Assassinato

Entidades lutam para federalizar processo que investiga morte de vereador catarinense

No quarto capítulo do especial sobre a morte de Marcelino Chiarello, parlamentares querem transparência na investigação

Brasil de Fato | Chapecó (SC) |
Marcelino Chiarello, vereador de Chapecó (SC) entre 2004 e 2011
Marcelino Chiarello, vereador de Chapecó (SC) entre 2004 e 2011 - Arte/ Brasil de Fato

Morte de vereador petista que denunciava esquemas de corrupção em Santa Catarina completa cinco anos esta semana. As razões que motivaram o crime nunca foram esclarecidas pela polícia e o caso foi arquivado no ano passado como suicídio. 

Este é o quarto dos cinco capítulos que compõem a série especial do Brasil de Fato sobre um dos acontecimentos mais obscuros da história política catarinense

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Os integrantes do diretório municipal do PT em Chapecó questionaram a falta de transparência nas investigações sobre a morte de Marcelino Chiarello desde os primeiros meses e convenceram o secretário estadual de segurança pública César Augusto Grubba a recebê-los em uma reunião a portas fechadas em janeiro de 2012.

O encontro aconteceu no dia 20, em Florianópolis, com a presença do advogado nacional do partido, Luiz Eduardo Greenhalgh, do presidente do diretório estadual José Fritsch, do deputado federal Pedro Uczai (PT) e de Ângela Vitória (PT), ex-colega de Marcelino na Câmara. Diante deles, Grubba prometeu agilidade na apuração do caso – mas não convenceu. 

“Foi naquela reunião que nós começamos a sentir uma sintonia entre Florianópolis e Chapecó. Começamos a ouvir coisas iguais aqui e lá. Era uma espécie de cumplicidade”, interpreta Uczai. “Eles já estavam com uma pré-conclusão, mesmo sem ter muita base pra isso”. 

Quando a tese de suicídio veio à tona, através do parecer de Zulmar Coutinho – encomendado pelo Instituto Geral de Perícias de Santa Catarina (IGP-SC), órgão subordinado à Secretaria de Segurança Pública –, os petistas passaram a lutar pela federalização do caso.

Desde 2004, a Justiça Federal está autorizada a assumir investigações que estavam sob responsabilidade dos estados. O instrumento constitucional que permite essa transferência é o chamado “Incidente de Deslocamento de Competência (IDC)”, e sua utilização requer evidências de violação de direitos humanos durante a apuração ou julgamento de um processo. 

Entre os parlamentares catarinenses, Pedro Uczai era quem tinha mais trânsito em Brasília e coube a ele agendar uma visita ao Ministério da Justiça e uma conversa com o então procurador-geral da República, Roberto Gurgel. Os deputados estaduais Dirceu Dresch (PT) e Luciane Carminatti (PT), que foram com ele à Procuradoria em 10 de fevereiro de 2012, criticaram a postura complacente de Grubba e ressaltaram a necessidade de federalização. 

Dois meses depois, um despacho publicado no Diário Oficial da União pelo então ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, autorizou a Polícia Federal a participar da apuração, não para assumir o comando da investigação, como desejava o PT, mas para prestar apoio técnico ao Ministério Público de Santa Catarina. “O caso nunca foi federalizado”, enfatiza Uczai. “E essa é a nossa luta até hoje”

Faltam provas, segundo o inquérito

Menos de uma semana após a morte de Chiarello, o delegado Ronaldo Moretto, responsável pelo inquérito da Polícia Civil, disse ao jornal Folha de S. Paulo que a cena do crime era uma tentativa “amadora” de disfarçar um homicídio. Antes da missa de sétimo dia, ele coletou os depoimentos de dezoito pessoas – assessores, vizinhos e familiares da vítima –, e logo apareceram as primeiras suposições sobre a motivação do crime.

É curioso que uma investigação que começou a todo vapor tenha sido arquivada, quatro anos depois, sem nenhuma resposta convincente sobre a dinâmica da morte.

Segundo Moretto, a convicção de homicídio começou a arrefecer dentro da Polícia Civil depois que ele analisou 11.405 ligações telefônicas, que totalizaram 129 horas e 30 minutos de áudio: nenhum dos grampos revelou qualquer informação comprometedora sobre os suspeitos que ele havia mapeado. Além disso, a perícia de local não indicou a presença de terceiros na casa de Chiarello no momento da morte, e o Ministério Público apontou falhas técnicas no parecer produzido pela USP, que sustentava a tese de assassinato.

“Não é só improvável, mas completamente desprovido de fundamento técnico o parecer médico-legal subscrito pelo assistente Daniel Romero Muñoz”, relataram os promotores Jackson Goldoni, Benhur Betiolo e Cléber Hanisch no pedido de arquivamento do caso. “A simulação (...) ignora totalmente as manchas de sangue deixadas, principalmente, no chão, do lado esquerdo do corpo da vítima, não sendo possível que uma pessoa levantasse um corpo desfalecido sem mexer na cama e sem pisar sobre as manchas de sangue. É essa uma hipótese improvável, para não dizer impossível”, completam os autores do pedido na página 36.

O pedido de arquivamento foi feito pelos promotores no dia 26 de agosto de 2013 e negado pelo juiz Jeferson Zanini, da 1ª Vara Criminal de Chapecó uma semana depois, sob o argumento de que não havia elementos para uma conclusão definitiva sobre a causa mortis de Chiarello. 

Após a negativa, Zanini encaminhou os autos para serem analisados pela Procuradoria-Geral de Justiça de Santa Catarina. A resposta, que deveria ser conhecida em até 30 dias, demorou um ano e nove meses, e foi favorável ao fim das investigações.

Caso Marcelino pode ser reaberto

O inquérito sobre a morte de Marcelino foi arquivado em 29 de junho de 2015 pelo juiz Jeferson Vieira. O artigo 18 do Código de Processo Penal, citado por ele em sua decisão, prevê que “a autoridade policial poderá proceder a novas pesquisas, se de outras provas tiver notícia”.

Na semana do arquivamento, o vereador Cléber Ceccon (PT) aceitou um convite do deputado federal Pedro Uczai para acompanhá-lo em uma visita ao então procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Eles foram recebidos na Secretaria dos Direitos Humanos da Presidência da República  por Roberto Nascimento, chefe de gabinete do então ministro-chefe da pasta, Pepe Vargas. 

Rodrigo Janot prometeu, naquele dia, estudar o caso e “verificar a possibilidade de federalização”. Segundo ele, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) era o caminho mais indicado para questionar as decisões judiciais relativas à morte de Chiarello. “O Janot e o Pepe Vargas disseram que, assim que surgissem elementos novos, relevantes, o caso pode ser reaberto”, lembra Ceccon. “E a gente vai continuar lutando para federalizar, para que o crime seja desvendado. Não só porque o Marcelino era um homem público e a cidade exige respostas, mas porque os amigos e familiares dele precisam saber a verdade para continuar suas vidas”.

Amanhã, na quinta e última reportagem desta série especial, saiba mais sobre o legado político de Marcelino Chiarello na região de Chapecó e sobre os protestos realizados em Santa Catarina para exigir esclarecimentos sobre o caso.

Edição: José Eduardo Bernardes

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