Censura

Juiz de Alagoas sofre represálias por participar de debates sobre a Lava Jato

Apesar da decisão publicada em Diário Oficial ontem, Marcelo Tadeu Lemos confirmou presença no evento em Curitiba

Brasil de fato | Curitiba (PR) |
Juiz alega que não se pode considerar a participação em um debate como uma atividade partidária
Juiz alega que não se pode considerar a participação em um debate como uma atividade partidária - Divulgação TJ-AL

A Corregedoria Geral de Justiça do Estado de Alagoas abriu uma sindicância para apurar a presença do juiz Marcelo Tadeu Lemos em uma aula pública sobre a operação Lava Jato no último dia 10 de maio, em Curitiba. A decisão, publicada ontem no Diário Oficial do Tribunal de Justiça de Alagoas (TJAL), é interpretada pelo magistrado como uma tentativa de evitar que ele participe de um novo debate público sobre a operação em Curitiba, no dia 11 de agosto. O evento “Tribunal Popular: Julgamento da Lava Jato” será uma espécie de julgamento simbólico das ações do Judiciário, e Marcelo Tadeu Lemos aceitou o convite para participar daquele espaço de debate como juiz-presidente.

O desembargador e corregedor-geral Paulo Barros da Silva Lima, que abriu a sindicância, alega que foi informado da participação do juiz em um “ato público a favor do ex-presidente Luis [sic] Inácio Lula da Silva, quando este prestou depoimento como réu em processo criminal em curso na Justiça Federal”.

A publicação em Diário Oficial também menciona que a participação no Tribunal Popular da Lava Jato “pode configurar, em tese, infração ao dever do magistrado de contribuir para uma fundada confiança dos cidadãos na judicatura e ao dever de dignificar a função, (...) bem como pode caracterizar a prática de conduta vedada ao magistrado consistente em manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento”.

Outro lado

Marcelo Tadeu Lemos afirma que deve ser intimado em breve para prestar depoimento sobre sua participação na aula pública do dia 10 de maio. O juiz admite que, naquele dia, circulou na internet uma foto em que ele aparece junto ao deputado Paulão (PT/AL), ao jurista Marcelo Lavenère e ao sociólogo Emir Sader. A fotografia foi batida nos arredores da praça Santos Andrade, no centro de Curitiba, onde o ex-presidente Lula participou de um comício, próximo ao hotel onde ele estava hospedado, e pode ter levado a uma interpretação equivocada.

“Por que, tanto tempo depois, foi aberta essa sindicância?”, questiona o magistrado. “Eu entendo isso como uma forma de pressão para eu desistir de participar do Tribunal Popular. Mas eu recebi isso com tranquilidade. Quem não deve não teme”.

O juiz de Alagoas reconhece que abrir uma sindicância é atribuição do corregedor-geral, mas afirma que parece ter havido um julgamento precipitado dos acontecimentos. “Atividade política, a gente pode fazer. Atividade partidária, não. Se não, os juízes que saíram de verde e amarelo, em apoio à Lava Jato e contra o PT, também não poderiam estar nas ruas”, compara. “No caso da Lava Jato, não se trata de uma questão partidária. É uma questão jurídico-política, que atinge todos os brasileiros. Afinal, a operação entra na nossa casa há três anos, sem pedir licença, e sem nenhum tipo de crítica. Não podemos aceitar a ditadura do Judiciário”, finaliza.

A represália sofrida por Marcelo Tadeu Lemos é apenas um exemplo das várias pressões que a organização do evento tem sofrido nos últimos dias. Ataques, ofensas e ameaças em redes sociais sintetizam a visão unilateral que permeia as coberturas jornalísticas sobre a operação.

Defensor do movimento “Escola Sem Partido” e conhecido por censurar manifestações contra o golpe em 2016, o procurador Ailton Benedito, do MPF de Goiânia, chegou a afirmar em entrevista que a criação de um Tribunal Popular da Lava Jato configura um crime.

Segundo a organização do evento, ao simular um tribunal, a proposta é justamente combater a intolerância política, apresentando visões divergentes sobre o caso e qualificando a crítica aos métodos.

Este material faz parte da cobertura especial da operação Lava Jato. Clique aqui para ter acesso a outras reportagens sobre o tema.

Edição: Ednubia Ghisi