O segundo depoimento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao juiz Sergio Moro, na tarde desta quarta-feira (13), em Curitiba, seguiu o roteiro esperado, de acordo com os propósitos da Operação Lava Jato. “Aquilo é o script que o Moro está seguindo, o mesmo que a gente já viu na primeira oportunidade: conduzir o depoimento para os objetivos previamente traçados”, diz o ex-ministro da Justiça Eugênio Aragão. “A gente sabe qual o resultado que vai ser dado pelo Moro. Não há dúvida de que ele condena, não precisa ter fatos e provas. Basta a convicção dele.”
O deputado federal Wadih Damous (PT-RJ) também usa o termo que remete ao texto de sequência de diálogos de filme ou peça de teatro. “Em se tratando de Sérgio Moro, é óbvio que o script é sempre o da condenação, pouco importa o que Lula diga ou o que a defesa fale”, afirma. Em julho, o juiz condenou Lula a nove anos e seis meses de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. “Moro se submete a rituais previstos no Código de Processo Penal. Que o réu seja ouvido, mas não passa de ritual, apenas para dizer que está cumprindo o que a lei manda. Ele não atua como juiz. No caso da Lava Jato, não há distinção entre juiz e acusação. Moro é juiz e acusador. E é policial também, instrutor do processo”, acrescenta o parlamentar, ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil do Rio de Janeiro (OAB-RJ).
Porém, para Damous, a performance de Lula foi melhor do que no primeiro depoimento. “Porque se mostrou senhor do que é esse outro processo, diante de um juiz que ficou com medo de mais uma vez jogar política com ele. Moro joga política, não é juiz. É um ator da política. Mas, dessa vez, Moro ficou no meio termo.”
Na opinião do deputado, possivelmente passou um pensamento pela cabeça do juiz de Curitiba. "Se eu for jogar política com esse cara (Lula), ele vai me massacrar de novo, como na primeira vez.” Só que, ao ficar no meio termo, Moro “acabou se perdendo”, diz Damous. “Lula estava seguro. Ele mesmo tomou a iniciativa de falar do Palocci, não foi instado pelo Moro a falar do Palocci. E deixou mais uma vez claro que é um processo político que não tem qualquer tipo de indício probatório que pudesse levá-lo à condenação.”
Já para Eugênio Aragão, o ex-presidente não estava tão sereno como no depoimento de 10 de maio. “Até com razão. Chega uma hora em que a paciência estoura, com a Justiça manipulada desse jeito. Mas acho que Lula se saiu bem. No geral, as perguntas foram bem respondidas. Ele soube inclusive chamar a atenção para impropriedades da conduta do próprio Moro."
O ex-ministro menciona o final do encontro entre o magistrado e o petista. "Lula se referiu à imparcialidade de Moro e das mentiras do Palocci, aproveitando para colocar sua posição." Ao final do depoimento, o ex-presidente perguntou ao magistrado: "Posso olhar na cara dos meus filhos e dizer que vim a Curitiba prestar depoimento a um juiz imparcial?" O juiz disse que "sim". "Porque não foi o procedimento na outra ação, doutor", retrucou Lula, o que claramente irritou o comandante da força-tarefa.
Aragão concorda com o advogado Cristiano Zanin Martins, que, no Twitter, protestou contra a utilização, pelo juiz, de "perguntas estranhas ao processo ou sobre papéis apócrifos que têm a autenticidade questionada pela defesa". "Moro fica inventando nexos de causalidade, de fatos que não têm causalidade nenhuma com aquilo que está instruindo", diz Aragão. "O que ele quer é forçar a barra. Definitivamente não é um juiz imparcial."
TRF-4
A apelação da defesa de Lula contra a condenação por Moro em julho, no processo referente ao tríplex do Guarujá, no litoral sul de São Paulo, será julgada pela 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (com sede em Porto Alegre). No início de agosto, o presidente daquela corte, desembargador Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, afirmou em entrevista que a sentença de Moro "é tecnicamente irrepreensível" e "histórica".
Wadih Damous protocolou uma representação contra Flores Lenz no Conselho Nacional de Justiça, argumentando que a postura do desembargador viola a Lei Orgânica da Magistratura. Ainda não há novidade sobre a representação.
"Uma pessoa falar uma coisa dessas sem ter lido os autos já mostra claramente o nível a que nossa Justiça chegou", diz Eugênio Aragão. "Juízes se acham no direito de falar a respeito de casos em andamento, sem conhecer os autos." Ao dar as declarações, o presidente do TRF-4 admitiu que não leu " a prova dos autos".
Edição: Rede Brasil Atual