Teve início, na terça (8), o Ciclo de Debates Brasil de Fato MG, com o tema “Sistema Político, Democracia e Comunicação”. O encontro, que ocorreu na sede do Sindicato dos Bancários, em BH, contou com o advogado do setor de Direitos Humanos do MST e militante da Consulta Popular Aton Fon Filho – ex-integrante da Ação Libertadora Nacional (ALN) –, e o constitucionalista e professor da UFMG e da PUC-MG José Luiz Quadros Magalhães. Em debate, os limites do atual sistema político.
Aton Fon traçou um paralelo entre os diferentes episódios de golpe de Estado no Brasil. Ele afirma que, a rigor, todo golpe instaura uma ditadura a serviço dos interesses da classe dominante. Mas importa, por outro lado, identificar aquelas camadas da burocracia do Estado responsáveis por levar a cabo as operações do golpe. Em outras palavras, isso equivale a perguntar: quem, concretamente, gere o Estado ditatorial? Em 1937, no Estado Novo, o poder político passou a ser exercido por um único homem; em 1964, pelas Forças Armadas, isto é, o estamento que operava o monopólio da violência, detendo o emprego direto das armas. Para ele, em 2016, o ator central não é o presidente não eleito, Michel Temer (PMDB), mas o estamento jurídico.
“Embora continuem a funcionar instituições como o Legislativo, é o Judiciário quem começa a dizer que a presidência da Câmara ou do Senado, por exemplo, pode ou não pode ser ocupado por quem for considerado réu. Nas mãos do estamento jurídico, fica o poder de definir quem de nós, cidadãos, pode assumir um cargo. Basta que o MP ofereça uma denúncia e o magistrado a receba, transformando alguém em réu, para que essa pessoa fique inabilitada. Na verdade, o poder político não está na própria Constituição ou na lei, mas nas mãos daquele que diz: ‘sou eu quem pode interpretar a Constituição’”, explica Fon.
Ele sublinha que, desde o término da ditadura de 64, o próprio sistema político facultou ao Judiciário exercer prerrogativas contra a democracia. Estava posta, desde então, a possibilidade de que o golpe fosse operado e aprofundado por dentro do próprio sistema, o que traz uma implicação prática para a luta pela democracia.
“Estamos numa situação em que não podemos encontrar no sistema político as possibilidades de mudança, o que não quer dizer que vamos descartar, por exemplo, a possibilidade de operar no sistema eleitoral. O importante, porém, é perceber que não contamos com o mais importante, ou seja, a mobilização das forças sociais que poderiam, fora do aparelho do Estado, construir a verdadeira democracia. E, aqui, não falamos apenas do retorno ao Estado de Direito. Democracia não quer dizer só isso, mas o controle pelos trabalhadores e todas as forças populares da política em seu próprio interesse”, conclui.
“PEC 55 é um seguro para a burguesia”
Na mesma linha de raciocínio, o professor José Luiz Quadros chamou a atenção para as dificuldades da esquerda no sistema representativo e a disputa nas eleições legislativas. Para ele, o golpe atual não suprime, ainda que temporariamente, instituições formais do Estado direito, como o Judiciário e o Parlamento. Antes, torna-os abertamente funcionais para a implementação e aprofundamento do golpe. Ele destaca as limitações que isso tende a criar para implementação de um popular nas próximas décadas e o papel da PEC 55 (antiga 241) nesse contexto.
“A PEC 55 é um seguro para a burguesia estrangeira. Uma PEC que congela gastos durante 20 anos requer três quintos na Câmara e no Senado. Isso inviabiliza qualquer governo à esquerda pelos próximos 20 anos. Ora, nunca, neste sistema, conseguiremos eleger uma ampla maioria legislativa. A única possibilidade para a esquerda implementar mudanças é pelo Executivo, mas, com a PEC, isso também perde a validade. É como se dissessem: podem eleger governos de esquerda, mas eles não vão poder fazer nada’”, alerta.
Próximo encontro
Na quarta, dia 16, acontece a segunda mesa do ciclo. Com o tema “Sistema político e sub-representações”, estarão presentes a juíza Kenarik Boujikian, da Associação Juízes pela Democracia, e a vereadora eleita mais votada de Belo Horizonte, Áurea Carolina, do PSOL. Os debates começam às 19h, na sede do Sindicato dos Bancários (Rua dos Tamoios, 611), em Belo Horizonte. A entrada é gratuita.
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