Conjuntura

Amparado na maioria da população, Maduro mantém eleição para Constituinte

Sob pressões, votação dos representantes está prevista para acontecer no próximo domingo (30)

Brasil de Fato | Caracas (Venezuela) |

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"Ponto Soberano", onde ocorreu plesbicisto informal neste domingo (16), no setor de Savana Grande, em Caracas
"Ponto Soberano", onde ocorreu plesbicisto informal neste domingo (16), no setor de Savana Grande, em Caracas - Camila Rodrigues da Silva

A Venezuela está a oito dias das eleições para a Assembleia Constituinte e viveu uma semana de pressão por parte de todos os setores da oposição. No entanto, nas ruas de Caracas é perceptível que ainda há uma maioria que apoia o processo convocado pelos chavistas e que está disposta a apoiar a continuidade do projeto bolivariano.

Além do apoio popular, o governo venezuelano também encontra amparo em instituições estatais. Na quarta-feira (19), o ministro da Defesa, o general Vladimir Padrino López, afirmou que as Forças Armadas irão se somar aos esforços de garantir que a votação que ocorre no domingo (30) ocorram de forma pacífica. 

Acompanhada pelo alto comando militar do país, López reconheceu o "caráter legítimo" da convocação de uma Assembleia Constituinte: "Soldados estarão a postos no 30 de julho em todo o país, para garantir o pleno exercício do direito de voto por todos os venezuelanos".

Histórico

As tensões entre governo e oposição se manifestaram de forma clara no último domingo (16), quando aconteceu um plebiscito informal convocado pela oposição e considerado ilegal pelas autoridades eleitorais e constitucionais do país. Ao mesmo tempo, e menos divulgado no Brasil, acontecia a simulação da Constituinte, que visava explicar aos cidadãos como o processo vai funcionar.

Ainda no final do dia, começou uma nova disputa narrativa. A oposição afirmou que 7,2 milhões de pessoas teriam participado do plebiscito e não queriam mais o governo do presidente Nicolás Maduro, do Partido Socialista Unido da Venezuela. Enquanto isso, já na segunda-feira (17), uma das lideranças juvenis venezuelanas, Hector Rodriguez, divulgou dado extraoficial de que 11 milhões participaram da simulação.

Além de ser considerado ilegal, o plebiscito não foi auditado. A deputada da oposição Tamara Adrián, a primeira transsexual eleita para a Assembleia Nacional, explicou à reportagem como funcionou o processo enquanto estava na mesa de votação do setor de Savana Grande, em Caracas, confirmando a informação de que as cédulas utilizadas foram incineradas:

"Os votos serão contados em cada uma das mesas. As caixas são abertas às quatro da tarde, ou quando o ato terminar. A partir daí, haverá um escrutínio em cada caixa, e todo o material é destruído nesse momento, e o resultado é transmitido para o centro de totalização que foi estabelecido para esse evento". Em paralelo, vídeos que circulam na internet e nas redes sociais apontavam que a falta de controle sobre o procedimento abria a possibilidade de que o mesmo cidadão votasse mais de uma vez. 

Enquanto isso, a simulação da Constituinte foi acompanhada pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE), órgão independente que audita todos os processos eleitorais do país. A instituição não se pronunciou até o início da sexta-feira (21) sobre nenhum dos dois processos eleitorais.

Certos da fraqueza do plebiscito, ataques nacionais e internacionais recomeçaram na segunda-feira seguinte às votações.  

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ameaçou impor mais sanções à Venezuela se Maduro insistir em promover a Assembleia Constituinte. O chanceler venezuelano, Samuel Moncada, respondeu imediatamente à ameaça, afirmando que seu país terá que fazer uma "revisão profunda" da relação com o governo americano.

O general López, na mesma declaração em apoio à Constituinte, rechaçou a "ingerência grosseira" nos assuntos internos venezuelanos. O militar afirmou que as declarações de Trump atacam a "independência nacional", e que o republicano ousou "ameaçar de modo vil e desmesurado o povo venezuelano".

Na terça-feira (18), começaram novamente atos violentos no leste de Caracas. O município de Chacao foi o mais afetado pelos chamados "guarimbeiros", que causam confusão e feridos com o uso de bombas e explosivos.

No mesmo dia, a Mesa de Unidade Democrática, a articulação da oposição, divulgou um agenda de ações contra o governo de Maduro, que incluía uma greve geral de 24 horas na quinta e a instauração de um "poder paralelo", ainda sem explicações mais claras.

Na quinta-feira (20), o comércio, o metrô e os ônibus ficaram fechados por conta de protestos da direita na região leste da cidade, enquanto a vida seguiu normalmente do lado oeste. Em dias de protestos da oposição, fica clara que a divisão política também é geográfica.

Maduro reforça diariamente que a Constituinte é um processo de paz. Chavistas como a trabalhadora do serviço penitenciário Noemi Mosqueda concordam:

"O presidente é um homem de paz. Chamou o pessoal da oposição para se sentar à mesa, e vieram lideranças internacionais para sentar-se à mesa, mas a oposição não quer fazer um acordo. Não quer fazer nada. Simplesmente, querem que ele saia. E isso se chama golpe de estado", diz.

Na sexta-feira (22), o Mercosul engrossou o coro para que Maduro desista das eleições do dia 30. A pressão internacional continua, e a data da Constituinte também

Edição: Rafael Tatemoto | Mauro Ramos