A agenda do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, hoje (26), provocou indagações e especulações: qual o motivo da reunião com representantes do Fundo Monetário Internacional (FMI), às 10h30. Desde que Michel Temer assumiu a presidência da República interinamente, em maio, veículos e fontes ligados ao mercado têm insistido na ideia de que o país, com o peemedebista, pode voltar a recorrer à instituição multilateral.
Mas por que o Brasil recorreria hoje ao fundo, se tem US 370 bilhões de reservas? “Não há motivo nenhum”, diz o economista Guilherme Mello, da Unicamp. O FMI foi criado para ajudar países com problemas de déficits que não podem ser cobertos pelas reservas ou pela entrada de investimento estrangeiro, em situações de moeda fraca e falta de dólar, por exemplo. Em 2005, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva quitou o que restava da dívida com o fundo.
“No final da década de 1970, de meados a final dos 1990 e no começo dos anos 2000, o país não tinha dólar para pagar a dívida. Hoje nos sobra dólar, temos mais ativos em dólar do que passivos. Não faz o menor sentido recorrer ao FMI”, afirma o analista. Mas, obviamente, o encontro de Meirelles com representantes do fundo não se dá por acaso.
“Provavelmente é uma reunião política. O governo quer conseguir apoio às medidas que pretende adotar, como a PEC 241, por exemplo, a reforma da Previdência e outras. Com isso, o governo poderia dizer, inclusive no Congresso, que tem até apoio internacional a essas medidas.” Afinal, uma semana depois de Temer assumir interinamente, o porta-voz da instituição, Gerry Rice, já declarava que as intenções do governo de conter o crescimento da dívida pública eram “positivas”. “Esperamos que as reformas econômicas muito necessárias possam ser aplicadas com prontidão para ajudar o Brasil a superar o atual contexto difícil", disse .
Há cerca de dois meses, em entrevista à revista Forbes, a ex-economista do FMI Alicia Garcia-Herrero afirmou que o órgão pode ser importante ao Brasil, sob Temer, na época interino. O governo poderia usar como desculpa para um eventual aumento de impostos que este seria uma “recomendação” do FMI.
Mas essa também seria uma questão política. “Seria algo nunca visto no mundo, um país voluntariamente, e sem necessidade, ir ao credor pedir para impor condições restritivas. É muito masoquismo. Mas na realidade brasileira de hoje, tudo é possível”, diz Guilherme Mello. “Se o Brasil acha que precisa do aval de uma instituição internacional para fazer uma política recessiva, talvez isso explique essa reunião.”
Seja como for, uma reunião pode ser apenas um encontro de praxe, já que o Brasil é acionista do FMI, com o qual pode discutir cenário e conjuntura, por exemplo. “Mas com certeza é uma reunião de cunho político. O governo quer o apoio do FMI para as medidas”, conclui o economista da Unicamp.
Seja como for, no mundo da política e da economia não existem coincidências. Certamente, não foi por acaso que, na quarta-feira da semana passada, em Nova York, Henrique Meirelles disse na entrevista coletiva concedida, num hotel em que hospedou a comitiva brasileira, que a aprovação da PEC 241, que congela os investimentos em saúde e educação por 20 anos, provocará a redução da taxa de juros estrutural da economia brasileira.
“Tenho dito insistentemente que no momento em que a PEC seja aprovada e que as despesas públicas sejam limitadas ao crescimento real zero, baseado na inflação do ano anterior, isso deve diminuir o juro estrutural da economia”, disse Meirelles, logo após ele participar de reunião com empresários e investidores promovida pelo Conselho das Américas.
No mesmo dia, em discurso para investidores em Nova York, em evento promovido pela Câmara Americana de Comércio no Brasil (Amcham Brasil), Temer disse esperar que a iniciativa privada norte-americana participe “do desenvolvimento do país”. Pouco antes de embarcar para o Brasil, o presidente se reuniu com o vice-presidente dos Estados Unidos, Joe Biden.
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