O plenário da Câmara Federal aprovou na noite desta quarta-feira (5) o Projeto de Lei (PL) 4567/16, que desobriga a Petrobras de ser a única operadora dos blocos de exploração do pré-sal. Depois de várias semanas de queda de braço entre governo e oposição, a maioria da Casa aprovou a proposta por 292 votos a favor e 101 contra.
Para que a matéria fosse aprovada, o regimento exigia apenas maioria simples dos deputados presentes em plenário. O resultado mostrou que, ainda que membros da oposição tivessem se ausentado da votação, o governo teria conseguido aprovar o PL.
Na avaliação dos parlamentares de oposição, o placar reflete a configuração de forças que tem se delineado no Congresso, com a aglutinação de expoentes neoliberais em torno dos projetos governistas.
“O Temer fez dois movimentos: primeiro, o de acenar tudo aquilo que o mercado queria implementar em termos de agenda; e, segundo, um movimento mais voltado pra política parlamentar, no sentido de distribuir todos os cargos da República e todos os ministérios para garantir essa maioria que eles têm hoje no Congresso Nacional. Além disso, essa maioria já é um grupo sensível à agenda liberal do mercado, aí você tem o casamento das duas coisas, o que dá a eles a folga pra aprovar esse tipo de medida”, analisou o deputado Glauber Braga (PSOL-RJ).
A oposição ao PL reúne também deputados da Rede, do PCdoB, do PT, do PDT e alguns parlamentares de outras legendas, de forma mais isolada.
Após a votação, as entidades dos petroleiros lamentaram a aprovação da matéria. “É o pagamento do golpe, que foi articulado em comum acordo com os interesses dos setores empresariais e de mídia, que nunca admitiram que a exploração do pré-sal fosse uma prerrogativa do Estado brasileiro”, disse em nota a Federação Única dos Petroleiros (FUP), que reúne 13 sindicatos da categoria.
Ao longo dos últimos meses, os petroleiros vinham fazendo intenso combate ao PL no parlamento. Nesta quarta-feira (6), após intensas negociações com a presidência da Câmara, eles conseguiram acessar a galeria do plenário para acompanhar de perto a apreciação da matéria. Durante a votação, os trabalhadores fizeram protesto e entoaram palavras de ordem contra os parlamentares que votaram pela aprovação da matéria.
Articulações
Os debates em torno do PL 4567 seguiram em clima de muita tensão ao longo de todo o dia nos bastidores da Câmara. A sessão estava inicialmente prevista para as 9 horas, depois de vários adiamentos, mas foi suspensa logo no início e retornou no começo da tarde.
Enquanto a bancada governista se articulava para dar celeridade à votação do PL, que figura na cartilha de prioridades de Michel Temer, expoentes da oposição tentavam protelar a consulta em plenário, contando com o apoio de diversos segmentos da esquerda que estiveram hoje dentro da Câmara e também no entorno do Congresso para protestar contra o projeto.
No final da tarde e ao longo da noite, a oposição promoveu questões de ordem e requerimentos, na tentativa de evitar a aprovação. “Esta disputa aqui se trata de defender o patrimônio público e ser contra o entreguismo de Serra”, disse o líder do PSOL, Ivan Valente (SP), em referência ao tucano José Serra, atual ministro das Relações Exteriores, que é o autor da proposta no Senado.
Os governistas sustentaram que a abertura do pré-sal para as empresas estrangeiras seria uma estratégia para melhorar os lucros da empresa, que estaria imersa em dívidas. Os argumento foram fortemente combatidos pela oposição.
“Abrir o pré-sal num momento em que o barril de petróleo está custando cerca de U$ 50 é abrir mão de uma empresa que significa muita coisa para o país (…) É uma política de favorecimento de empresas não brasileiras em detrimento da riqueza do povo brasileiro”, disse a líder da minoria, Jandira Feghali (PCdoB-RJ).
A deputada Erika Kokay (PT-DF) também se manifestou diversas vezes em plenário, criticando a bancada do governo. “Eles querem entregar o pré-sal pra pagar a conta com a Fiesp e com todos os entreguistas que financiaram este golpe que vivemos hoje”, bradou a petista.
Governo
Para os aliados do presidente não eleito Michel Temer, a diferença poderia ter sido ainda mais expressiva. “O placar foi bom, mostrou que temos uma base unida, mas sabemos que podemos conseguir ainda mais. É que hoje muitos parlamentares avisaram que não poderiam votar porque estão envolvidos no segundo turno das eleições municipais nos seus estados”, disse o líder do governo na Casa, André Moura (PSC-SE).
Após a votação, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), também ressaltou o peso da maioria governista na Casa. “Governo é placar; oposição é plateia. Hoje o que ocorreu foi que o governo ganhou no placar, e a oposição ficou com a crítica.”, declarou o democrata, que vinha apontando o PL 4567 como uma das prioridades da gestão.
Ao final da sessão, Moura disse ao Brasil de Fato que não acredita em possíveis alterações no projeto quando o plenário votar os destaques do PL, na próxima semana.
Resistência
Para a oposição, a luta contra a proposta precisa contar com grande engajamento social. “Nós vamos continuar a batalha até o fim, mas sabemos que internamente, do ponto de vista institucional, eles têm maioria. O que pode modificar esse jogo é o que vem das ruas, pra que os parlamentares sintam o que parte do seu eleitorado quando se aprova uma medida tão lesiva ao Brasil como essa”, salientou Glauber Braga (PSOL-RJ).
Opinião semelhante tem Paulo Pimenta (PT-RS), que destacou a necessidade de fortalecimento do discurso contrário à matéria. “Apesar dessa maioria deles, a votação mostrou também que nós temos uma bancada disposta a resistir a essa pauta, mas o nosso desafio é cada vez mais traduzir pra população como essas propostas interferem nas suas vidas”, pontuou o petista.
Ao longo de todo o dia, ele e outros expoentes dos partidos de oposição atuaram como interlocutores dos movimentos populares junto à Câmara em relação ao PL. “Nós dissemos a eles que esta aqui foi só a primeira batalha. Muitas virão pela frente, porque são as faturas do golpe. Mas os trabalhadores estão de parabéns e o que tem que ficar é justamente a marca dessa resistência”, disse, em referência ao ato realizado pelos petroleiros na galeria do plenário durante a votação da matéria.
“É uma imagem que vai ficar para a história”, finalizou Pimenta, comparando as articulações dos petroleiros ao movimento de defesa da Companhia Vale do Rio Doce, privatizada em 1997.
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