O Bolsa Família foi responsável por tirar cerca de 36 milhões de pessoas da linha da pobreza desde 2003. Hoje o benefício chega a 13,9 milhões de famílias, atingindo quase um quarto da população brasileira. Além desses dados já conhecidos, um novo que chama a atenção mostra que mais de 90% das pessoas inscritas no Bolsa Família são mulheres. Dessa forma, as beneficiárias do programa podem ter mais controle sobre as contas da casa, mas essa autonomia pode ir além e não se limitar apenas às questões financeiras.
Pensando no Bolsa Família como um canal para a discussão sobre igualdade entre homens e mulheres, o Instituto Promundo, com o apoio da ONU Mulheres, criou o projeto “Promoção da equidade de gênero em programas de transferência de renda”. Durante três anos foram desenvolvidas campanhas educativas em comunidades rurais e urbanas do Rio de Janeiro e Recife.
“O Bolsa Família trouxe muitos avanços, inclusive sobre questões de gênero, mas a gente entende que o programa tem muitas mais oportunidades de transformação e temos que aproveitá-las. O Bolsa Família corre o risco de acabar, quando na verdade ele precisa ser fortalecido”, afirma Vanessa Fonseca, Coordenadora de Programas do Instituto Promundo.
Entre as atividades desenvolvidas pelo projeto está a capacitação de profissionais que trabalham diretamente com os beneficiários do Bolsa Família para que incluam a discussão de gênero no dia a dia. Até agora foram 400 profissionais do Rio de Janeiro, Nova Friburgo, Itararé (SP) e Recife (PE).
Também foram realizadas oficinas com homens e mulheres, inscritos no programa, sobre assuntos como divisão das atividades da casa, responsabilidade com os filhos e violência doméstica. Os resultados se mostraram bastante positivos. Se antes 35,5% dos homens afirmavam que cuidar da casa, das crianças e cozinhar para a família são as principais funções da mulher, ao final das atividades este número caiu para 22%.
No caso das mulheres, a percepção de seu papel nas relações familiares e no relacionamento com os homens também mudou. Segundo Zoraide Gomes, mais conhecida como Cris dos Prazeres, liderança comunitária do Morro dos Prazeres, em Santa Teresa, as mulheres que participaram das atividades adquiriram consciência sobre os seus direitos.
“Muitas mães solteiras saíram daqui querendo ajuda para entrar na justiça para solicitar pensão alimentícia para os filhos, entendendo que isso não é pedir, mas lutar por um direito. E não só com relação ao dinheiro, mas também para exigir participação dos pais na divisão de responsabilidades da criança”, explica.
MITOS SOBRE O PROGRAMA
Além disso, Cris acredita que os resultados do projeto podem ajudar a repensar mitos sobre o Bolsa Família, como aquele que diz que as famílias ficam acomodadas. Segundo ela, muitas das mulheres beneficiárias expressam o desejo de conseguir um emprego formal.
“Reunimos diferentes tipos de famílias, desde as mais pobres até as que recebem o benefício, mas também têm outras formas de renda. Após as oficinas, o grande impacto foi com as pessoas que já recebem o benefício há um tempo e conseguiram melhorar a situação financeira. Eles perceberam que podem abrir mão do Bolsa Família porque há outras pessoas com maior necessidade”, acrescenta.
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