A Comissão de Ética Pública da Presidência da República decidiu, no fim da tarde desta segunda-feira (21), abrir as investigações contra o ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima (PMDB). De forma unânime, os sete integrantes do conselho decidiram apurar as denúncias feitas pelo ex-ministro da Cultura Marcelo Calero.
Ao deixar o cargo na última sexta-feira (18), Calero afirmou que Geddel, por motivos pessoais, o pressionou para liberar o empreendimento imobiliário de luxo La Vue, localizado na Ladeira da Barra, área nobre de Salvador (BA) — o que enquadraria Geddel no crime de tráfico de influência.
O articulador político do governo Michel Temer (PMDB) é proprietário de um imóvel La Vue, que está embargado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
Mesmo com as controvérsias que se arrastam desde a semana passada, o presidente da República não eleito decidiu pela permanência de Geddel na Secretaria de Governo. A partir desta terça-feira (22), o ministro terá dez dias para se manifestar formalmente à comissão.
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Esvaziamento
Em maio, Temer tentou esvaziar o Iphan com a criação da Secretaria Nacional de Patrimônio Histórico, incluída na medida provisória que recriou o Ministério da Cultura, que havia sido extinto em uma das primeiras ações do governo até então interino.
A nova secretaria seria a responsável pela concessão de licenciamento para obras, e o órgão, que já existia há 80 anos, pela fiscalização. Geddel nomeou Carlos Amorim, um ex-superintendente do órgão na Bahia cuja gestão autorizou, em 2014, a construção do La Vue. Segundo o ex-ministro da Cultura Juca Ferreira (PT), o episódio do edifício La Vue foi o principal fator para a sua demissão, na época que o petista estava à frente da pasta.
De acordo com Ferreira, Escritório Técnico de Licenciamento e Fiscalização (ETELF), encarregado de analisar os projetos imobiliários em áreas de preservação, foi extinto por Amorim depois de ter dado parecer contrário à construção do La Vue Barra. "As evidências de desmandos eram tantas que, em outubro, determinei a demissão de Carlos Amorim e o prosseguimento das apurações e dos estudos técnicos, que mais tarde revelariam até falsificações e montagens grotescas", declarou o ex-ministro em um post no Facebook.
Ferreira afirmou que "muita gente tem olho grande no Iphan devido à importância institucional do órgão", mas que os dirigentes e corpo técnico do Iphan no estado têm demonstrado "compromisso, capacidade técnica e seriedade" no episódio.
Histórico
Com vista privilegiada, o La Vue começou a ser construído em outubro de 2015. As obras do empreendimento estão suspensas desde sexta-feira (18), após determinação do Iphan. Segundo o órgão, o prédio de 31 andares compromete os bens tombados da vizinhança do imóvel. O edifício se avizinha ao forte e ao farol de Santo Antônio, ao forte de Santa Maria, ao conjunto arquitetônico, paisagístico e urbanístico do Outeiro de Santo Antônio (que inclui o forte de São Diogo) e à Igreja de Santo Antônio.
Em um comunicado à imprensa, a construtora afirmou que atende à determinação do Iphan em esfera nacional, embora possua Alvará de Licença para Construção e a Licença Ambiental expedidos pela Prefeitura de Salvador, assim como as autorizações para a construção emitidas pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN Bahia) e Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (IPAC).
Por meio de nota, o Ipac afirmou que garantiu "direito de ampla defesa e contraditório e com respaldo na legislação vigente e em suas normas técnicas", autorizando a construção de, no máximo, 13 andares. Agora, segundo o instituto, cabe ao empreendedor, se desejar, apresentar nova proposta de edificação que respeite visibilidade e ambiência dos bens protegidos.
No ano passado, o Instituto dos Arquitetos do Brasil na Bahia (IAB-BA) tentou impedir a construção do edifício de luxo e entrou com uma ação civil pública no Tribunal Regional Federal contra a empresa, mas teve três recursos indeferidos.
Em nota, a entidade afirma que "a prática de influências na administração pública para proveito pessoal, com promiscuidade entre o interesse público e o interesse privado, em especial, em serviços de regulação e aprovação de obras com interferência sobre o Patrimônio Cultural e Arquitetônico nacional, torna ainda mais imperiosa a defesa da nomeação de técnicos experientes e qualificados para a direção do Iphan e de suas superintendências".
Em entrevista à Rede Bahia, Geddel Vieira Lima negou que tenha pressionado o ex-colega de ministério a liberar a construção.
Edição: Camila Rodrigues da Silva
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