Manifestantes contrários ao impeachment de Dilma Rousseff (PT) realizaram um protesto em frente à redação do jornal Folha de S. Paulo na noite da terça-feira (30). O ato exemplifica a percepção dos críticos ao processo contra a presidenta de que a grande mídia foi um dos principais elementos nesse processo. Parte da imprensa internacional corroborou essa análise.
O jornalista estadunidense Glenn Greenwald, do site The Intercept, apontou como a própria Folha utilizou de maneira distorcida seu instituto de pesquisas para fraudar a opinião da população brasileira em relação à então gestão interina de Michel Temer (PMDB).
O jornal paulista tem um histórico contraditório com a democracia: apoiador do regime instaurado em 1964 na maior parte do tempo, em 2009 escreveu editorial qualificando os governos militares como “Ditabranda”.
“A mídia é um ator político desse processo. Desde 2013 e 2014, a Rede Globo tem cumprido um papel de mobilizar as pessoas. Isso foi ficando cada vez mais claro. Existe um processo de hegemonia e um discurso único que faz com que as pessoas não entendam muito bem o que está ocorrendo”, afirmou Ana Mielke, integrante do Intervozes, em debate realizado pelo Brasil de Fato também na terça-feira (30).
Como aponta Mielke, o meio mais identificado com os ataques contra a democracia, por outro lado, é a Rede Globo. A principal cadeia televisiva do país foi alvo de uma reportagem da Al Jazeera que estabelece analogias entre a atuação da empresa de comunicação no Golpe Militar e o atual processo.
Em diversos momentos chave da conjuntura recente, a Globo, ainda que de forma não declarada, atuou diretamente na construção da narrativa que culminou na queda de Dilma, nesta quarta (31).
Relembre alguns casos nos quais sua cobertura foi desproporcional:
1) Manifestações
Nos primeiros protestos de rua promovidos por grupos de direita favoráveis ao impeachment, a Rede Globo fez inserções durante sua programação habitual divulgando as datas e locais das manifestações.
O mesmo tempo e esforço não foram dedicados às manifestações contrárias, realizadas em épocas próximas.
2) Casas de praia
O caso do tríplex no Guarujá, no qual se tentou envolver a figura do ex-presidente Lula - que, segundo o relatório da Polícia Federal, jamais foi proprietário do imóvel – ganhou grande destaque no noticiário global.
A revelação de uma mansão ligada à família Marinho, proprietária da Globo, construída de forma irregular em Paraty, por motivos óbvios, jamais foi mencionada.
3) Condução coercitiva
No dia em que o ex-presidente Lula foi conduzido coercitivamente, apesar de jamais ter se negado a cooperar com a Justiça, o fato foi reportado pelo Jornal Nacional em matéria de grande duração.
Proporcionalmente, entretanto, o espaço concedido aos defensores do petistas foi muito menor ao dedicado aos acusadores.
4) Áudios vazados
A desproporcionalidade também se manifestou no tratamento dado a dois casos de vazamento de áudios. A conversa entre Lula e Dilma - vazada, segundo o STF, de forma ilegal – foi divulgada no Jornal Nacional em sua quase integralidade.
Os áudios de Sérgio Machado, gravações de conversas deste com políticos ligados à gestão Temer, entretanto, não ganharam o mesmo destaque no programa.
5) Processo
Toda a votação do impeachment ocorrida na Câmara, responsável pelo afastamento provisório de Dilma, foi transmitido pela Globo. A veiculação dos discursos dos deputados – em sua maioria fundamentados em “Deus” ou na “família” - geraram um efeito negativo.
Por outro lado, no momento em que Dilma fez sua fala de defesa no Senado, momento de extrema importância para seu julgamento, o canal transmitia uma receita culinária.
Edição: Camila Rodrigues da Silva
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