Rafael Freire, da Confederação Sindical das Américas, que reúne 56 centrais sindicais pelo continente.
Para fazer a síntese, a proposta é que haja, em novembro, um encontro em Havana, Cuba, e massivos atos de ruas nos diversos países. "Queremos que os sindicatos voltem a discutir política em suas bases para contrapor essa ofensiva da direita", disse.
Inspiração na luta contra a Alca
Os movimentos se espelham nas lutas contra a criação Alca (Área de Livre Comércio das Américas) em 2006. O acordo pretendia abrir as fronteiras dos demais países do continente aos produtos das multinacionais estadunidenses. Com a pressão dos movimentos populares, a proposta não foi aceita.
Rafael explica que a ideia de rearticulação de um movimento na América é uma tentativa de fazer frente às ofensivas do capitalismo. "A realidade de hoje na América Latina é de avanço de uma nova fase do neoliberalismo, seja através de chantagens nacionais para eleições, seja através de golpes como foi o caso de Honduras, Paraguai e Brasil", avaliou.
Alessandra Ceregatti, da Marcha Mundial das Mulheres, acredita que estes processos de quebra democrática na América Latina abrem espaço para rearticulação dos movimentos.
"Quando terminou a luta contra a Alca, achamos que o combate estava terminado. Mas não; alguns países romperam com o neoliberalismo, enquanto outros continuaram enfrentando esse processo", disse Alessandra.
Ao falar, a militante apontou para uma faixa pendurada no auditório da Faculdade, usada há dez anos. "Temos que retomar essa unidade", apostou.
Horizontalidade
Freire afirmou que os movimentos não pretendem criar uma estrutura, mas algo mais horizontal para aproximar as mais diversas organizações possíveis, além de ter diálogo efetivo com as mídias alternativas.
Para ele, nos dez anos passados desde a luta contra a Alca, tanto os governos latino-americanos se afastaram politicamente dos EUA com a criação da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) e do Brics (bloco econômico formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) quanto o governo estadunidense mudou sua forma de atuação na região.
Para ele, a inserção do comércio das empresas transnacionais, a inteferência política para controle da América Latina e a presença militar, com as bases existentes em Honduras, Colômbia e Argentina são os novos fatores na conjuntura do continente.
"A diferença que eu vejo para década passada é que, hoje, o neoliberalismo não necessita da democracia para se se implementar. Ao contrário: do ponto de vista da implementação do projeto, eles não conseguem vencer pelo referendo eleitoral. Só conseguem vencer se tiver algo que ataque essa democracia frágil que temos, como é o caso do Brasil e da Venezuela", explicou o sindicalista.
Por outro lado, ele reitera que os movimentos sociais, na sua visão, estão mais fortalecidos. "O desafio é saber se nós conseguimos unificar, porque o grau de potência é muito forte", disse.
Esperança
A chilena Francisca "Pancha" Rodriguez, Asociación Nacional de Mujeres Rurales e Indígenas (Anamuri), avalia que os países da América Latina passaram, nos últimos anos, por processos políticos "de muita esperança", mas que hoje a ofensiva é para aniquilar esses espaços conquistados pelos governos progressistas. "A estratégia tem sido nos desarticular e oferecer como alternativa de avanço sua ideologia consumista e individualista", afirmou.
Para ela, além de intervenções políticas concretas contra os governos progressistas do continente, o capitalismo foi fortalecendo ainda mais suas ações simbólicas. "Existe um trabalho dirigido para aniquilar a consicência do povo, acabar com a consciência de classe", disse.
No entanto, a indígena mapuche acredita que a Jornada representa a unificação de luta necessárias para contra-atacar estas ofensivas na batalha histórica por melhorias das condições de vida.
"Temos que voltar acreditar na luta e na capacidade que temos quando organizados. Hoje temos um ar diferentes nos movimentos, que é um levante da juventude. As batalhas nas ruas não acabaram", finalizou.
Edição: Camila Rodrigues da Silva
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