Cerca de 28 senadores franceses divulgaram na última quarta-feira (13) um manifesto contra o impeachment da presidenta Dilma Rousseff no Brasil. Integrantes de diversas forças políticas na França, os parlamentares também cobram um posicionamento de François Hollande.
No manifesto, os senadores afirmam que o impeachment "foi uma tomada de poder sem legitimidade popular por parte daqueles que perderam as eleições presidenciais, com o objetivo de implantar o programa largamente rejeitado pelas urnas", e realizado por "parlamentares que procuram escapar de processos judiciais por corrupção".
O documento destaca ainda que o governo interino não representa a diversidade da sociedade brasileira, por ser composto exclusivamente de homens. Os senadores condenaram as primeiras ações de Temer, como a extinção do Ministério da Cultura e o fim de programas sociais como "Minha Casa, Minha Vida", e afirmaram que o "golpe de estado visa a destruição de todas as reformas sociais dos 13 anos de governo de esquerda, que permitiram que mais de 40 milhões de brasileiros saíssem da miséria".
No final do documento, os senadores reiteram que esperam que o Supremo Tribunal Federal (STF) condene o procedimento de afastamento de Dilma e denunciam que este é o terceiro golpe de estado institucional ocorrido nos últimos tempos na América Latina, contando com a destituição dos presidentes eleitos de Honduras e Paraguai. "Afirmamos nosso compromisso com o respeito pelo voto popular como a única forma de acesso à direção de um país. É grave para todo o sul do Continente que o maior país da América Latina mergulhe em um impasse político, econômico e social", diz o manifesto.
Leia abaixo a íntegra do manifesto:
Dilma Rousseff, vítima de uma vil manobra parlamentar
No Brasil, as máscaras caem. De conhecidas escutas telefônicas partem as manobras que desvendam o processo de destituição da Presidenta brasileira Dilma Rousseff. Descobre-se que certos parlamentares procuraram escapar de processos judiciais por corrupção, obtendo a destituição de Dilma Rousseff, reeleita em 2014 com 54 milhões de votos (51.64%). Nós estamos assistindo à tomada do poder sem legitimidade popular por parte daqueles que perderam as eleições presidenciais, com o objetivo de implantar o programa largamente rejeitado pelas urnas. Eles formaram um governo composto exclusivamente por homens, sem nenhuma representação da diversidade que caracteriza a sociedade brasileira.
As primeiras decisões desse executivo interino, dirigido por Michel Temer, são claras: supressão dos ministérios da cultura, da igualdade homem-mulher, da diversidade e de um organismo independente de controle do aparelho de estado (Controladoria Geral da União). Em seguida, são anunciados o fim de programas sociais “Minha Casa, Minha Vida” - programa de acesso à propriedade pelos mais pobres - e o “Mais Médicos”, programa que viabiliza a instalação de médicos estrangeiros em áreas desfavorecidas, e a instauração de um plano econômico de austeridade. Trata-se de um golpe de Estado institucional que visa destruir todas as reformas sociais que permitiram, durante treze anos de governos de esquerda, que mais de 40 milhões de brasileiros saíssem da miséria. Os homens deste governo interino querem andar rápido e não se preocupam com a instabilidade política, econômica e social na qual o Brasil pode mergulhar.
Governo indesejável
Nós, parlamentares franceses eleitos, afirmamos que o processo constitucional de destituição foi instrumentalizado por uma maioria parlamentar circunstancial. Tal procedimento, que não pode ser aplicado senão para crimes ou delitos graves, foi instaurado em função de simples decretos orçamentários de 2015, utilizados pelo governo de Dilma Rousseff. Ela modificou tais decretos, na metade de dezembro de 2015, ainda dentro do ano fiscal e antes mesmo do exame e da validação do orçamento pelo Tribunal de Contas e pelas duas Casas do Congresso.
