Negritude

"Foi racismo", diz funcionário demitido pelo Metrô de São Paulo

Estatal paulista diz que funcionário cometeu "infração do código de ética com usuário"; sindicato pede reincorporação

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Ao centro, Valter Rocha, funcionário do Metrô de São Paulo
Ao centro, Valter Rocha, funcionário do Metrô de São Paulo - Reprodução

Valter Rocha é funcionário do metrô em São Paulo. Negro, de dreadlocks, ele teve a trajetória de 15 anos na empresa marcada por diversos episódios controversos envolvendo a questão racial. Nesta semana, na mais grave delas, Rocha foi desligado, acusado de agredir um usuário do metrô.

A acusação se fundamenta no seguinte episódio: um usuário tentou pagar a passagem, mas o metrô não tinha troco. Usando isso como desculpa, ele teria ofendido o funcionário Rocha e pulado a catraca. O usuário então foi abordado por dois policiais e o caso foi encerrado.

Mas esse não foi o último encontro com o mesmo usuário, como conta Valter: "Um mês depois, esse mesmo usuário passou pela minha estação e já passou por mim gesticulando e imitando um macaco e me chamou de macaco. Falou 'hei, macaco!'. Eu fiquei um tempo sem reação mas acabei indo atrás dele para abordar. Eu abordei ele perguntando o seguinte "o que que foi aquilo que você disse pra mim lá em cima? Você me chamou de macaco? E ele reafirmou que eu sou macaco e cuspiu em mim".

Valter conta que os dois tiveram uma discussão acalorada e, na estação seguinte, o usuário fez uma reclamação contra ele, dizendo ter sido agredido. Diante da situação, Valter sugeriu que eles fossem até uma delegacia para que ele fizesse a denúncia de injúria racial. O usuário, por fim, não formalizou a acusação no metrô.

De acordo com Valter, o Metrô não pediu nenhum esclarecimento a ele e, meses depois, usou essa denúncia de agressão para demitir o funcionário, evidenciando racismo: "A leitura que eu faço é a seguinte: a empresa se utilizou de um racista que me injuriou e cometeu um ato de racismo propriamente dito. Porque é uma instituição que me excluiu, que está me privando do meu salário, me constrangendo".

Essa não foi a primeira vez que Valter se sentiu agredido pela empresa. Em 2008, ele recebeu um pedido formal de superiores hierárquicos para que cortasse seus cabelos, como condição para continuar no emprego e, em um processo seletivo para uma promoção de cargo, fez três provas e, sendo reprovado constantemente, mesmo acertando 90% das questões. Em todas elas, conseguiu recorrer à decisão e ser promovido.  

Valter recorreu da decisão de sua demissão em um recurso interno administrativo para que seja reintegrado à equipe do Metrô.

Questionado pela reportagem, o Metrô de São Paulo afirmou que o funcionário foi desligado da empresa após "infringir o Código de Ética e o Regulamento Disciplinar da Companhia no trato com o usuário".

Em nota, a secretaria de Negras e Negros do Sindicato dos Metroviários de São Paulo ressalta o caráter racista da medida e pede apoio de outras entidades sindicais para exigir a imediata readmissão de Valter Rocha.

Veja o vídeo em que ele fala sobre o episódio e denuncia a situação dos trabalhadores do Metrô de SP:

Edição: Vanessa Martina Silva