Após discussões acaloradas entre governistas e oposicionistas do Congresso, que beiraram a agressão, o relatório da proposta de reforma trabalhista, apresentado na sessão da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado nesta terça (23), foi considerado lido sem ter sido apresentado formalmente. O relator, Ricardo Ferraço (PSDB-ES), não apresentou mudanças, apenas sugeriu alguns vetos, para evitar que o projeto tivesse de retornar à Câmara.
Apesar de Senado e Câmara estarem em pleno período de trabalho, vários deputados foram ao Senado para tentar acalmar os ânimos de parlamentares e manifestantes que acompanhavam a leitura do relatório.
A confusão começou depois que a CAE rejeitou requerimento do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) pedindo que o relatório não fosse lido, alegando questões do regimento interno. A votação foi apertada: 13 votos a 11. Em seguida, Ferraço não conseguiu apresentar seu parecer. Alguns parlamentares trocaram empurrões.
"Não quero crer que aquele relatório foi lido. Não existe essa figura no regimento interno da Casa", afirmou, já em sessão no plenário, a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM). "O que o Parlamento não pode fazer é tentar fazer de conta que não tem problema nenhum e que a Casa está trabalhando normalmente."
Os governistas querem manter a tramitação das reformas, apesar da crise que atingiu frontalmente o governo na semana passada, com a divulgação de denúncias vindas de executivos da JBS. A oposição alega que não há clima político para discutir temas dessa complexidade.
Também no plenário, o senador Humberto Costa (PT-PE) pediu que o presidente do Senado convocasse uma reunião de líderes. "Não creio que o melhor caminho, antes da solução da crise, seja fazer a votação dessas reformas", afirmou, dizendo que o Congresso vive uma "situação sui generis".
"Vocês não vão tirar direitos dos trabalhadores na mão grande, não", reagiu Gleisi Hoffmann (PT-PR). "O que temos de fazer aqui é ter espírito público e antecipar as eleições de 2018."
Entre os pontos em que Ferraço sugeriu vetos presidenciais, estão a regulamentação do trabalho intermitente e a possibilidade de acordos individuais fixarem jornada de 12 por 36 horas. Além disso, está o dispositivo que permite a gestantes e lactantes trabalharem em locais insalubres e o item que acabava com descanso de 15 minutos para as mulheres antes de iniciar um período de horas extras.
Confusão
Enquanto o clima esquentava, Ferraço foi aconselhado pelo líder do governo no Congresso, Romero Jucá (PMDB-RR), a deixar a sala e aguardar numa sala em anexo à CAE, enquanto outros governistas tentavam apaziguar a confusão. Mas oposicionistas insistiram que iriam obstruir a votação. Jucá, por sua vez, tenta recorrer aos aliados pela continuidade dos trabalhos.
“Daqui a pouco vão queimar pneus aqui dentro”, reclamou Jucá para os jornalistas, ao falar sobre a tensão que impera na Casa.
"Argumentem da forma que quiserem, deem as desculpas que quiserem. O que eles desejam, que é validar essa reforma diante de um ambiente de instabilidade desse presidente ilegítimo, não vai acontecer dessa forma. Até ser formalizado o pedido de impeachment do senhor Michel Temer, os trabalhos ficarão obstruídos”, provocou Lindbergh Farias (PT-RJ).
O ponto forte do embate foi a briga entre os senadores Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e Ataídes Oliveira (PSDB-TO), que só não se esmurraram porque foram impedidos por colegas. “Bandido”. “Bandido é você, moleque” – esse foi o "diálogo" observado entre os dois.
Fator Renan
Numa cena que surpreendeu, o líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (AL), que já tinha se manifestado há meses contra as reformas, mas vinha abordando a crise política de forma discreta, manifestou-se ao lado dos oposicionistas de forma contundente. Renan afirmou que considera “inadmissível um governo que possui tamanha rejeição fazer uma reforma com características tão unilaterais”. Acrescentou que a atual proposta foi feita, a seu ver, “para os empresários e não para os brasileiros”.
Renan também criticou o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. Disse que Meirelles passou para o mercado a impressão de que, mesmo com a saída de Temer, as reformas teriam tramitação continuada no Congresso. “Esse ministro deveria ter sido demitido por isso, se fosse eu o presidente. Foi uma declaração que passou do ponto”, ressaltou. Apesar disso, o senador destacou ser contrário ao impeachment de Temer por achar que será “mais um desgaste para o país”. Ele defendeu a busca por “uma solução constitucional” para a crise política.
Lindbergh, Grazziotin e Hoffmann argumentaram que, apesar de terem sido vencidos na apreciação de um requerimento que pediu o adiamento da votação do relatório de Ferraço, consideram necessário que a comissão vote todos os outros requerimentos protocolados na mesa, com o mesmo propósito. Isso porque, de acordo com eles, cada um menciona motivos diferentes.
Gleisi lembrou a importância de serem respeitadas regras regimentais e Farias disse que não foi honesto o relator da matéria, depois de ter anunciado na última semana a suspensão dos trabalhos, resolver apresentar o relatório sem ter conversado com os líderes. “Não é assim que se trabalha neste Congresso. Exigimos respeito”, reclamou.
*Com informações da Rede Brasil Atual
Edição: Camila Rodrigues da Silva