A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 241/16, de autoria do governo interino de Michel Temer, vem provocando fortes reações de parlamentares da oposição no Congresso Nacional.
Tramitando atualmente na Câmara, a PEC propõe a fixação de limites para o crescimento dos gastos públicos, restringindo as despesas sempre à despesa do exercício anterior, com correção pela inflação também do ano pregresso. A medida teria uma vigência de 20 anos, vigorando de 2017 a 2036.
“Nos últimos sete anos, o governo brasileiro gastou muito mais do que foi arrecadado, e esse descontrole resultou num buraco fiscal. Precisamos enfrentar esse problema, senão a União pode chegar à insolvência, como chegaram os estados do Rio de Janeiro e do Rio Grande do Sul. Não vai haver aumento de ganho real ao longo dos anos porque nós estamos numa penúria fiscal. Um chefe de família, por exemplo, quando perde o emprego ou quando se perde nas contas, precisa fazer isso pra pagar as despesas”, argumenta o deputado federal Darcísio Perondi (PMDB-RS), relator da PEC 241 na comissão especial que analisa o caso.
A proposta acendeu uma polêmica na Casa porque, para parlamentares oposicionistas, a medida deve implicar redução crescente dos investimentos nas áreas sociais, que incluem saúde, educação, assistência social e previdência.
Para o deputado Patrus Ananias (PT-MG), programas como o Benefício de Prestação Continuada (BPC), que garante o salário mínimo para idosos com mais de 65 anos e pessoas com deficiência sem condições de trabalhar, e o Bolsa Família tendem a ter os investimentos reduzidos.
“Essa PEC tem um direcionamento muito claro: ela vai contra os pobres. Durante muito tempo nos fizeram acreditar equivocadamente que é preciso crescer para distribuir as riquezas, mas o outro lado da moeda também é fundamental: é preciso primeiro incluir para crescer. Só há crescimento econômico sustentável com inclusão, com mercado interno, com cidadãos tendo dignidade. Todas as vezes em que a ordem democrática foi rompida no Brasil os primeiros que pagaram foram os pobres, as classes trabalhadoras, os assalariados”, critica o deputado, que é membro titular da comissão especial da PEC.
Projeções
Patrus Ananias (PT-MG) cita projeções feitas por economistas que calcularam as possíveis consequências da aprovação da PEC nas áreas sociais. Em um estudo do Ministério da Fazenda, pesquisadores simularam quanto teriam sido os gastos federais de 2003 a 2015, caso a PEC tivesse entrado em vigor naquele ano.
No comparativo entre os gastos reais feitos durante os governos Lula/Dilma e a análise hipotética, o estudo chegou à conclusão de que a PEC teria retirado ao todo R$ 3,2 trilhões de recursos federais aplicados na política social.
O gasto total teria sido 36,9% menor no período estudado, em que as áreas de assistência, educação e cultura, saúde e Previdência Social responderam juntas por 91,4% dos gastos. Respectivamente, a redução teria apresentado os seguintes índices: -79%; -62%; -45%; 49%.
“A PEC 241 é muito simbólica pelo alcance que tem e pelo que revela, pois é um total descompromisso com o futuro do Brasil, deixando claro que temos hoje um governo que não está a serviço dos interesses nacionais, que não se importa com a soberania nacional e com o povo brasileiro. Nós precisamos ter compromisso com as gerações futuras, e essa PEC é justamente o país traindo o seu futuro”, disse Ananias, afirmando que a proposta é um dos principais alvos da bancada do PT no momento.
Estado mínimo
Durante reunião da comissão especial nesta segunda-feira (22), a deputada Erika Kokay (PT-DF) disse que considera a PEC 241 como “nociva” e que a aprovação da medida seria um “retrocesso” para o país.
