Com prejuízo de R$ 14,8 bilhões em 2016 e dívida de R$ 314 bilhões, 20% menor que em 2015, a Petrobras apresentou essa semana um rigoroso plano para reduzir a dívida de forma acelerada, com medidas de desinvestimento e venda de ativos, que envolvem empresas subsidiárias e até campos do pré sal.
A medida foi criticada pela comissão econômica criada pela Federação Única dos Petroleiros (FUP) para acompanhar a gestão da estatal e o setor como um todo. Composta pelo coordenador da FUP, José Maria Rangel, e os economistas Cloviomar Cararine (técnico do Dieese), Rodrigo Leão e Eduardo Costa Pinto (professor de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro), a comissão fez uma análise do balaço anual apresentado pela companhia na última terça-feira (23). A avaliação da FUP e dos economistas é que as decisões administrativas da atual gestão da Petrobras podem comprometer o seu futuro.
“Não dá para entender porque a Petrobras está vendendo algo que outras companhias do mundo querem comprar. Tanto que a Shell (EUA) e a Total (França) estão vendendo em outros países para comprar no Brasil”, afirma José Maria.
Para entender porque a Petrobras decidiu diminuir os investimentos e vender subsidiárias e outros ativos, é preciso antes compreender algumas questões técnicas. A atual gestão da Petrobras usou um cálculo contábil conhecido como “impairments” para estabelecer metas que serão adotadas. A companhia avalia periodicamente o valor dos ativos (tudo o que é de propriedade da empresa) que geram lucros antes de contabilizá-los no balanço. Cada vez que se verificar que um ativo esteja avaliado por um rendimento menor no futuro, ou seja, toda vez que houver uma projeção de geração de caixa inferior ao montante pelo qual o ativo comprado ou construído, a companhia terá que fazer baixa (venda). Isso significa dizer que se a projeção de lucro da Petrobras Distribuidora for menor que aquela calculada pela empresa para recuperar o valor investido ela então terá que ser vendida.
“No entanto, essas projeções futuras da Petrobras são mais rigorosas que aquelas apresentadas por outras companhias internacionais. O mercado do petróleo passa por dificuldades momentâneas, que a Petrobras trata como se fosse uma crise estrutural”, afirma o professor da UFRJ, Eduardo Pinto.
A crise que afeta o mercado do petróleo, com baixo valor do barril, provocou prejuízos nas mais importantes empresas do setor. Em 2016 o barril de petróleo foi vendido a um valor 17% inferior ao ano de 2015.
Porém, companhias internacionais como a Exxon (EUA) e a Chevron (EUA), realizaram “impairments” menor que os utilizados pela Petrobras. Entre 2014 e 2016, o desinvestimento dessas duas multinacionais foi de US$ 2 bilhões cada uma. Enquanto a Petrobras reduziu US$ 39,48 bilhões. Todas as gigantes do petróleo tiveram números menos conservadores. A Shell US$ 17 bi, a BP (Reino Unido) US$ 12 bi e a Total foi de US$ 8,6 bi.
Além disso, o balanço apresentado essa semana pelo presidente da Petrobras, Pedro Parente, apontou cortes de 32% nos investimentos da empresa e novos ajustes contábeis que reduziram os preços de seus ativos em R$ 21 bilhões, os chamados “impairments”.
“Esse não é o momento de vender. Os preços estão baixos e a crise é temporária. Além disso, o governo Temer quer vender subsidiárias que sempre geraram lucro para a Petrobras, como é o caso da BR Distribuidora. Outro absurdo é a venda de campos do pré sal, nossa riqueza que o mundo inteiro está de olho. E quer fazer isso porque sempre foi do interesse desse governo atrair capital estrangeiro”, ressalta o coordenador da FUP, José Maria Rangel.
Ele explica ainda que Federação Única de Petroleiros reivindicou junto a alguns deputados federais a convocação de uma audiência pública no Congresso, onde os representantes sindicais dos empregados da Petrobras possam debater essas medidas com os diretores e conselheiros da companhia. “A diretoria da Petrobras vai ter explicar porque quer vender ativos a preço de banana. Essa é uma política entreguista”, critica José Maria.
A Shell é uma das principais empresas estrangeiras que busca investir no setor de petróleo do Brasil. Recentemente ela anunciou a venda de ativos no Mar do Norte britânico no valor de US$ 3, 8 bilhões e comunicou investimento de US$ 10 bilhões no mercado brasileiro.
“Só vamos saber de fato qual o prejuízo da companhia na venda desses ativos quando as compradoras apresentarem seu balanço. Aí vamos ver quando a Petrobras deixou de lucrar”, diz o economista Rodrigo Leão.
Número positivos da Petrobras
Hoje o pré-sal representa mais de 50% da produção de petróleo da Petrobras, de acordo com dados da empresa. Para a comissão econômica da FUP, os investimentos realizados entre 2007 e 2013 foram fundamentais para alcançar esse resultado. Além disso, o custo de produção é inferior a outras reservas. No pré sal esse valor é de 8 dólares por barril. No passado, esse valor já foi de 35 dólares.
Além disso, a Petrobras teve produção recorde de 2,94 milhões de barris diários de petróleo no final de dezembro e registrou um aumento de 4% na geração de seu caixa operacional.
A produção dos campos do pré-sal aumentou consideravelmente a participação do óleo nacional na carga processada pelas refinarias (92% em 2016), reduzindo as importações e melhorando a qualidade e o rendimento da gasolina e dos demais derivados. “Tudo isso só foi possível em função dos investimentos feitos entre 2003 e 2013, o que coloca em xeque a política da atual gestão de reduzir drasticamente os investimentos e vender ativos”, destacou o técnico do Dieese, Cloviomar Cararine.
Diante da possibilidade de um desmonte da empresa, o coordenador da FUP faz um alerta à sociedade. “A crise que a Petrobras sofre é a mesma crise que as outras empresas do setor sofrem, em função da queda dos preços do barril do petróleo. Sob a falácia de combate à corrupção, a direção da Petrobras está levando a nossa empresa para um caminho sem volta. Estão sendo paralisadas atividades que são vitais para a companhia, como é o caso da perfuração. Os estragos que estão sendo feitos são algo que vamos levar anos para recuperar. É bom que toda a sociedade saiba disso. A direção da empresa tem que vir a público explicar o porquê de estar na contramão do mundo. Por que ela não quer o pré-sal quando o mundo inteiro quer?”, questiona José Maria Rangel.
Edição: Vivian Virissimo