A data de 30 de abril de 2017 cai como um avião no meio da metrópole chamada MPB. A partida de Belchior para outro plano faz do Ceará sinônimo de Brasil; e podemos buscar em Belchior um pouquinho do Paraná.
Em 20 de setembro de 1979, por exemplo, ele era entrevistado por Aramis Millarch, pesquisador musical paranaense. Era véspera da estréia da peça “Rasga coração”, de Vianninha, em Curitiba, a qual concluía com a música mais famosa do compositor cearense – “Como nossos pais”.
Na entrevista, Belchior menciona sua concepção de “canção”, nem só poesia nem apenas som. A totalidade era o que lhe interessava. Dizia-se influenciado por Décio Pignatari, poeta concretista, que, aliás, vivera a parte final de sua vida na capital paranaense.
A totalidade de Belchior, porém, sempre foi vivida com muita angústia, rebeldia e juventude. A poesia lancinante de seu canto torto, paralela a linhas melódicas nem muito limpas nem muito leves, fazem de sua obra uma ode à crítica social em todos os seus níveis.
Enquanto durou sua viagem nesse mundo, deixou suas marcas na história de um Brasil que transitou da ditadura à reconstitucionalização. Aliás, sua música “Pequeno Mapa do Tempo” o exemplifica, por ter sido censurada, a ela se imputando crítica ao regime e aos exílios (por causa de o poeta expressar seu medo de avião), bem como à realidade social do país. É nela que encontramos o Paraná.
O rastro de Belchior deixado neste pequeno mapa é o do medo, qualificado de Brasil. Um Brasil geral, de várias capitais. O poeta, assim, volta ao tema de sua “Alucinação” – o medo da solidão e de sua violência. Por isso, Belchior cita, para expressar seu medo, os nomes das grandes cidades brasileiras na sua música. No meio delas, um “Paranapá”, meio Paraná, metade Paranapanema. Portanto, um conflito de terras no meio do medo urbano já estourava na crítica de Belchior: pá!
Na madrugada de 29 de abril (data histórica da lutas dos professores paranaenses contra a repressão da democracia burguesa) para o dia 30, Belchior nos deixa, como um Concorde abatido pelo tempo. Mas se nesse ano ele morreu, daqui para frente não morre mais. Mesmo abrindo a porta que dá pro sertão da nossa solidão, o Brasil é um sujeito-nação de sorte por ter tido, do Pará ao Paraná-pá, o cearense Belchior entre os seus!
Para ficar por dentro:
- Áudio da entrevista de Belchior concedida a Aramis Millarch
- Áudio de conversa livre com Belchior organizada por Aramis Millarch
- Artigo de Aramis Millarch sobre “Belchior, uma obra com personalidade”
Edição: Ednubia Ghisi