Quase todos os dias os jornais do Rio de Janeiro retratam a situação de abandono por que passa a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), publicando declarações de membros sua comunidade acadêmica, perplexos com a situação precária que se encontra um dos principais centros de ensino e pesquisa do país. Assim como, representantes do governo do estado do Rio de Janeiro, que se desculpam com o argumento de que a UERJ é cara demais. Porém, o que todas essas notícias escondem é que a crise da UERJ não decorre de qualquer excesso de gastos. Todos os custos são previamente discutidos e submetidos à Assembleia Legislativa fluminense, no momento da aprovação do orçamento estadual.
A crise se instalou quando o Estado não repassou os recursos previstos no orçamento para a universidade, ou repassou, mas em valores bem aquém daqueles que foram previstos e que são indispensáveis para manter a instituição em funcionamento.
É claro que não se pretende que a UERJ fique imune à crise de todas as finanças públicas do estado. Não obstante, a universidade cortou cerca de 35% dos valores destinados aos seus contratos, em um esforço bastante expressivo e que não se vê com frequência. Como quase todo o seu orçamento executado é destinado à folha de salários, esse é o ajuste que o seu atual grau de autonomia permite fazer.
Porém, é visível que dessa crise financeira fluminense, alguns órgãos e entidades têm sido atingidos mais violentamente. Não em função de características orçamentárias, mas pela importância que lhes é atribuída pelo governo do Rio de Janeiro.
A educação, em geral, e a UERJ, em especial, não têm merecido do Governo Pezão a prioridade garantida pelos textos constitucionais, pela sociedade fluminense e pelos discursos de todos os candidatos durante o período eleitoral. Muito ao contrário, têm sido absolutamente negligenciadas por uma política que privilegiou apenas os grandes eventos e empreendimentos merecedores de benefícios fiscais de constitucionalidade duvidosa, em detrimento da vida da população fluminense.
No que se refere ao tratamento dado à UERJ pelo governo do estado, é preciso lembrar que a autonomia das universidades públicas são protegidas pela Constituição, isso serve tanto para a gestão financeira quanto patrimonial, bem como a gestão de suas receitas e despesas previstas no orçamento aprovado pelo parlamento.
Porém, o que ocorre, na prática, é que o governo não só centraliza todos os recursos e a efetivação de todas as despesas, como ainda repassa do orçamento o valor que bem entende, sem qualquer preocupação em relação ao contingenciamento das rubricas orçamentárias, o que lhe exigiria a adoção de critério que fosse compatível com a autonomia orçamentária da Universidade.
Há quase duas décadas o Governo do Estado incluiu as receitas e despesas da UERJ no caixa único do Tesouro do estado. Isso praticamente aniquilou a autonomia financeira da universidade. Enquanto o Tesouro executa o pagamento das despesas, a perda da autonomia passou desapercebida por muitos. Mas, agora, com a reiterada, abusiva e expressiva falta de pagamento das despesas, que leva à paralisação da universidade, o tema exige uma nova abordagem, a partir do resgate da configuração que a Constituição conferiu ao tema.
Assim, a crise não reside em quanto a UERJ gasta, o que continua em patamares bastante razoáveis para uma instituição de ensino e pesquisa do seu porte. Mas sim em como o seu orçamento é executado, pois só uma universidade que tenha autonomia financeira e orçamentária pode, em momentos de crise, encontrar os seus próprios caminhos, a partir de suas próprias prioridades. Essa autonomia significa que ela também poderá administrar cautelosamente seus recursos, ainda que contingenciados, sem precisar depender da maior ou menor compreensão que o governador atual tenha sobre o ensino superior público, gratuito e de qualidade.
* Ricardo Lodi Ribeiro é professor adjunto de Direito Financeiro da UERJ. Diretor da Faculdade de Direito da UERJ. Presidente da Sociedade Brasileira de Direito Tributário (SBDT).
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