Maranhão

Quilombola da comunidade do Charco, no Maranhão, é morto com tiros nas costas

A comunidade vive ameaçada depois que fez a auto titulação e rompeu com submissão imposta por fazendeiros

Belém (PA) |
Comunidade do Charco
Comunidade do Charco - Divulgação / Blog Jailson Mendes

O líder quilombola Raimundo Silva, de 57 anos, conhecido como Umbico, morador da comunidade do Charco, em São Vicente Férrer, na Baixada Maranhense, foi morto no último dia 12 de abril. A comunidade sofre com a violência gerado pelo conflito da luta pelo direito à terra, contudo não há confirmações que a morte de Silva esteja relacionada aos conflitos fundiários na região.

“Apesar de ser claro que foi uma tocaia, uma execução, a gente não tem como fazer relação com o conflito de terra”, afirma Rafael Silva, advogado da Comissão Pastoral da Terra (CPT-MA). Mesmo cauteloso sobre as motivações que poderiam ter causado a morte do quilombola, ele pontua que a comunidade sempre sofreu ameaças, principalmente quando passaram a não entregar mais a metade da produção da comunidade ao fazendeiro da região.

“A comunidade sempre sofreu ameaça. Quando ela fez a auto definição quilombola, rompeu com a lógica de pagamento de parte da produção da terra para o fazendeiro”, afirma.

Umbico, segundo Silva, foi morto com um tiro nas costas por uma espingarda chamada popularmente como “Bate Bucha”. O corpo encontra-se no Instituto Médico Legal (IML), onde passará por uma necropsia.

Embora ainda não esteja certo que a morte de Umbico está vinculada a conflitos de terra, este não é o primeiro caso de assassinato de pessoas da comunidade. Em 2010 o líder quilombola Flaviano Pinto Neto foi morto por pistoleiros. Ele criou o Movimento Quilombola do Maranhão (Moquibom) e a formação da associação da comunidade. Em 2015 os fazendeiros acusados de serem os mandantes do crime foram absolvidos pela justiça.

Inaldo Cerejo, também integrante da CPT-MA, conta que Umbico foi a outra comunidade para buscar a aposentadoria da mãe. Ele afirma que, segundo os relatos dos policiais que verificaram o corpo, o dinheiro ainda estava no bolso do quilombola. Pelas características do assassinato, descarta-se a possibilidade de latrocínio, roubo seguido de morte.

Entretanto, Cerejo pondera que "de qualquer modo a gente está aguardando a investigação da polícia e mais informações do próprio laudo cadavérico”.

A CPT divulgou nota sobre a morte de Umbico, confira na íntegra.

Nota Pública

A Comissão Pastoral da Terra (CPT-MA) e o Movimento Quilombola do Maranhão (MOQUIBOM) vêm a público se manifestar sobre o assassinato de Raimundo Silva, Umbico, no último dia 12 de abril, no quilombo do Charco, em São Vicente Férrer-MA.

A história das violências que se abatem sobre os povos e comunidades tradicionais deixa marcas profundas em todos nós. Os quilombolas, os povos indígenas, quebradeiras de coco, sertanejos, pescadores, sabemos que sempre que nos levantamos na luta por direitos nossos corpos são ameaçados.

Prosseguimos nossa caminhada conscientes do sofrimento por que passam nossos irmãos e irmãs de luta, dia após dia, ao longo de gerações. A vulnerabilidade que nos foi imposta historicamente pela segregação de nossas culturas, costumes, formas de viver, fazem nossas vozes silenciadas ecoarem em vão.

Mas repetimos: Há 72 lideranças camponesas ameaçadas de morte no Maranhão, apenas em 2016!

13 irmãos de luta foram mortos em 2016 no Maranhão!

Essa é a nossa realidade. Nossos corpos estão marcados por sucessivas violências sofridas. Nossos sonhos nos colocam em risco. Nossos corações entoam nosso martírio.

A notícia da morte de Umbico nos chocou a todos. Diante dessa tragédia que tanto nos entristece, nossa resposta vem com a firmeza dos que têm a calma e a coragem de lidar com a verdade. Seja qual for sua autoria e motivação, ela é injusta, desnecessária. Apenas alimento de dor.

Nossa fome, porém, é de justiça, não de vingança. O que nos move são nossas mãos unidas. Delas entrelaçadas vêm a nossa força.

Esperamos que a polícia civil esclareça essa perda enorme e brutal. Em nossos corações clama o canto dos que querem paz e vida na terra em que somos.

Quilombos do Maranhão, 13 de abril de 2017.

Edição: Luiz Felipe Albuquerque