Acidentes de trabalho viraram rotina na maior empresa siderúrgica do Rio de Janeiro, a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). Não teve um único mês desse ano sem acidentes no local. Se somado a outras unidades do Grupo CSN, o número chega a 258 acidentes, entre os meses de janeiro e outubro de 2016. O ano nem acabou e o número de acidentes já supera anos anteriores. Em 2015 ocorreram 197 acidentes e em 2014 foram 194, de acordo com um grupo de trabalhadores que se organizam através do Fórum de Resistência, uma organização que reúne empregados da empresa, integrantes da Pastoral Operária e da sociedade civil.
De acordo com dados fornecidos pelo Fórum de Resistência, foram registrados 178 acidentes no mesmo período, só na unidade da CSN em Volta Redonda (RJ), localizada no Sul Fluminense.
No mês de outubro, em Volta Redonda, foram 16 acidentes, três deles considerados graves. No dia 7, dois trabalhadores da CBSI, empresa metalúrgica terceirizada que presta serviço para a CSN, foram soterrados. Eles estavam fazendo reparos setor do alto forno II e caíram dentro do silo que armazena escórias (restos).
No dia 21, uma telha teria se desprendido e caído sobre uma ponte rolante causando um curto circuito e, por consequência, uma explosão de um painel elétrico, dentro da Usina Presidente Vargas. Um metalúrgico foi levado para o hospital com queimaduras. E no dia 25, um funcionário teve a mão prensada entre cilindros em um dos setores da Gerência de Não Revestidos (GNR).
O mês de novembro também começou com acidentes. No dia 4, um vazamento de água no canal de escoamento de aço líquido na unidade de aciaria de aços longos causou queimaduras em quatro outros funcionários. Aciaria é o setor de uma usina siderúrgica onde existem máquinas e equipamentos voltados para o processo de transformar o ferro em diferentes tipos de aço.
Acidentes graves
Entre os 178 acidentes ocorridos esse ano, 22 resultaram em algum tipo de ferimento a trabalhadores. Foram quatro vítimas fatais, uma vítima com amputação de parte do pé e outra com sequela permanente por inalação de gás.
Em agosto, quatro trabalhadores sofreram uma intoxicação após um vazamento de gás no setor de aciaria da Usina Presidente Vargas. As causas do acidente não foram divulgadas. Um dos funcionários ficou com sequelas graves e hoje vive em “estado vegetativo”, segundo a família.
No entanto, o acidente mais grave esse ano aconteceu em março desse ano. Um incêndio no setor de zincagem provocou a morte de quatro funcionários: Wanderlei dos Santos, de 38 anos, Renan Martins, de 29, Dênis da Silva, de 37 e Aluênio Francisco Alves Gouveia, de 31 anos.
Investigação
Tantos acidentes levaram o Ministério Público Federal (MPF/RJ) a instaurar um inquérito, no dia 17 de outubro, para acompanhar a fiscalização realizada pelo Ministério do Trabalho e pela Previdência Social. “A apuração visa identificar as causas dos acidentes e determinar a correção das irregularidades encontradas, com o objetivo de tornar o ambiente de trabalho mais seguro e salubre”, informou o MPF, através de uma nota da sua assessoria de comunicação.
Segundo o procurador federal que acompanha o caso, Júlio Araújo, o aumento de acidentes e a dificuldade em obter informação da empresa chamou a atenção do MPF, que decidiu entrar no caso. “Viemos dar um reforço ao trabalho que já vinha sendo desenvolvido pelo Ministério Público do Trabalho, que tenta apurar as causas dos acidentes e tomar medidas preventivas para novos casos não aconteçam mais”, ressalta o procurador.
A investigação começou a partir da representação de entidades civis organizadas que integram o Fórum de Resistência, que alegaram dificuldades no acesso às informações dos acidentes de trabalho na CSN.
O MPF está programando uma audiência pública para o dia 24 de novembro onde os trabalhadores, sindicato, empresa, familiares de vítimas poderão expor informações sobre os acidentes.
Sindicato dos metalúrgicos
De acordo com o sindicalista Orlando Zamboti, diretor do Sindicato dos Metalúrgicos do Sul Fluminense, o grande número de acidentes na CSN se deve à falta de investimento da empresa.
“Falta investimento em manutenção das máquinas, em novas tecnologias e em equipamentos com segurança”, explicou o sindicalista, que também chegou a colocar parte da responsabilidade nos próprios trabalhadores. “Há uma rotatividade muito grande de operários, 50% dos quadros de funcionários foram renovados nos últimos três anos e essa molecada de hoje não é experiente”, afirmou o diretor do sindicato, que é ligado à central Força Sindical. No entanto, Zamboti reconheceu que a empresa também precisa investir em treinamento de mão de obra.
O sindicalista criticou a ação do Fórum de Resistência junto ao MPF. “Isso não resolve nada. O que resolve é o diálogo e ações conjuntas com a empresa (CSN)”, disse ele. Mas, admitiu a dificuldade no acesso à informação. “A CNS não divulga os detalhes dos acidentes, nem os planos de ações para evitar novos casos na empresa. O sindicato não tem acesso a essas informações”.
O sindicato, segundo Zamboti, tem trabalhado em ações de prevenção de acidente, entretanto, ele informa que a Gerência de Segurança do Trabalho da CSN não fornece, ao sindicato, o plano de prevenção de acidentes. O Brasil de Fato entrou em contato com assessoria de comunicação da CSN, mas até horário de publicação dessa matéria a empresa não havia retornado o contato.
Luta histórica
Nessa quarta-feira (9), às 17h, um debate realizado na Universidade Federal Fluminense (UFF), em Volta Redonda, relembra os 28 anos do massacre de três operários pelo Exército, na histórica greve da CSN de 1988. O evento conta com a participação de integrantes de movimentos sindicais, estudantis e populares, além de entidades e representantes de trabalhadores, Igreja Católica e de outras denominações, o Coletivo 9 de Novembro – Centro de Referência e Memória.
Edição: Vivian Virissimo
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