Pela primeira vez em 27 anos, o Conselho Nacional de Saúde (CNS) reprovou as contas do Ministério da Saúde, chefiado pelo ministro Ricardo Barros, relativas a 2016. Segundo os conselheiros, a gestão do presidente Michel Temer não cumpriu a aplicação mínima de 15% das receitas orçamentárias em ações e serviços públicos da saúde, como determina a Constituição. Além deste, outros problemas foram apontados em um parecer pela Comissão de Orçamento e Financiamento (Cofin) do CNS. “Essa é a mais clara demonstração do desmonte que estamos vivendo no Sistema Único de Saúde (SUS)”, afirmou o presidente do Conselho, Ronald Ferreira dos Santos.
Analisando o Relatório Anual de Gestão (RAG) 2016 do Ministério da Saúde, o CNS concluiu que o valor empenhado no ano passado em ações e serviços públicos de saúde foi de R$ 106,2 bilhões, correspondente a 14,96% do total da Receita Corrente Líquida (RCL) do ano, que chegou a R$ 709,9 bilhões. No total, foram R$ 253 milhões a menos na saúde pública em nível nacional. “O conselho atua em defesa do SUS. Essa atitude do governo Temer está em linha com a destruição do sistema de saúde, encaminhada, sobretudo, com a aprovação da Emenda Constitucional 95, que impõe um teto de gastos para o governo”, disse Santos.
Além disso, o Ministério da Saúde não compensou integralmente os restos a pagar cancelados em 2015, como determina a Lei Complementar 141, de 2012. Dos R$ 922 milhões devidos, o governo Temer pagou R$ 483 milhões, o que amplia o total da insuficiência de verbas ao SUS para R$ 692 milhões. Todo este montante diz respeito apenas ao mínimo que o governo deve aplicar em saúde anualmente, desconsiderados os investimentos em novos equipamentos ou serviços.
Se comparados aos últimos dois anos, considerando o aumento da população brasileira e a atualização monetária, o gasto por pessoa do governo federal em saúde vem caindo. Em 2015, o Ministério da Saúde empenhou R$ 520,03. Já em 2016, foram R$ 515. Essa situação deve ser agravada com a aplicação efetiva do teto de gastos, que determina o reajuste do orçamento apenas pela inflação, a partir de 2018.
O Conselho destacou ainda que, em novembro de 2016, recomendou ao Ministério a liberação de verbas contingenciadas, sob risco de afetar o atendimento à população. “(Recomenda) Que os valores do orçamento do Ministério da Saúde que estão contingenciados sejam imediatamente liberados para empenhamento em ações e serviços públicos de saúde para garantir a prestação de serviços à população, especialmente para as transferências fundo a fundo para Estados e Municípios”, diz o item 1 da Recomendação 015/2016. Outras recomendações do CNS também não foram atendidas.
Também foram determinantes para reprovação das contas do Ministério da Saúde, a inexistência de critérios para a escolha das despesas que deixariam de ser realizadas ou que foram executadas parcialmente, em razão do contingenciamento e a queda real dos valores das transferências fundo a fundo para estados, distrito federal e municípios. Segundo o Conselho, a partir da atualização monetária, a transferência em 2016 foi 5,33% menor que em 2014. Na prática significa que as cidades receberam menos dinheiro para a rede de saúde.
O relatório do CNS sobre as contas é encaminhado ao próprio Ministério da Saúde, que depois responde ao conselho. Depois disso, os conselheiros pretendem encaminhar o documento à Câmara dos Deputados e ao Ministério Público Federal. O CNS foi criado em 1937, como órgão consultivo. Em 1990 passou a ser deliberativo, com poderes para fiscalizar as contas da pasta e garantia de participação da sociedade – que detém 50% dos assentos –, dos trabalhadores, dos empresários e do próprio governo.
Por meio de nota, o Ministério da Saúde defendeu que cumpriu a aplicação mínima constitucional, com base na receita corrente líquida, em ações e serviços públicos de saúde. “De acordo com o Relatório Resumido de Execução Orçamentária, em 2016 o montante empenhado pela União foi de R$ 106,2 bilhões. O valor corresponde a 14,7% da receita federal e supera, em termos nominais, em cerca de R$ 10,9 bilhões o mínimo de R$ 95,4 bilhões, quando calculado com base no parâmetro de 13,2% da RCL, definido pela Emenda 86/2015 e aplicável a 2016.
Segundo o Tribunal de Contas da União (TCU), a União cumpriu em 2016 as determinações constitucionais e legais de aplicação do recurso mínimo no custeio de ações e serviços públicos de saúde (Acórdão nº 1320/2017).
A pasta informa, ainda, que com a aprovação no Congresso Nacional da Emenda à Constituição nº 95, o Governo Federal ampliou o gasto mínimo para a saúde em 2017. A EC 86 previa, em 2017, gasto mínimo com ações e serviços de saúde de 13,7% da Receita Corrente Líquida da União, chegando a 15% em 2020. Com a EC 95, esse percentual sobe para 15% já em 2017. Em 2017, sem a EC 95, o piso seria de R$ 105,3 bilhões e com a aprovação do texto o piso e o gasto total subiram para R$ 115,3 bilhões na Lei Orçamentária Anual aprovada pelo Congresso. Ou seja, mais R$ 10 bilhões para a saúde em 2017”, diz a nota.
Edição: RBA