A 4ª Vara da Fazenda Pública determinou, nesta sexta-feira (30), que o prefeito de Curitiba se manifeste sobre a demolição do museu Erbo Stenzel, patrimônio histórico da cidade. Contados a partir da abertura do processo, Rafael Greca (PMN) deve apresentar em até 15 dias úteis as justificativas para ter demolido a casa sem qualquer estudo prévio e sem autorização.
A sentença é fruto de uma ação civil pública protocolada pelo Sindicato dos Arquitetos e Urbanistas no Estado do Paraná (SindARQPR) e representada pelo escritório Bentivenha Advocacia Social, que recebeu da justiça a concessão do pedido exatamente nos moldes solicitados. Além de reconhecer a legitimidade do sindicato para contestar a postura de Greca, o Juiz considerou legal e justa a solicitação processual.
Entenda o caso
Na última quarta-feira (28), o SindARQPR e o Bentivenha Advocacia Social protocolaram uma ação civil pública com o objetivo de responsabilizar Greca por crimes contra o patrimônio histórico e cultural da cidade. Em 14 de junho, a prefeitura optou pela demolição da Casa Erbo Stenzel, no parque São Lourenço, um dia após o incêndio que danificou parte da estrutura, em que também funcionava um museu.
“A decisão demonstra a relevância do tema e simboliza um marco para repensar as decisões da prefeitura, que menospreza os interesses da comunidade”, avalia o advogado Ramon Bentivenha, um dos proponentes.
De acordo com o presidente do Sindicato, Milton Gonçalves, qualquer construção que se enquadre na categoria de Unidade de Interesse de Preservação (UIP) é protegida pela lei municipal n° 14.794/2016. “Até mesmo um pedido de pintura dessas propriedades deve passar por um trâmite burocrático e ser avaliada pelo Conselho do Patrimônio”, explica Gonçalves. A casa, porém, “foi completamente demolida, aparentemente, SEM qualquer estudo prévio, um projeto que buscasse viabilizar medidas menos gravosas ao patrimônio artístico e histórico da cidade […]. A decisão foi tomada diretamente pelo prefeito em conjunto com sua equipe SEM as autorizações necessárias”, informam trechos da ação.
“Nosso objetivo é que o prefeito explique o porquê da demolição e responsabilizá-lo pela atitude, que fere uma lei municipal. Enquanto obriga todos a cumprirem com as normas, a prefeitura deveria ser exemplo no cumprimento da legislação”, assinala Gonçalves.
Danos ao patrimônio
Segundo o presidente do SindARQPR, a demolição é “um grave problema” porque, com relação a patrimônio, não existe uma segunda chance. “Estruturas como essa nos ajudam a compreender e preservar a memória de onde viemos. A prefeitura rasgou um pedaço da nossa história”, explica o arquiteto. Ele a compara ao consulado de Paris, cuja fachada é preservada há 1500 anos – três vezes a idade do Brasil sob o ponto de vista da colonização. “Uma atuação política séria resguarda a importância dessas estruturas. Aqui, é inadmissível que passemos o trator no primeiro incidente”, diz.
O incêndio destruiu parte da casa, mas para o sindicato, a melhor alternativa teria sido reconstruir os espaços danificados e manter a estrutura original. Agora, uma reconstrução só é capaz de dar conta de uma réplica – que também deve seguir recomendações legais. Mesmo os escombros que restaram devem ser mantidos em local adequado para servirem de referência futura.
Gonçalves afirma que, guardadas as proporções, é como se um copo d’água fosse despejado na Mona Lisa, de Da Vinci, e optassem por destruir o quadro por esse motivo. “Não se pode jogar fora o que sobrou e imprimir uma cópia para substituí-la. A peça original tem um papel histórico”, destaca.
Segundo o SindARQPR, a melhor alternativa teria sido a reforma da casa / Foto: Lucilia Guimarães/FCC
Casa histórica
A construção demolida, de 1928, foi a morada do escultor paranaense Erbo Stenzel, grande artista paranaense. Ele também é autor de obras como o Homem Nu, a deusa da justiça (ou Mulher Nua), no bairro Centro Cívico.
Era um ponto de referência para artistas locais e serviu de ateliê para o pintor Guido Viaro, Theodoro de Bona e outros.
“Não tivemos acesso aos escombros e não sabemos se é possível fazer um restauro parcial ou uma réplica da casa. A primeira etapa é ter acesso a todas essas informações pra que, em posse disso, possamos sugerir qual a melhor solução para recuperar esse patrimônio perdido”, conclui Gonçalves.
Resposta da prefeitura
A redação consultou a prefeitura para saber seu posicionamento sobre a ação e os motivos que conduziram à decisão de demolir a casa. Até o fechamento desta matéria não houve resposta, mas Greca afirmou em seu perfil pessoal no Facebook que pretende reconstruir a estrutura. "Vamos recuperá-la com uso adequado no ano que vem", garantiu.
Edição: Brasil de Fato PR