Crime

#YoSoyYuliana: O feminicídio que comoveu a Colômbia

A menina indígena Yuliana Samboní, de 7 anos, foi assassinada por Rafael Uribe Noriega, membro da oligarquia de Bogotá

Notas Periodismo Popular |
Milhares de mulheres saíram às ruas do país reivindicando justiça
Milhares de mulheres saíram às ruas do país reivindicando justiça - Confluencia de Mujeres para la Acción Pública

O feminicídio da menina Yuliana Samboní, de sete anos, que ocorreu no último domingo (4), comoveu a sociedade colombiana. Milhares de mulheres saíram às ruas reivindicando justiça.

Yuliana Andrea Samboní Muñoz era filha de uma família indígena do norte do estado de Cauca que havia se mudado recentemente a Bogotá, em busca de melhores condições de vida. Quando foi sequestrada, se encontrava brincando na rua em frente à sua casa, no bairro de Bosque Calderón, na região de Chapinero, no norte da capital colombiana.

A menina foi encontrada morta às 19:30 do mesmo dia, no apartamento do principal suspeito, Rafael Uribe Noriega, quem se encontra atualmente na prisão Modelo de Bogotá, por ser considerado um “perigo para a sociedade”.

O fiscal geral Néstor Humberto Martínez informou que Uribe Noriega está sendo acusado de quatro crimes: feminicídio agravado, tortura, sequestro simples e acesso carnal violento pelo crime de Yuliana. As investigações demonstraram que a menina foi levada a uma caminhonete que seguiu um trajeto até a residência de Uribe Noriega, um arquiteto de 38 anos pertencente a uma família rica de Bogotá, proprietária de uma construtora. Evidências da presença de Yuliana e do acusado foram encontradas no veículo e no apartamento onde apareceu o corpo da criança.

Na segunda (5), antes que as investigações vinculassem o arquiteto ao caso, Uribe Noguera havia tentando se internar na Clínica Navarra, alegando dependência a drogas e doenças mentais, logo após ter ingerido um coquetel de licor e cocaína. Mas, segundo o ministério público local, o acusado se encontrava consciente na hora que cometeu os crimes contra Yuliana, que morreu asfixiada.

Caso

Estão envolvidos no caso os irmãos do acusado, Francisco y Catalina Uribe Noguera, por terem tentado alterar a cena do crime em duas ocasiões. Eles foram os que encontraram o corpo e avisaram a polícia.

“Sente-se muita dor e impotência por nos encontrarmos frente a um Estado que não dá garantias de justiça”, disse, em entrevista ao Notas, Sandra Solano Nivia, da Confluência de Mulheres para a Ação Pública, que integra a organização colombiana Congresso dos Povos.

“Este novo caso de feminicídio nos põe a pensar que outro horror nos pode passar, para as mulheres, sobre nossos corpos, sobre nossas vidas. Também nos faz pensar em como nos vêm roubando o espaço público, das mulheres e das meninas. Já não podemos estar nas ruas, tranquilas, brincando”, afirmou.

Sandra contou ainda que os meios de comunicação trataram o tema com uma dose de sensacionalismo, se centrando na história de Uribe Noguera e deixando à margem a vítima e sua família. “A mãe da Yuliana, que está grávida, está internada em um hospital devido à dor e ao desespero que lhe ocasionou o feminicídio de sua filha. Disso os meios de comunicação não falam”, alegou.

Impunidade

As acusações podem levar o acusado a 60 anos de prisão, mas Sandra relatou que “possivelmente ele pode ficar livre dentro de alguns anos, porque faz parte de uma oligarquia na Colômbia, e sabemos todo o poder que isso implica”.

“Isso nos faz pensar em como a violência contra as mulheres e as meninas neste país está atravessada pela classe social. Somos as mulheres e as meninas empobrecidas as que estamos morrendo, em sua grande maioria. Este feminicida [assassino de mulheres] foi atrás de uma menina pobre porque sabia que seguramente não iria passar nada”, declarou.

Durante a tarde da terça (6), diversas mulheres se reuniram nas ruas de Bogotá para repudiar o feminicídio de Yuliana. Durante a concentração do ato, foi reivindicada justiça, ao mesmo tempo que se divulgou a consigna #NiUnaMenos, que nasceu na Argentina no dia 3 de julho de 2015 e se massificou pelo mundo.

“O movimento de mulheres da Colômbia está totalmente comovido. Acabamos de nos despedir de uma companheira que foi assassinada por empalhamento no Vale do Cauca. É um momento para que estejamos mais fortes do que nunca, em irmandade, exigindo reais garantias de não repetição e exigindo justiça de reparação”, sustentou Sandra.

“Na Colômbia, até o mês de setembro, foram registrado 160 casos de feminicídio ao longo de 2016, mas há muitos casos que não foram denunciados”, informou Sandra. E especificou que, apesar da existência de uma legislação que penaliza o feminicídio (Lei 1761), “dos 156 casos, apenas 20 têm sentença”.

“Isso reflete a dificuldade de acesso à justiça que nós mulheres temos em nosso país e para que cumpra nosso direito a viver uma vida livre de violências”, lamentou.

O caso de Yuliana, que vem tendo um forte impacto na sociedade colombiana, pode ser o início da massificação do movimento contra a violência em direção às mulheres. Assim considera Sandra, quem opina que somente com o fortalecimento de um movimento latino-americano contra os feminicídios poderá ocorrer a luta contra esta violência machista, própria de uma profunda cultura patriarcal.

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Tradução: Vivian Fernandes

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