O presidente da Confederação Nacional dos Metalúrgicos (CNM-CUT), Paulo Cayres, concedeu entrevista ao Brasil de Fato sobre os impactos econômicos da operação Lava Jato para o setor.
Com base em dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) e no número de prisões divulgado pelo Ministério Público Federal (MPF), Cayres afirma que “a conta não fecha”: a cada preso pela operação Lava Jato, são milhares de desempregados.
Ou seja, quem é acusado de corrupção são os altos executivos, mas quem paga a conta são os operários.
Confira a entrevista completa:
Brasil de Fato - A operação Lava Jato trabalha com a possibilidade de ressarcir os cofres públicos em R$ 38,1 bilhões, incluídas as multas. Considerados os prejuízos ao setor metalúrgico, você considera que a combate à corrupção, nesses moldes, vale a pena?
Paulo Cayres - A conta não fecha. E, em primeiro lugar, não fecha moralmente, no que diz respeito ao combate à corrupção. Porque a Lava Jato seletivizou: escolheu um partido para atacar, apontou seu canhão para uma presidenta legitimamente eleita e retirou essa presidenta. Nós sempre apontamos isso. Eu não concordo com os métodos, com armadilhas, mas quero ver os corruptos presos.
Em segundo lugar, o reflexo da Lava Jato para os nossos empregos foi trágico.
A Lava Jato destruiu as empresas nacionais. Qual o sentido de recuperar R$ 38,1 bilhões e quebrar toda uma indústria, que representava para nosso Produto Interno Bruto (PIB) cifras na casa dos trilhões. A indústria de transformação hoje já está abaixo de dois dígitos, já está em 8% do PIB.
A operação prendeu, com provas ou sem provas, muita gente. E o cálculo é simples: cada prisão da Lava Jato significou 22 mil postos de trabalho a menos.
Você afirma que é contrário aos métodos da Lava Jato. O que poderia ser feito diferente, sem diminuir o rigor no combate à corrupção?
Quando eles identificam alguém, de determinada empresa, que está envolvido em corrupção, em vez de direcionarem a punição à pessoa física e pedir a devolução do dinheiro, eles fecharam a indústria toda. Então, a Petrobras ficou impedida de contratar, e a indústria nacional foi destruída.
Nada me tira da cabeça que isso foi feito para beneficiar outros países, que não vão permitir que nós sejamos independentes, em termos de energia. E é o que aconteceria, com o advento do pré-sal.
A ideia de conteúdo nacional foi colocada pelos governos PT para preservar os empregos no Brasil. Foi provado, nos últimos anos, que nós temos qualidade, capacidade, mão de obra pronta para desenvolver o setor naval e, inclusive, exportar o nosso know-how.
O setor naval saiu de 10 mil empregos para 90 mil, somente porque construiu-se uma política semi-industrial, focada na geração de emprego interno e na valorização das empresas nacionais.
Os prejuízos aos metalúrgicos decorrem principalmente da destruição da indústria naval?
Sim. O Porto de Rio Grande, no Rio Grande do Sul, está falido. O polo de Niterói, no Rio de Janeiro, está quebrado. Várias obras que já estavam quase finalizadas, que iriam gerar riqueza, foram suspensas.
Em Niterói, tem um navio chamado “Irmã Dulce” que faltava 5% para terminar. Estava em 95%! Além disso, cancelaram quase todas as obras encomendadas, e os nossos trabalhadores não puderam realizar esse serviço e foram demitidos.
E o desemprego se espalha pela cadeia. Por isso temos mais de 14 milhões de desempregados.
Se são mais de dois milhões de desempregados na indústria, somente em função da Lava Jato, isso contamina vários setores. Comércio, serviços, setor hoteleiro, tudo vai derretendo.
Qual o perfil dos trabalhadores demitidos no setor metalúrgico?
O salário de alguns profissionais dos portos, que são soldadores, de alta capacitação técnica, são acima da média, na faixa dos R$ 3.000,00.
Nem todos os estados com polos navais detinham uma mão de obra especializada. Então, receberam trabalhadores mais experientes de outras regiões, de polos navais mais estruturados, como Rio de Janeiro e Bahia. E tem também a mão de obra local, recém formada, recém capacitada. E milhares deles foram demitidos: tanto da mão de obra local, quanto dos migrantes.
No caso dos migrantes, a perda do emprego desconstrói a vida do trabalhador. Aí, ele precisa voltar para a cidade de origem, normalmente com pouco dinheiro, e sem ter o que fazer.
As cidades também são muito impactadas. Elas têm um crescimento rápido, com o polo naval, e isso começa a gerar problemas sociais. Só que esses problemas eram corrigidos com uma grande arrecadação. Era o caso de Rio Grande e Ipojuca, em Pernambuco, por exemplo. Com o desmonte da indústria nacional, acabou a arrecadação, mas os problemas continuam. E isso é trágico.
Muitas das empresas que quebraram em função da Lava Jato entraram com pedido de recuperação judicial. Nesses casos, os trabalhadores demitidos conseguem receber os direitos referentes à rescisão de contrato?
Nem sempre. No caso do estaleiro Mauá, no Rio de Janeiro, por exemplo, os trabalhadores demitidos sequer tinham o direito de receber a rescisão. Para mim, a maior corrupção que existe é deixar um pai de família sem condições de sustentar seus filhos. E é o que esses executivos estão fazendo, e isso passa despercebido no debate da corrupção.
O saldo, para os trabalhadores, não foi positivo nessa operação. Repito: cada prisão custa 22 mil empregos. Se continuar nesse ritmo, vão fechar todas as nossas indústrias.
Você enxerga no Poder Judiciário algum tipo de preocupação com os impactos econômicos da Lava Jato? Os juízes e procuradores estão abertos a ouvir as demandas do setor industrial e se mostram dispostos a minimizar o impacto econômico da operação?
Grande parte da Justiça já mostrou que é seletiva, partidarizada. Com eles, é difícil ter qualquer tipo de diálogo. Eles não estão nem um pouco preocupados com a indústria. Eles agora querem fazer acordos de leniência pensando nos bancos, porque o setor bancário também está envolvido nessa lama.
O que nós queremos é limpar essa lama, mas sem destruir o parque industrial. Quem tem culpa são as pessoas físicas! O mais grave é que, nas delações premiadas, o que está se mostrando é que o crime compensa.
Edição: Ednubia Ghisi