Alunos e funcionários da Universidade de São Paulo (USP) foram atacados pela Polícia Militar na tarde da última terça-feira (7), quando protestavam em frente a reitoria da Universidade. O ato, organizado pela Associação dos Docentes (Adusp), Sindicato dos Trabalhadores (Sintusp), Diretório Central dos Estudantes (DCE) e o Fórum das Seis, criticava a reunião do Conselho Universitário, que entre outras pautas, votaria o corte no orçamento dedicado à folha de pagamento dos funcionários da instituição. Com a redução, mais de 5 mil trabalhadores podem ser demitidos nos próximos 5 anos.
Cinco pessoas, entre eles quatro estudantes da Universidade foram detidos e levados para o 93º Departamento de Polícia (DP), na avenida Corifeu de Azevedo Marques, no bairro do Jaguaré. Um dos detidos, o estudante de Ciências Sociais, David Paraguai Molinari, 19 anos, conta que foi preso apenas por filmar a ação truculenta do Batalhão de Choque da Polícia Militar.
“Eles deram o primeiro ataque contra a manifestação. Estava fazendo imagens para o Facebook do Balaio (grupo político que atua na Universidade) e um policial tomou o celular da minha mão. Eu o questionei e quando ele devolveu o celular e virei as costas para ele, fui algemado”, disse Molinari.
O estudante disse que ficou, junto com os outros detidos, em uma sala da reitoria, com o celular apreendido pela Polícia Militar. “Não pude sequer falar com um advogado”, disse. Dali, os detidos foram levados para o Departamento de Polícia, segundo Molinari, sob gritos e truculência. “Nos mandavam calar a boca, olhar para baixo. Dirigiram como loucos e não conseguíamos nos equilibrar no camburão”.
Molinari foi liberado como testemunha, mas, segundo ele, os demais alunos serão indiciados pela participação na manifestação. “Eles começaram a chegar com pedras e rojões, para tentar nos incriminar”, descreveu o estudante.
Um dos presos, Fernando Marigan, foi detido pela Polícia Militar ao chegar no Hospital Universitário da USP (HU) para acompanhar amigos que foram feridos durante a ação da PM.
O estudante Franciel Souza foi um dos tantos feridos durante o ato. Ele foi levado ao HU e lá foi detido pela PM. Ele conta que quando viu "um companheiro sendo covardemente agredido fui socorrê-lo, assim como fizeram outros companheiros. Ao chegar perto da confusão, um policial me acertou com uma pancada de cassetete direto na cabeça que me deixou atordoado, sai do tumulto e percebi que estava sangrando", disse.
O aluno conta que os policiais o acusaram de ter roubado o cassetete de um dos oficiais e acertá-lo. "A versão foi confirmada por outro PM e isso me acarreta, além das acusações comuns de atos como "resistência" e "agressão", um crime de furto qualificado que terei que responder na justiça criminal", conta Souza.
A USP afirma que os alunos impediram a entrada dos conselheiros no prédio da reitoria. Alunos e funcionários presentes, no entanto, afirmam que foi a ação da PM que iniciou o confronto. A professora da Faculdade de Educação da USP, Kimi Tomizaki, e vice-presidente da Adusp (Associação dos Docentes da Universidade de São Paulo), participou do ato e inclusive, chegou a conversar com os conselheiros antes do encontro.
Segundo Tomizaki, não houve qualquer impedimento à entrada das pessoas no prédio. “Os conselheiros iriam entrar no prédio escoltados pela PM, que abriu espaço para que eles entrassem com bombas”, relata a professora. “Um ato pacífico se tornou uma praça de guerra. A gente foi massacrado pela PM em uma ação desastrosa demandada pela reitoria para garantir que o Conselho se reunisse”, disse.
Conselho
Mesmo após a ação da PM em frente a reitoria, o Conselho Universitário se reuniu e aprovou o projeto chamado Parâmetros de Sustentabilidade Econômico-Financeira da USP. O reitor da Universidade, Marco Antonio Zago, argumentou, durante a abertura da reunião, que foram os alunos e funcionários que agiram com truculência com a Polícia Militar e os conselheiros, tentando impedi-los de entrar no prédio.
“O Conselho não pode se curvar diante dessas agressões. Isso é um totalitarismo incompatível com as normas da convivência democrática da Universidade. Divergência de opinião não se manifesta por meio da intolerância. Conselheiros foram assediados e agredidos fisicamente, o que não pode ser tolerado”, disse.
Para Tomizaki, “totalitarismo é enviar uma proposta que vai mudar toda a vida de uma universidade, sem que essa proposta seja discutida”. Segundo a professora, “sequer os departamentos foram convidados a opinar sobre algo que muda radicalmente a vida da gente nessa universidade”.
David Molinari lembra que “os cortes já fazem parte da gestão do Zago, e com esse projeto aprovado ele vai poder demitir docentes estáveis”, diz. “No limite, ele quer privatizar a USP”, apontou o estudante.
A proposta
Segundo o texto divulgado pela assessoria de imprensa da USP, os “Parâmetros de Sustentabilidade Econômico-Financeira” vão estabelecer “regras sobre limites com despesas totais com pessoal”.
A comunidade de funcionários e alunos da Universidade aponta que a falta de diálogo com as instituições impede que a proposta seja contestada. “O central da proposta que a universidade está usando é que 105% do orçamento é destinado para folhas de pagamento. Ela prevê que esses 105 cheguem a 80% do orçamento”, explica Kimi Tomizaki.
Durante a reunião, o reitor enfatizou que o programa não impedirá a concessão de reajustes salariais e também destacou que não haverá demissões de servidores técnicos e administrativos. Segundo o Sindicato dos Trabalhadores da Universidade de São Paulo (Sintusp), a proposta deve demitir 5 mil funcionários, em 5 anos. Segundo o programa, funcionários estáveis estariam protegidos dessas demissões.
A professora Tomizaki lembra que “nos últimos 10 anos, o número de matrículas aumentaram bastante e por isso, os recursos têm sido tão utilizados”. Tomizaki lembra que como a Universidade é uma autarquia, não estaria enquadrada na Lei de Responsabilidade Fiscal, motivo que embasa o corte no orçamento das folhas de pagamento.
“O que precisamos é combater a sonegação no Estado de São Paulo, que é absurda”, completa Tomizaki.
Edição: Camila Rodrigues