A Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) lançou nesta quarta-feira (28) uma carta aberta em defesa do Sistema Único de Saúde (SUS). No documento, é reafirmada a necessidade do caráter público e universal do SUS, como uma política social prevista na Constituição. O texto cita como ameaças ao SUS a PEC 241/2016, que propõe o congelamento dos gastos públicos por 20 anos e a sugestão do ministro da Saúde, Ricardo Barros, de criação de planos de saúde populares para “aliviar” o SUS.
O tema foi debatido durante todo o dia na Uerj, no evento Ato em Defesa do SUS, com a presença de representantes de diversos setores da universidade, como o Hospital Universitário Pedro Ernesto e o Instituto de Medicina Social, além de pesquisadores convidados, profissionais da área de saúde e outras instituições ligadas ao setor.
Integrante do comitê de organização do evento e do Instituto de Nutrição da Uerj, Luciana Castro diz que o encontro dá continuidade às discussões iniciadas em junho. “Nós estamos vivendo um período de muitas mudanças, e mudanças muito ruins, de muitas ameaças ao SUS nos últimos tempos. Na própria UERJ a gente já teve problemas graves com o Hospital Universitário Pedro Ernesto [no início de maio o hospital ameaçou fechar as portas por falta de condições de funcionamento e atraso nos repasses de verbas do estado] e isso se espalha pelo sistema de saúde pública do Brasil. Então, por conta disso a gente achou por bem fomentar alguns debates que pudessem trazer para a gente algumas perspectivas e alguma pauta de luta”.
Entre as propostas apresentadas para melhorar o SUS, Luciana cita novas formas de gestão e divulgação do sistema. “A gente precisa inventar novas formas de gestão, tanto do sistema como um todo quanto dos recursos humanos. A gente precisa falar sobre ele para a população, fazer uma mídia que seja uma mídia responsável e apresentar para a população o que é que nós temos, o que o SUS tem de bom, de quem ele cuida e como ele cuida, né? Acho que essa é uma questão importante. Acho que é preciso dinheiro, precisa ser muito bem financiado, esse dinheiro precisa chegar aos municípios, não dá para conviver somente com esse recurso que tem sido repassado”.
Sobre os planos de saúde populares, ela diz que é uma “afronta”. "Os planos de saúde já estão precarizados, então é você dar uma esperança para quem está comprando esse plano de saúde que ele vai ser atendido. Ele não vai ser atendido e quando ele precisar de alguma questão de fundo mais grave, ele vai recorrer ao SUS também”.
Objetivos do Desenvolvimento do Milênio
A pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz) e diretora do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes) Isabela Soares Santos, explicou que universalizar o acesso à saúde é um dos Objetivos do Desenvolvimento do Milênio, estabelecidos pela Organização das Nações Unidas. Ela citou que, nos Estados Unidos, cerca de 10% da população não tem nenhuma cobertura de saúde, pois não se enquadram em nenhum dos programas públicos nem tem condições de pagar por um seguro privado. Para Isabela, o acesso universal que existe no Brasil deve ser defendido como um dogma.
“Porque o Brasil precisa de um programa público forte e de qualidade? É um dogma. O principal motivo é humanitário, de solidariedade. Além disso, setor privado em nenhum lugar do mundo é um sistema, são empresas independentes e concorrentes”, diz.
Isabela acrescenta que em um sistema público, as unidades de saúde são integradas e leva-se em conta as especificidades locais. “Não precisa ter um monte de hospital bom em todos os lugares, pode ter em centros de referência. Os problemas de saúde também não se resolvem na assistência especializada, o grosso está na assistência básica, presente no sistema. No privado, cada um tem que saber qual é o seu problema de saúde, mas cada pessoa não tem condições de cuidar de si, é preciso ter políticas macro para isso”.
Aluno do quinto período do curso de medicina da Uerj, André Abreu, compareceu ao debate e defende o sistema público. “Hoje a gente vive um momento muito representativo na política brasileira e um risco de retrocesso muito grande para o Sistema Único de Saúde. A PEC 241 tramitando no Congresso representa o verdadeiro retrocessos a tudo que foi conquistado com o movimentos de reforma sanitária no Brasil, da universalidade, da integralidade do sistema de saúde que ainda não se completou. A gente sabe que tem muitos avanços para serem feitos, mas retroceder jamais e é essa a ameaça que está posta”.
Abreu diz que pretende trabalhar exclusivamente dentro do SUS depois de formado e aposta no diálogo com a sociedade para evitar retrocessos na saúde pública do país. “O verdadeiro fortalecimento vem com o trabalho de base, de conversar com a sociedade e mostrar o que a gente tem, o que a gente pode melhorar. A conscientização da população e, sobretudo, a aglutinação em prol de uma determinada pauta, mostrando os avanços que a gente tinha num comparativo com o que foi o antecessor ao SUS, é a forma que a gente consegue lutar contra esses retrocessos. Só trazendo essa perspectiva para a população como um todo é que a gente consegue avançar”.
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