Assistir a “Tentei”, sendo mulher, é como levar um soco que atinge a boca do psicológico. Com marcas sensíveis de realidade, o filme é fruto da construção coletiva de uma equipe encabeçada por mulheres e que conhece muito bem a denúncia despida por elas. Glória, personagem criada pela jornalista Laís Melo e vivida pela atriz Patricia Saravy, tenta confrontar uma relação abusiva. Seu marido a violenta cotidianamente. Mas o impasse final é que é doloroso: como milhares de mulheres, atadas pelas limitações que a sociedade nos coloca, Glória não consegue se libertar. É aí que a simbologia da identificação cria raízes, é quando a arte alcança o papel de desequilibrar nossas ilusões de aconchego num mundo profundamente desigual.
O filme foi um dos 12 selecionados entre 608 produções inscritas para compor a mostra competitiva do evento.
Laís é mineira, cresceu em Campo Mourão (PR) e se formou em Jornalismo, curso que acessou pelo Programa Universidade Para Todos (Prouni). Nesta semana, a jovem cineasta celebra o primeiro grande passo de sua carreira: o curta-metragem Tentei, que roteirizou e dirigiu, estreia no Festival de Brasília do Cinema Nacional - que começou no dia 15 e vai até dia 24 se setembro. O filme foi um dos 12 selecionados entre 608 produções inscritas para compor a mostra competitiva do evento.
Tentei – até não mais tentar
Ela viu o despertar de seu interesse por contar histórias de mulheres da classe trabalhadora quando trabalhou como repórter policial, em um jornal da região metropolitana de Curitiba. “Via histórias que se repetiam, que aconteceram comigo, com minha mãe, com amigas e com outras que nunca conheci pessoalmente”, diz a jornalista. Segundo pesquisa realizada pelo Instituto Avon, três em cada cinco mulheres jovens já sofreram violência em relacionamentos.
O contato e a paixão pelo cinema a estimulou a se encaixar por onde pôde, primeiro na direção de arte – papel atribuído a quem constrói os cenários e estéticas das cenas – e, enfim, finalmente como diretora, em Tentei. “Construir o filme entre mulheres fez com que o roteiro original se modificasse, num resultado muito rico e de caráter coletivo”, destaca.
Segundo pesquisa realizada pelo Instituto Avon, três em cada cinco mulheres jovens já sofreram violência em relacionamentos.
Laís Melo chegou a cursar um mês de lições sobre a sétima arte em uma universidade cubana. “No cinema, minha intenção desde esses lugares de privilégios que acesso, de mulher cis e branca e que tem conseguido fazer arte, apesar das tantas dificuldades, é criar espaços de escuta e voz às mulheres da classe trabalhadora, periféricas, negras, lésbicas, bissexuais, transexuais, do campo, indígenas... mas acima, criar estratégias de 'fazer com', repensando os modos de produção”, diz ela. Que os ventos feministas a protejam em tarefa tão urgente. A vitória de Laís simboliza um futuro de glórias – livres, escritoras, cineastas, protagonistas – a todas nós.
Exibição no Festival
20 de setembro | 21h | Cine Brasília
20 de setembro | 20h | Teatro da Praça (Taguatinga), Espaço Semente (Gama), Teatro de Sobradinho e no Riacho Fundo (em frente à Administração)
21 de setembro | reprise às 15h | Museu Nacional da República
Ficha técnica
Direção: Laís Melo
Elenco: Patricia Saravy, Janine Mathias, Richard Rebelo e Carlos Henrique Hique Veiga
Produção: Gesto de Cinema Produções Audiovisuais
Roteiro: Laís Melo
Produção executiva: Laís Melo, Isabele Orengo, Caio Baú, Jandir Santin
Direção de fotografia e Câmera: Renata Corrêa
Direção de arte: Bea Gerolin
Montagem: Laís Melo
Som direto: Débora Opolski
Edição: Ednubia Ghisi