"Nós não estamos mais falando só sobre passado. É verdade que falar sobre a gente é sempre falar também sobre o passado, sobre o sistema de opressão que nos trouxe pro Brasil, que tem toda a nossa ancestralidade, mas agora queremos olhar também pra frente”, diz a socióloga Taís Machado, mandando o recado do que significa o encontro das cerca de 300 mulheres negras que estão reunidas em Brasília, na 10ª edição do Festival Latinidades.
Aberto oficialmente nesta quinta-feira (27) e já consagrado no calendário cultural da cidade, o evento segue até o próximo domingo (30) e discute o tema “Horizontes de liberdade: afrofuturismo nas asas de Sankofa”. Um debate sobre perspectivas e sonhos que podem ser tecidos independentemente das dificuldades que se anunciam na contemporaneidade.
“O cenário atual é devastador, a conjuntura política está muito difícil, mas a ideia é a gente não se pautar somente pelas possibilidades do presente. É importante resgatar nossas utopias, construir outras e lembrar quais são os nossos muitos horizontes de liberdade”, explica Bruna Pereira, uma das organizadoras do evento.
Segundo ela, o festival não só oportuniza a realização de diversas atividades de interesse das mulheres negras como também se constitui como vitrine da produção delas.
“Dentro do contexto capitalista, as mulheres negras muitas vezes são invisibilizadas, e nós somos sempre vistas nos lugares de vítimas ou simplesmente como seres não criativos, como se a gente não produzisse nada para a sociedade. A gente se contrapõe a essa ideia, trazendo uma variedade de coisas produzidas por nós”, acrescenta.
União
Considerado o maior festival de mulheres negras da América Latina, o “Latinidades” é um espaço de fortalecimento do feminismo negro e da sororidade entre as militantes de diversos lugares.
“Durante muito tempo, algumas das mulheres negras não sabiam que eram negras, e esse é o meu caso. A gente se descobre como negras e como irmãs, e aqui eu tenho a oportunidade de descobrir novas irmãs”, diz a militante Flávia Ribeiro, que veio de Belém (PA).
Atuante no Centro de Estudo e Defesa do Negro do Pará, ela destaca ainda a importância de dar visibilidade às pautas das mulheres da Amazônia. “Tem muita coisa que se diferencia porque a nossa construção se dá na base da nossa vivência em cada região. Nós, por exemplo, temos forte marca indígena, temos muitas negras de cabelo liso, muita mistura, afinal, são tradições, culturas, geografias e climas diferentes”, pontua.
A militante acrescenta que as distinções não se sobrepõem ao sentimento de solidariedade que deve ser cultivado entre as mulheres. “Estou aqui pra dizer que existo, que também sou afrolatina, sou feminista negra, e vim dizer que a Amazônia também tem mulher negra”, finaliza.
Concepção
O período em que acontece o festival é uma referência ao Dia da Mulher Afro-Latino-Americana e Caribenha, celebrado na última terça-feira (25). Ao longo dos dez anos de realização, o “Latinidades” já recebeu um público de mais de 200 mil pessoas, além de cerca de 100 artistas, entre atrações nacionais e internacionais.
Programação
As atividades são de acesso gratuito e se dividem entre rodas de conversa, oficinas, seminários, exibição de vídeos, lançamento de livro e atrações culturais.
O evento ocorre no Museu Nacional da República e disponibiliza a programação completa em sua página oficial no Facebook.
Edição: Camila Rodrigues da Silva