Nos idos dos anos de 1940, o geólogo brasileiro formando em Londres, Freimund Brockes, percorria garimpando a mesorregião norte do estado de Goiás quando descobriu uma jazida de níquel.
A partir daí, com estudos mais aprofundados, foi descoberto a segunda maior jazida de níquel do mundo, e o então povoado chamado de São José do Tocantins foi rebatizado de Niquelândia.
A cidade atraída pelo negócio minerador não parou de crescer e hoje é o maior município em expansão de Goiás, com uma população de aproximadamente 45 mil habitantes.
Para além do níquel, a geógrafa Marly O’ Farrill Martinez, que pesquisa a região, diz haver mais 120 tipos de minérios extraídos das entranhas de Niquelândia. Entre eles, o ouro, o cobre, o cobalto, a mica, o ferro, o manganês, o cristal, o amianto, o diamante, o quartzo, o calcário, o mármore, o urânio, e outros minerais radiativos.
Segundo o Departamento de Produção Mineral (DNPM) , o níquel é indispensável para produção de fundições, baterias, eletrodos, moedas, transporte bélicos e equipamento médico hospitalar.
Estima-se que as reversas de níquel em Goiás estão próximas a 300 milhões de toneladas, sendo que 74% das reservas mundiais deste minério estão no Brasil. Destas, 37% encontram-se no município de Niquelândia.
Todavia, a utilização de amônia na exploração desse mineral torna a atividade altamente contaminante para os trabalhadores de Niquelândia, e o grupo Votorantim estaria negligenciando uma proteção adequada aos seus funcionários ao se utilizar de tal método na extração do níquel.
A geógrafa Marly alerta que “com o método empregado pela mineradora, para a obtenção do níquel, está claro que os seus empregados estão expostos diariamente à contaminação. Não resta qualquer dúvida que os ex-empregados que entraram na justiça contra a empresa se expunham a amônia enquanto trabalhavam”.
“A amônia é volátil, não é possível controlar, logo a solução é não usá-la. Existem outros processos para a separação do níquel, mas é mais caro, por isso a Votorantim não quer empregá-lo”, explica.
Segundo Marly, o adoecimento das pessoas nem sempre ocorre por meio do contato direto com a amônia, mas se daria em toda a região a partir da sua dissolução com a água presente na atmosfera. “Por este motivo que, observando-se perfil de contaminados, percebe-se que independe da função que o operário trabalhou na indústria ele está contaminado. Logo, isto prova que todo o ambiente de trabalho está contaminado”, explica.
Os resultados dos laudos que Marly teve acesso, realizados com os trabalhadores doentes que prestavam serviços no grupo Votorantim, indicam que todos apresentavam os mesmos sintomas claros de contaminação toxicológicos, como insuficiência hepática, complicações gerais cardiovasculares, problemas ósseos, dores corporais, erupções cutâneas, disfunções oftalmológicas, perca do paladar e do olfato, impotência sexual e insuficiência respiratória.
Proibido falar “amônia”
A utilização da amônia no processo de exploração do níquel não ocorre à toa. Este método torna o procedimento mais barato. Além disso, outros cuidados com os trabalhadores também não são levados em consideração por tornarem a operação menos custosa.
“Teria que ter maior cuidado com equipamentos de proteção dos trabalhadores, roupas mais apropriadas, mais atenção no descarregamento da amônia, que não poderia ser descarregado a céu aberto, que é o que ocorre”, aponta a geógrafa.
De acordo com ela, a única maneira de acabar com a contaminação seria erradicar o atual processo químico.
“A amônia é volátil, não é possível controlar, logo a solução é não usá-la. Existem outros processos para a separação do níquel, mas é mais caro, por isso a Votorantim não quer empregá-lo”, explica.
O resultado da negligência da Votorantim no processo de exploração do níquel se expressa nos mais de 450 trabalhadores contaminados por amônia e em outros 50 que já teriam morrido, segundo as contas do Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias Extrativistas de Niquelândia (Sitien).
Como de se esperar, foram muitos os processos que os trabalhadores, assim como o sindicato, moveram contra a Votorantim. Em 2014, porém, a mineradora entrou na Justiça para processar o sindicato por difamação.
Com a causa ganha em favor da Votorantim, atualmente o sindicato não pode pronunciar amônia em seus protestos ou documentos, tampouco se pronunciar na imprensa sobre a mortalidade destes trabalhadores.
Jarbas Vieira, do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), acompanhou alguns destes casos. De acordo com Jarbas, em Niquelândia o silêncio precede totalmente o assunto. “Não se fala mais da amônia por aqui. Se quer se houve qualquer notícia dela na cidade, embora alguns empregados antigos ainda continuem morrendo”, expõe.
A Votorantim foi procurada pela reportagem, mas não retornou até o momento desta publicação.
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