Nós sublinhamos que a presidenta afastada não está envolvida em nenhum dos inumeráveis casos de corrupção que afeta a classe política, notadamente o escândalo da Petrobras. Entretanto, esse não é o caso de sete ministros do Governo Temer. Dentre eles, Romero Jucá, ministro do Planejamento, que aparece enredado no caso das escutas, revelando a realidade da destituição, estando já demissionário. Também é o caso de Fabiano Silveira, Ministro da Transparência, igualmente envolvido no caso das escutas telefônicas. O próprio presidente interino foi declarado inelegível pela justiça de São Paulo por fraudes em suas contas de campanha. Outra marca distintiva e significativa deste governo indesejável: o Ministro da Justiça (equivalente ao Ministério do Interior Francês) Alexandre de Morais foi advogado do grupo criminoso mafioso PCC (“Primeiro Comando Capital” ou “Primeiro Comando da Capital de São Paulo”).
Nós nos inquietamos igualmente com o envolvimento no golpe de Estado das grandes empresas de comunicação que pertencem a importantes grupos financeiros, que desencadearam uma campanha extremamente violenta em favor da destituição e da criminalização da esquerda brasileira. Essas mesmas empresas apoiaram o golpe de Estado de 1964, a partir do qual construíram verdadeiros impérios midiáticos.
Nós estamos chocados com as explicações dos votos dos parlamentares a favor da destituição da presidenta, que invocavam Deus e suas famílias, enquanto um deles fazia apologia do Coronel Brilhante Ustra, torturador já falecido de Dilma Rousseff.
Aos milhares, os brasileiros se mobilizam através do país para a defesa da democracia, exigindo a saída desse governo ilegítimo e o retorno da presidenta democraticamente eleita.
Nós os apoiamos.
Nós, parlamentares, esperamos que o Supremo Tribunal Federal, que ainda não se pronunciou sobre o mérito do processo, condene esse procedimento de destituição.
Nós, parlamentares franceses, solicitamos ao governo François Hollande que se pronuncie e condene o golpe contra a democracia.
Nós, parlamentares, denunciamos que, nessa região do mundo, e após a destituição dos presidentes eleitos de Honduras e do Paraguai, este é o terceiro golpe de Estado institucional a ocorrer e afirmamos nosso compromisso com o respeito pelo voto popular como única forma de acesso à direção de um país.
Nós demandamos à comunidade internacional que condene o golpe de Estado. É grave para todo o sul do Continente que o maior país da América Latina mergulhe em um impasse político, econômico e social.
Patrick Abate, Senador de Moselle (CRC)
Aline Archimbaud, Senadora de Seine-Saint-Denis (Les Verts)
Eliane Assassi, Senadora de Seine-Saint-Denis (Presidente do CRC)
Marie-France Beaufils, Senadora de Indre-et-Loire (CRC)
Esther Benbassa, Senadora de Val-de-Marne (EELV)
Michel Billout, Senador de Seine-et-Marne (CRC)
Marie Blandin, Senadora do Nord (groupe écologiste)
Eric Bocquet, Senador do Nord (CRC)
Jean-Pierre Bosino, Senador de L´Oise (CRC)
Corinne Bouchoux, Senadora de Maine-et-Loire (groupe écologiste)
Laurance Cohen, Senadora de Val-de-Marne (CRC)
Cécile Cukierman, Senadora de la Loire (CRC)
Ronan Dantec, Senador de Loire-Atlantique (EELV)
Annie David, Senadora de L´Insère (CRC)
Karima Dell, Deputada Europeia (EELV)
Michelle Demessine, Senadora do Nord (CRC)
Evelyne Didier, Senadora de Meurthe-et-Moselle (CRC)
Christian Favier, Senador do Val-de-Marne (CRC)
Thierry Foucaud, Senador de Seine-Maritime (CRC)
Brigitte Gonthier-Maurin, Senadora de Hauts-de-Seine (CRC)
Pierre Laurent, Secretário Nacional do PCF e Senador de Paris (CRC)
Michel Le Scouarnec, Senador de Morbihan (CRC)
Noël Mamère, Deputado de Gironde (groupe écologiste)
Christine Prunaud, Senadora de Côtes-d´Armor (CRC)
Jean-Louis Roumégas, Deputado de L´Hérault (groupe écologiste)
Bernard Vera, Senador de L´Essone (CRC)
Paul Vergès, Senador de Réunion (CRC)
Dominique Watrin, Senador de Pas-de-Calais (CRC)
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