Com mais de 60 mulheres de 19 países, o 1o Encontro de Feminismos e Mulheres da Alba Movimentos acontece em Bogotá, capital da Colômbia, nesta terça (29) e quarta-feira (30). Durante os dois dias de evento serão compartilhados pontos de vista e histórias de resistência antipatriarcais, além de ser construído um planejamento da organização e das lutas para a libertação e emancipação das mulheres do continente e do mundo.
O avanço do conservadorismo e do projeto neoliberal na região foi um dos temas debatidos no espaço. “O conservadorismo não é só de ideias, mas está vinculado a relações econômicas e com as instâncias democráticas. Isso tem a ver com a criminalização dos movimentos e das lideranças de organizações populares. Esse é o gérmen protofascista, porque não querem só derrotar nossas políticas, querem nos destruir”, afirma Nalu Faria, da Marcha Mundial das Mulheres, do capítulo Brasil da Alba Movimentos.
A declaração ocorre em meio a uma leitura de que não há somente um avanço do projeto neoliberal, mas também um fim do ciclo de governos progressistas na América Latina, o que implica novos desafios para os movimentos populares, em especial, para a luta das mulheres. “O que significa o avanço da direita no continente é que ela é responsável pela feminização da pobreza, e a violência que surge disto”, aponta Daniela Inojosa, da Rede de Coletivos Aranha Feminista, do capítulo Venezuela da Alba Movimentos.
“A mercantilização da mulher [dentro do capitalismo] é tão atroz que se faz necessário avançar com a luta pela soberania de nosso território, que é nosso corpo. Nosso corpo não está à venda”, declara Daniela.
Sede do Encontro de Mulheres, a Colômbia recebeu uma análise de conjuntura própria no painel de abertura. De acordo com Sandra Solano, da organização social e política colombiana Congresso dos Povos (Congreso de los Pueblos, em espanhol), um ponto positivo dos Acordos de Paz no país é o reconhecimento da violência de gênero no conflito. “Que exista no acordo este enfoque é um grande avanço para o país”, diz.
Ela ressalta que, apesar do Acordo entre o governo colombiano e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC-EP), ainda falta avançar no acordo com o Exército de Libertação Nacional (ELN).
“Acreditamos que a paz completa significa mudanças. Que as comunidades, seus territórios e organizações, também devem ter a possibilidades de apresentar suas agendas de luta e planos para seus territórios. Obviamente as mulheres estão aí, com diversas propostas de assembleias, espaços de mulheres, que podem incidir nos processos de paz”, conta.
Feminismo antissistêmico
“Há um crescimento muito grande do feminismo por parte das jovens em muitos países. Se o feminismo cresce, cresce também as diferenças e disputas, apesar da sororidade. Nosso feminismo tem projeto, é anticapitalista e antirracista. Assim, temos que nos posicionar não só com palavras, mas também com ações, em um feminismo antissistêmico. Esse feminismo será construído pelas mulheres trabalhadoras, populares, negras, indígenas”, afirma Nalu Faria, do Brasil.
Nesse sentido, a militante da Marcha Mundial das Mulheres chama a atenção de como as agências multilaterais, como a Organização das Nações Unidas para as Mulheres e a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), constróem suas agendas e se utilizam de bandeiras do feminismo para a cooptação. “Temos que estar atentas para que, por exemplo, a luta contra feminicídio não seja por si só, mas que seja uma luta contra o sistema”, defende.
Para Daniela Inojosa, da Venezuela, o feminismo deve ser visto a partir de uma perspectiva popular e aponta os perigos da luta histórica se transformar em uma mercadoria ou como um atenuante das contradições do sistema. “Nos preocupa um feminismo corporativo que cresce no continente, pela direita, que acompanha o capitalismo, e disputa o espaço que nós criamos historicamente. O feminismo sempre foi com uma perspectiva socialista, porque se se enfrenta o patriarcado, se enfrenta com a estrutura do capitalismo”, conclui.
Contexto
O Encontro de Feminismos e Mulheres ocorre nas vésperas da II Assembleia Continental da Alba Movimentos, que será realizado de 1 a 4 de dezembro, em Bogotá, Colômbia. Com a previsão de reunir 300 militantes de organizações e movimentos populares de 27 países do continente, a assembleia é um espaço político-organizativo dos Movimentos Populares da Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América (Alba).
A Alba surgiu em 2004, a partir de uma articulação entre os presidentes Hugo Chávez, da Venezuela, e Fidel Castro, de Cuba. Além da aliança entre governos, há a Articulação dos Movimentos Populares da Alba (Alba Movimentos), a qual começou a se articular a partir dos anos 2010, e foi oficialmente lançada em 2013, na I Assembleia Continental da Alba Movimentos, realizada no Brasil.
Edição: José Eduardo Bernardes
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