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Juristas apontam casuísmo em decisão acertada em devolver mandato a Aécio

No passado recente, mesmo entendimento não foi aplicado em casos similares

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Minsitro Marco Aurélio restaurou mandato de Aécio Neves (PSDB) no Senado
Minsitro Marco Aurélio restaurou mandato de Aécio Neves (PSDB) no Senado - Nelson Jr./SCO/STF

O ministro do Supremo Tribunal Federa (STF) Marco Aurélio, em decisão monocrática nesta sexta-feira (30), reconsiderou a decisão do ministro Edson Fachin após redistribuição do processo e restabeleceu o mandato de senador de Aécio Neves (PSDB-MG), o qual foi afastado ante o pedido da Procuradoria Geral da República, que alegou a necessidade da medida após ele ter sido gravado solicitando R$ 2 milhões ao Deputado Rocha Loures (PMDB-PR). Para Marco Aurélio, no entanto, a medida depende de análise do próprio Senado. Leia a decisão na íntegra.

A decisão causou revolta nas redes sociais, uma vez que para muitos usuários a situação de Aécio era flagrante e justificava o afastamento. No entanto, o doutor em Direito Constitucional e professor universitário Paulo Iotti explicou por qual razão concorda com a decisão de Marco Aurélio: “Em tese, decisão correta. O pedido de prisão é manifestamente incabível, por ausente flagrante e crime inafiançável, requisitos constitucionais. E a competência para afastamento seria do Conselho de Ética do Senado”.

Iotti afirma que a lógica da Constituição foi proteger os parlamentares, principalmente por ser uma constituinte vinda de anos de chumbo que sufocaram o Legislativo. Logo, não cabe a suspensão de mandato pelo Judiciário, atropelando as atribuições do Congresso. “Vale dizer que a Constituição claramente quis ser bem garantista com parlamentares, de só restringir seus direitos nos casos constitucionalmente expressos. Afastamento cautelar não está proibido textualmente, mas vai contra toda a lógica garantista da Constituição quanto a parlamentares. Por isso, é estranha uma hermenêutica que entenda como possível o Judiciário ir além do texto constitucional tão protecionista a parlamentares, para suspender mandato sem previsão constitucional a tanto”.

O detalhe que despertou a revolta nas redes sociais é o casuísmo da decisão, isto é, o pau que bate em Chico não bater em Francisco. Delcídio do Amaral, na época líder do PT no Senado e Eduardo Cunha, cacique do PMDB que esteve em maus lençóis após o impeachment, não contaram com a mesma interpretação do Supremo. Lula, por exemplo, teve seu mandato de ministro suspenso por Gilmar Mendes e o caso jamais foi remetido para o plenário. Enfim, são vários exemplos de políticos que não tiveram para si o mesmo garantido deferido a Aécio Neves, o qual não só contou com interpretação diferente, como também com uma urgência na decisão que não é aplicada a questões maiores, como, por exemplo, o julgamento da anulação do impeachment de Dilma Rousseff. “O problema é o casuísmo, desse garantismo todo vir, coincidentemente, a um tucano, depois de tanto punitivismo com petistas e aliados destes”, apontou Iotti.

O professor de Direito Constitucional da PUC/SP Pedro Estevam Serrano também apontou casuísmo na decisão do Supremo. “A decisão me parece correta e adequada a Constituição. O que causa desconforto, numa perspectiva panôramica das medidas penais contra políticos, é uma aparente seletividade na aplicação da Constituição e seus direitos, são aplicados para uns e não para outros”, afirmou.

Para ele, a série de casuísmo é “uma patologia que se apresenta no sistema de justiça penal, que, se não corrigida, aprofundará a ferida politico-institucional que vem desde o impeachment inconstitucional de Dilma”.

Nas redes sociais, o professor da Universidade Federal do Rio Grande (Furg) Salah H. Khaled Jr. resumiu a questão: “São tempos muito estranhos. As decisões parecem ditadas pelo sabor dos ventos, pelo humor dos ministros, conforme a posição dos astros ou seja lá o que for. Seguimos rasgando a ordem constitucional. Se o ritmo for mantido, logo a ferida se tornará grande o suficiente para engolir a todos nós”.

Edição: Justificando