Há entre o jornalismo e a democracia uma relação simbiótica guiada pelo libercentrismo [neologismo utilizado pela autora para dar a ideia de liberdade no centro de tudo].
As lutas pelas liberdades individuais e contra a ditadura permitiram à imprensa um ganho em representatividade: nos espaços públicos onde se discutia política abertamente as notícias estampadas nas manchetes eram o tema. A imprensa virou uma espécie de “progenitora da liberdade”. Daí o surgimento do jornalismo como exercício da democracia.
Mas de portadores de notícias os jornais tornaram-se nem tão vagarosamente difusores de opinião.
Nós, leitores condicionados, apegamo-nos a um estereótipo deturpando-nos com a ideia irrefutável de que estamos seguindo uma opinião pública.
E onde estaria então a liberdade de pensamento?
No afã de um ter uma ideologia, como preconizava Cazuza (eu quero uma pra viver!), apropriamo-nos de discursos, políticas, partidos e até lutas. Quase sempre sem entender a raiz disso tudo.
O impeachment de Collor, em 92, é uma prova disso. Parte da juventude sem exatamente entender o processo político que tramitava no governo partiu para as ruas em busca da derrocada presidencial. Para a nossa sorte os cara-pintadas estavam no caminho certo.
O filósofo e político romano, Cícero, entendia que desconhecer a história é como permanecer criança para sempre. E acreditando ingenuamente que estamos fazendo história, nós, crianças, fomos aceitando o que a grande mídia estampou e televisionou como pano de fundo para as conversas de botequim.
De um grito por melhorias na política brasileira e em meio a um discurso progressista sobre rompimento de velhos padrões, a disseminação do ódio à mulher: uma, em especial. A primeira presidente do Brasil é também vítima a nível internacional do sexismo. E os propagadores desta misoginia são também seus próprios eleitores.
Uma tirinha nos libertava ao anunciar que “é perigoso não ler, pois nos obrigam a acreditar no que nos dizem". Mas a grande mídia hegemônica já nos transmitiu essa cegueira social que toma conta do Brasil. Aprendemos a ler do jeito torpe, acreditando em tudo que nossos olhos vêem, sem questionamentos.
Parte também de nós que piamente acreditamos na imprensa: definitivamente o quarto poder. Mas como lutar contra meios de comunicação unidos pela articulação do golpe militar? Estaríamos reeditando 64?
Em nome da crise clamamos pelo fim de um governo que foi eleito e reeleito democraticamente. Um golpe midiático-político. Enquanto batem panelas vazias do alto de seus apartamentos de luxo esquecem-se da prioridade de um governo em erradicar a fome e ascender socialmente 40 milhões.
O egoísmo é disseminado pelo país com o pretexto de se estar lutando por todos, de que o pensamento da esquerda é nocivo e com apenas uma verdade: há um desrespeito pairando na história do Brasil.
Desconhecer essa história é inserir-se no entendimento de Cícero e permanecer criança para sempre.
*Silvia Valim é jornalista, professora universitária, mestre em comunicação e diretora do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Paraná.
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