“Ela representa, na verdade, o pagamento de contas para implementar um programa que foi derrotado quatro vezes nas urnas. Nós estamos vivenciando a mesma lógica do que representou para o país o governo Fernando Henrique Cardoso, mas com um componente diferenciado: o governo FHC chegou pelas urnas. Este governo golpista atual trabalha numa lógica totalmente diferente da de Juscelino Kubisctech, por exemplo, que hoje completa 40 anos de morte. JK tinha um programa de desenvolvimento nacional, trabalhava com a perspectiva de um Estado que pudesse agigantar o Brasil, e não que fosse rastejante e subserviente aos banqueiros. Esse Estado que eles querem construir com essa PEC e com todo o programa do impeachment é um Estado mínimo para o povo brasileiro, para os servidores públicos, mas é extremamente farto e generoso para as elites”, considera Kokay, que é membro titular do colegiado.
Trabalhadores da área de educação também compareceram à reunião do colegiado para manifestar oposição ao projeto governista. O coordenador-geral do Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica (Sinasefe), Williamis da Silva Vieira, qualificou a proposta como “um ataque à educação”.
“Nós entendemos que é uma maneira de o governo jogar todo o peso da crise nas costas dos trabalhadores. (…) Não temos dúvida de que, se essa PEC for aprovada, vai trazer um grande arrocho, e isso é preocupante porque o orçamento da educação já está encolhendo”, completou.
Para Giane Carvalho, também dirigente do sindicato, a proposta faria a área de educação dar um passo atrás.
“Nós queremos é que se ampliem todas as frentes da educação para proporcionar um serviço público de qualidade, uma boa formação para os estudantes, e não o contrário. A PEC 241 vai trazer um sucateamento da educação, fortalecendo a ideia de Estado mínimo”, opinou a dirigente.
A PEC
De autoria do Executivo Federal, a PEC 241/16 se destina a todos os poderes da União e órgãos federais com autonomia administrativa e financeira. Portanto, alcança o Ministério Público, a Defensoria Pública da União, o Judiciário e o Tribunal de Contas da União.
O teto é atribuído às despesas primárias, como os gastos com pessoal. Ele deixaria de fora as despesas com juros e amortizações da dívida pública. Para as áreas de saúde e educação, que hoje recebem uma parcela fixa da receita da União, o novo regime fiscal garantiria apenas a correção pela inflação.
De acordo com a proposta, caso o teto estipulado seja descumprido, o órgão ou poder é penalizado, devendo congelar no ano seguinte os gastos com servidores, ficando proibidos reajustes salariais, contratações e concursos públicos, bem como gastos com subsídios e incentivos fiscais.
Pela PEC, algumas despesas não ficam submetidas ao teto anual, como as transferências constitucionais à União, aos estados e aos municípios; a participação federal no Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb); e despesas relacionadas ao aumento de capital de empresas estatais.
O texto da PEC propõe ainda que o método de indexação dos gastos pode ser alterado pelo governo a partir do décimo ano de vigência do novo regime fiscal.
Tramitação
A PEC 241/16 teve a admissibilidade aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara Federal no último dia 9. Pelas regras constitucionais referentes à tramitação de PECs, esse exame trata apenas da constitucionalidade, da legalidade e da técnica legislativa, pois não trata do mérito.
Atualmente, ela está em discussão numa comissão especial destinada a debater e votar a proposta. O relator, Darcísio Perondi (PMDB-RS), informou que pretende apresentar o parecer já na primeira semana de setembro.
Nesta segunda-feira (22), o colegiado elegeu os deputados Sílvio Torres (PSDB-SP), Altineu Côrtes (PMDB-RJ) e Victor Mendes (PSD-MA) como 1º, 2º e 3º vice-presidentes, respectivamente. Além disso, o grupo aprovou requerimentos para convidar especialistas, ministros e outras figuras públicas para debater o tema.
Na próxima quarta-feira (24), deve ser ouvido o atual ministro da Fazenda, Henrique Meirelles.
Edição: Camila Rodrigues da Silva
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